Associações ligadas ao setor dizem ainda que, se estiver tudo fechado depois de abril, prejuízo ascenderá a 600 milhões de euros.
Corpo do artigo
São cerca de 30 mil os trabalhadores ligados à indústria têxtil que podem perder o emprego este ano, se não houver fim próximo para o segundo confinamento e para a pandemia, e, como denunciam os empresários, se o Governo não agilizar ajudas para as empresas que continuam abertas, ainda que sem encomendas.
César Araújo, presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confeção (ANIVEC), lembra que, a seguir ao negócio do turismo e das viagens, "o têxtil é o terceiro que mais sofre com a pandemia e o novo confinamento". Mário Jorge Machado, da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP), pinta um quadro negro: "As perspetivas para este ano são mais catastróficas do que as de 2020, cujas perdas se cifraram entre os 550 e os 600 milhões de euros".
O dirigente da ATP afirma que "há fábricas em vias de fechar" e que a sobrevivência está do lado do Governo, que "terá de agilizar mecanismos que ajudem aquelas que se mantêm em funcionamento" mas que, por força das circunstâncias (lojas fechadas não vendem nem fazem encomendas) não têm trabalho.
lay-off não é para todos
"O lay-off simplificado só se aplica a empresas que encerraram", explica César Araújo, adiantando que o outro mecanismo existente, além de ser muito menos proveitoso, destina-se ao desenvolvimento das firmas, quando o que está em causa "é sobreviver".
César Araújo acredita que, de todas as empresas do setor têxtil, "não hão de encerrar todas", mas estão em causa pelo menos 10% ou 20%, caso não haja apoios.
Mário Jorge Machado considera que "devem ser dadas melhores ajudas a todas as empresas com quebras superiores a 25%", sublinhando que um setor que exporta 80% do que produz "não pode andar a reboque do mercado doméstico". "O Governo anunciou que salvar a economia ia custar mil milhões de euros, mas vai gastar mais na TAP. Não defendo que a TAP não seja salva, mas não digam que não há dinheiro para salvar empregos", acusa.
O alívio da pressão sobre o setor, prossegue aquele responsável, depende em muito da confiança na vacina contra a covid-19. "É que, mesmo com a confeção de máscaras sociais, que veio dar um grande impulso às empresas em abril e maio do ano passado, está a descer com a desconfiança da Alemanha e França, que exigem o uso das FFP2" ("fieltering face piece", que em português significa peça facial de filtragem). "Se acabarem as máscaras sociais, mesmo com certificado igual ou superior às cirúrgicas, "o problema vai agravar-se", diz aquele responsável.
César Araújo apoia-se na perspetiva da Associação de Médicos Pneumologistas, que apoia o uso das máscaras certificadas, "que são fabricadas de acordo com as normas das cirúrgicas". Aliás, afirma Mário Jorge Machado, "as FFP2 nem sequer são saudáveis, porque as pessoas não respiram e ainda acumulam CO2. Além de igualmente eficazes, as de tecido são ambientalmente mais sustentáveis".
2020 foi um ano confuso mas acabou por ser bom
Lionjeans existe há 19 anos e, apesar dos transtornos, consegue ter quase todos a trabalhar
No final do último confinamento, entre março e abril do ano passado, a Lionjeans, em Barcelos, ainda conseguiu confecionar cerca de 20 a 30 mil máscaras. Mas, ao fim desses dois meses Carlos Mandim viu-se num dilema de fácil solução: se continuasse com a confeção das proteções faciais, perdia clientes de vestuário.
"Dois mil e vinte foi um ano extremamente confuso. Começámos muito bem, depois passámos uma fase complicada mas, ainda assim, acabou melhor e ainda conseguimos crescer", resume o proprietário da empresa de vestuário, a maioria de ganga, que já vinha a crescer desde 2019.
"Agora estou com medo dos meses de março e abril deste ano, por causa das novas coleções", afirma, depois de ter conseguido escoar toda a produção de roupa de inverno. Em causa está a venda de roupa de verão, que chegam às lojas naquela altura do ano. Ora, se estiverem fechadas não vendem. Nem as vendas online podem salvar os estabelecimentos comerciais desta miséria, alertou o empresário, confessando o seu receio. "É tudo muito incerto, é uma luta", afirma Carlos Mandim.
Cinquenta empregos
A Lionjeans dá emprego direto a 50 pessoas, desde comerciais, a costureiras de amostras e de acabamentos, e entrega cerca de 90% da confeção a uma dezena de fábricas do Vale do Ave, seis permanentes e quatro de forma intermitente.
Mesmo com o segundo confinamento a correr (ainda sem saber quando vai acabar), para já, refere Carlos Mandim, há muito trabalho. Falta fazem os cerca de 10 trabalhadores que estão neste momento em casa, ora a tomar conta dos filhos que não têm aulas, ora em quarentena, e ainda uma doente com covid-19. "Não paramos, temos compromissos", afirma, acrescentando que, uma vez que tem também uma marca própria, vai adiantando a coleção.
Apesar de tudo, feliz com o final do ano de 2020, o empresário vê com preocupação o resto deste 2021. "É um pesadelo, não se sabe o dia de amanhã. Os funcionários vêm ter comigo e perguntam: temos de ir para casa? Eu digo-lhes: não sei, para já temos muito trabalho".
Com coleções asseguradas até ao início da primavera, quando deveria chegar às lojas as coleções de verão (mas que ainda não venderam a de inverno), a Lionjeans, criada em 2002, vai vivendo um dia de cada vez, à espera de boas notícias. Que tardam em chegar.