Já fez anos se passaram desde que abriram os Passadiços do Paiva, atração turística que leva milhares de pessoas a Arouca. O município, já famoso pela gastronomia e o geoparque, não pára de crescer. Recentemente, parte do antigo mosteiro foi transformado em hotel - razão para voltar à região e descobrir as novidades
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Todos os dias, na pequena fábrica dos DOCES CONVENTUAIS DE AROUCA, repetem-se os gestos de gerações de freiras que a partir do século XVIII criaram e aperfeiçoaram a doçaria do Mosteiro de Arouca. Este negócio de família começou ainda em meados do século XIX, quando a tia-avó de Jorge Bastos, agora à frente do negócio, foi servir para este mosteiro cisterciense.
Quando as ordens religiosas foram extintas, em 1834, permitiu-se que as religiosas continuassem lá a viver. O mosteiro ficou vazio com a morte da última freira, em 1886. Mas logo que as ordens terminaram, as monjas tiveram de começar a comercializar produtos para serem sustentáveis e a doçaria que já faziam foi o caminho. Como já não podia haver noviças, iam às populações recrutar mulheres para servirem. Foi assim que a tia-avó de Jorge, Maria Cristina, foi lá parar. Quando o mosteiro encerrou, levou as receitas para casa e começou a produzir e a comercializar os doces com a ajuda da sua irmã.
Na experiência Fábrica Aberta, fica a conhecer-se estas e outras histórias sobre esta tradição. Além disso, diz Paula Silva, braço direito de Jorge, os visitantes podem “pôr as mãos na massa para moldarem castanhas doces ou charutos, os dois produtos mais populares”. Por vezes, conta Paula, é também possível assistir à produção do pão de São Bernardo. Pão (pouco) doce, também conventual, que fica a levedar por várias horas antes de ir ao forno.
Desta experiência também faz parte assar as castanhas doces num fogareiro a carvão, como as freiras faziam e como ainda hoje se faz. “Antes, trabalhávamos com um fogareiro redondo, mas como aumentamos a produção tivemos de otimizá-la. Mas, em recriações, continuamos a utilizar o antigo. No entanto, continuamos a usar a brasa, que é o importante do produto.” Uma das razões do aumento de produção foi terem aberto recentemente uma loja e cafetaria no centro do Porto. Assim, são já três os espaços que ocupam, contando também com a casa de chá na praça central de Arouca, a meia dúzia de metros do mosteiro que durante séculos moldou a vila de Arouca.
Ali, já há muito que não há freiras e não se produzem doces, mas não faltam novidades. A ala sul do edifício foi recentemente transformada no hotel de cinco estrelas MS COLLECTION MOSTEIRO DE AROUCA, aberto em abril. Nas obras, que duraram três anos, tentou-se manter a personalidade do espaço. “Nem estava muito degradado, mas havia condicionantes em termos de arquitetura e tentamos preservar o máximo possível”, conta Helena Valente, diretora de marketing. A pedra – granito – que compõe as paredes afigurou-se fácil de trabalhar, “mas as madeiras foram um desafio”. No corredor do segundo andar do hotel pode apreciar-se esse trabalho, com o teto em madeira escura totalmente recuperado a remeter para a austeridade de tempos passados. Quanto aos quartos, eram as celas das freiras, e como não tinham instalações sanitárias, mudou-se o desenho. De três, fizeram-se dois, sendo o do meio transformado em casas de banho. O projeto esteve a cargo do ateliê Mimool, do arquiteto Rui Loureiro.
Algumas das madeiras não recuperadas foram as das antigas portas das celas. Ainda assim, o hotel conseguiu não as desperdiçar. Deu ao artista Vhils – com quem já tinha trabalhado no MS Collection Aveiro – algumas delas e ele devolveu duas intervencionadas com o seu estilo singular, que são também homenagem às gentes de Arouca. Agora, estão expostas no bar e na receção do hotel.
Além dos 53 quartos divididos em quartos clássicos e suítes (incluindo uma suíte duplex ainda em obras), o hotel está equipado com um spa, única estrutura construída de raiz, piscina interior, banho turco, sauna e vários serviços de massagem. Ao ar livre há piscina e campos de paddle.
