ValorIN presta serviços a 14 empresas parceiras e dá emprego a adultos com deficiência ou doença mental.
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"Sou uma pessoa diferente. Muito mais segura e rápida no trabalho", diz, sem hesitar, Sandra, que ali reaprendeu "a sorrir". Filipe é "mais autoconfiante" e Paulo, que nunca tinha conseguido emprego, tira cafés, faz tostas mistas e é, agora, elogiado por todos na confeitaria onde está há dois anos. Trabalham na pequena "incubadora" ValorIN, em Vila do Conde. Dali saem capas escolares, autocolantes e pesos para canoas, caixas de cartão, minitratores, sapatos e muito mais. Há horários a cumprir, prazos e regras para respeitar. É uma pequena fábrica igual a tantas outras, mas cheia de funcionários "especiais".
Depois de três anos de arranque apoiado, o projeto do MADI (Movimento de Apoio ao Diminuído Intelectual) de Vila do Conde já é autossuficiente e prova que, "sim, valorizar integrando é possível". "No fundo, deslocamos para aqui fases do ciclo produtivo das empresas", explica a coordenadora do projeto, Isabel Querido Sá. Em todas as salas há pequenas linhas de montagem. Trabalham sete horas por dia: 75% na produção, 25% no desenvolvimento pessoal e social (pilates, ginástica laboral e terapias de grupo).
Casimiro e Fernando tiram fio de cobre de bobinas, numa operação de reciclagem. Sandra cola palmilhas, Paulo põe cordões. Ao lado, num trabalho em cadeia, preparam-se capas escolares, que saem dali aos milhares para hipermercados. Numa outra sala, montam-se minitratores e sequências de cristais para candeeiros.
Seja qual for o ofício, o trabalho é feito sem paragens, com concentração máxima, embalado pela música de fundo, a única "distração" permitida. Ancor, Nelo, Bee, Arcopédico, DS Smith e Agros estão entre as 14 empresas parceiras. A umas prestam serviços, noutras há jovens do projeto a trabalhar.
"Arrancamos em 2016 com uma única empresa e cinco jovens. Em 2018, fizemos uma candidatura a três anos ao Portugal Inovação Social para 20 beneficiários. Hoje, temos 15 em empresas, 11 a trabalhar aqui", frisa Isabel. O projeto apoia adultos, em idade ativa, com deficiência ou doença mental. A maioria tem baixa escolaridade, uma longa história de desemprego ou inatividade. Chegam pela mão do MADI, dos hospitais, da Câmara ou de outros parceiros da rede social.
"Estas pessoas têm sempre barreiras e portas fechadas no acesso ao emprego. O ValorIN foi criado como uma solução", conta a coordenadora. Ali, apoiados e orientados, aprendem novos ofícios, ganham rotinas e autonomia financeira, sentem-se úteis, "percebem que, embora diferentes, também são capazes". O objetivo é que, uns em meses, outros em anos, todos sejam capazes de trabalhar fora da "bolha".
Hoje, o ValorIN é já autossuficiente e são cada vez mais as empresas parceiras: "Veem que o trabalho é bem feito e que, muitas vezes, pela sazonalidade, falta de espaço, tempo ou pessoal, não lhes compensa ter funcionários a fazê-lo". O sucesso mede-se ainda pelo bem-estar: uns largam o álcool e outras dependências, outros diminuem fármacos e internamentos. Todos se dizem "mais felizes". Para Isabel Sá, o objetivo é mais profundo: conseguir que, cada vez mais, haja oportunidades e um novo olhar das empresas para estes jovens "diferentes".
Bons exemplos
Selo de Vila Verde
Um trevo de cinco folhas é o desenho do selo criado pela Câmara de Vila Verde para atribuir a empresas que promovam a empregabilidade de pessoas com deficiência. Uma das empresas receberá um prémio a definir, em maio.
Centro Incluir
O grupo Jerónimo Martins inaugurou, no ano passado, o centro Incluir, que vai dar formações de 12 semanas a pessoas com deficiência que se queiram candidatar a empregos no grupo. Funciona em Telheiras, Lisboa.
"100 diferenças"
A região da Madeira lançou o programa "100 diferenças", que apoia a empregabilidade de deficientes. Vai financiar, a partir deste ano, a eliminação de barreiras arquitetónicas, a adaptação dos postos de trabalho e o incentivo ao empreendedorismo.
Café Joyeux
O número 26 da Calçada da Estrela, em Lisboa, alberga desde novembro o Café Joyeux. O conceito nasceu em França em 2017 e visa formar e empregar pessoas com trissomia 21 ou outras deficiências cognitivas. Trabalham no atendimento, caixa, cozinha e sala.