COMER À AROUQUENSE
Uma outra ligação com o passado é o HERITAGE 1220, restaurante do hotel explorado pela mesma empresa responsável pelos Doces Conventuais, que está, de resto, encarregada por todo o F&B da unidade. À frente da cozinha está o chef Fernando Machado. Arouquense que se formou na vila, mudou-se para o Porto para estagiar e acabou por trabalhar com António Vieira no BH Foz e no Wish. “Passados seis anos fui para a Marisqueira A Antiga [em Matosinhos]; queria experimentar coisas novas e aprendi muito com pessoas mais velhas”, conta. Passou ainda pelo Lago, em Santa Maria da Feira, antes de voltar à terra natal para ficar mais perto da família, e passou um ano na Tasquinha da Quinta, restaurante regional.
Nesta nova aventura, Fernando não se afasta das raízes. “Não podemos fugir de onde estamos. Em Arouca come-se muito boa carne e o prato é sempre bem composto.” Mas isso não o impede de inovar, trabalhando esta gastronomia de conforto com criatividade e toques contemporâneos. Um dos exemplos é a bochecha de vitela, cozinhada durante várias horas a baixa temperatura, acompanhada de um apurado puré de batata e farinheira, isto além de pratos de peixe, como uma sopa ou um arroz caldoso de peixe e gambas.
Outro dos restaurantes mais recentes de Arouca é o ABADESSA, aberto desde o ano passado no centro da vila. Rodrigo Pinho opera na sala e orienta a cozinha onde Maria de Fátima confeciona os pratos. “Estou em todo o lado; não há prato que eu não prove”, afirma. E experiência na restauração não lhe falta. Desde os 12 anos que trabalha na área, tendo começado num restaurante de família. Depois de uma cirurgia, trabalhou nos passadiços e na Ponte 516, mas, diz, “o bichinho da restauração continuou cá”.
Nascido e criado em Arouca, conta que um dia reparou que uma antiga tasquinha estava para trespasse e decidiu voltar ao que o faz feliz. Recuperou o espaço com a ajuda de amigos e abriu portas apostando na qualidade dos produtos e do serviço. “Queria ter uma coisa pequena, mas já está a ficar pequena demais”, refere Rodrigo, que tem a comida regional como estrela principal do restaurante. Não falta a carne DOP arouquesa: vitela assada, costeleta ou posta. E um dos ex-líbris da casa, bacalhau “à Rodrigo”, receita gulosa que aprendeu com a avó.
Quem também começou muito cedo nas lides culinárias foi Sérgio Araújo, que dá a cara pelo mais recente restaurante da sua família, o PEDESTRE 142. “Nasci na hotelaria, há 33 anos”, sublinha. Os pais começaram com um tasquinho em Carregosa e o negócio foi crescendo. Deste tasquinho passaram a um restaurante com 200 lugares em Santa Maria da Feira, onde brilhava o leitão. “Trouxemos a especialidade para aqui e abrimos o Churrascão.” Depois de algumas dificuldades, apareceu a oportunidade de montar algo diferente, pelo que há oito anos abriram o espaço atual. A mãe Ana continua na cozinha. “Trabalhamos um conceito diferente, uma nova imagem.” A ideia foi ter ali todos os pratos que fazem parte do historial da família, como o frango da Guia, o já referido leitão (têm um forno onde cabem 12 animais), bem como pratos da região, trabalhando principalmente a carne arouquesa. A garrafeira é outra das apostas da casa. Propostas do Dão e do Douro, principalmente de produtores menos óbvios, e vinhos de Arouca, que pertence à região dos Vinhos Verdes.
POR CAMINHOS SERRANOS
E se Arouca se tornou famosa pelo mosteiro e pela gastronomia, há três décadas que também ganha visibilidade pelas atividades de aventura e natureza. “Nos anos 1990, começou a fazer-se rafting no rio Paiva, o que trouxe mais gente à região”, refere o biólogo João Silva, da empresa de animação turística JUST COME. Mais tarde, em 2009, o território foi designado como geoparque pela UNESCO, principalmente devido ao seu interesse geológico, das pedras parideiras às pedras boroas ou aos trilobites gigantes de Canelas, tudo isto único no Mundo. Além de toda a flora e fauna, incluindo o lobo ibérico, o corço, javali, raposa, muitas aves e, à beira do rio, lontras, cágados, lagartos ou cobras. Mais visíveis são as manadas de arouquesa e os rebanhos de cabras e ovelhas que pastoreiam nas serras.
Em 2015, abriram os PASSADIÇOS DO PAIVA, e foi aí que se deu o grande aumento de turistas. “Como era novidade e era uma atração grátis, havia dias com mais de cinco mil pessoas… Os restaurantes fechavam porque não tinham carne suficiente para toda a gente, e não havia infraestruturas montadas, como estacionamento ou casas de banho”, lembra João. Depois, vieram incêndios que destruíram parcialmente os passadiços e na reconstrução já se teve em conta essas valências. A atração mais recente é a PONTE 516, uma ponte suspensa 175 metros acima do rio Paiva, na envolvente dos passadiços e junto à cascata das Aguieiras. Esta novidade voltou a trazer mais gente à terra.
Mas foi mesmo com os passadiços que começou o projeto da Just Come, idealizado pelo casal Pedro Teixeira e Joana Nunes. Filho da terra, Pedro começou aos 19 anos a praticar canoagem de águas bravas, que depois levou ao rafting. “Estudava Engenharia Civil, no Porto, mas acompanhava os estudos com atividades de aventura. Até que fui convidado a passar temporadas na Noruega como guia de rafting. Estive lá quatro épocas, nas férias da faculdade”, lembra.
E mesmo querendo trabalhar em engenharia, havia a vontade de ter uma empresa de aventura. “Quando os passadiços abriram, percebi que havia mais fluxo e pensei que teria viabilidade. Isso coincidiu com a gravidez da minha mulher e decidimos vir.” Hoje, organizam desde percursos pedestres, tanto na vila como nas serras da Freita ou da Arada, pelas aldeias e pelos passadiços e ponte. O forte continua a ser os desportos no rio, como river tubing, canyoning, rafting ou cano-rafting. Têm programas personalizados que englobam as atividades de natureza, transporte, alojamento e alimentação. Para desfrutar o que Arouca tem de bom, sem preocupações.
COMPRAR E VISITAR
DOCES CONVENTUAIS DE AROUCA
Fábrica e loja:
Avenida Reinaldo Noronha, 12
Cafetaria:
Praça Brandão de Vasconcelos, 9
Tel.: 256 133 487
Web: conventuais.pt
Das 9h às 20h. Não encerra
Visitas por marcação
Preço: 15 euros/pessoa
ONDE COMER
HERITAGE 1220
Largo Santa Mafalda
Tel.: 256 245 534Web: mscollection.pt/arouca/restaurante
Das 12h às 14h30 e das 19h às 22h30. Não encerraPreço médio: 30 euros
ABADESSA
Rua Dr. Coelho da Rocha, 8A
Tel.: 256 114 783Web: instagram.com/abadessa.rest
Das 11h30 às 20h, de segunda a sexta; até às 22h à sexta e sábado
Preço médio: 20 euros
PEDESTRE 142
Rua Dr. Ângelo Miranda, 142
Tel.: 910 706 492
Web: pedestre.pt
Das 12h às 15h e das 19h
às 21h30, de quarta a segunda
Preço: menus desde 29,99 euros/pessoa; preço médio à carta: 25 euros
ONDE COMPRAR
Garrafeira Ás de Copos
Avenida dos Descobrimentos, lote 2, R/C
Web: facebook.com/asdecopos2009
Das 10h às 13h e das 14h30 às 19h30, de segunda a sexta; das 10h às 13h e das 15h às 19h ao sábado
O QUE FAZER
JUST COME COUNTRYSIDE & ADVENTURE TOURS - AROUCA GEOPARK
Rua 1º de Maio, 1A
Tel.: 910 706 492
Web: justcome.pt
Preço: atividades do rio desde 40 euros
MOSTEIRO DE AROUCA
Largo de Santa Mafalda
Das 10h às 17h30, de terça a domingo
Tel.: 256 943 321
Preço: 3 euros
ONDE FICAR
MS COLLECTION MOSTEIRO DE AROUCA
Largo Santa Mafalda
Tel.: 256 245 534
Web: mscollection.pt/arouca
Preço: Quarto duplo desde 235 euros,com pequeno-almoç