As fibras de celulose estão a emergir como uma opção sustentável para embrulhar tudo, desde alimentos a produtos eletrónicos.
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Atenção, clientes de supermercados na Bélgica, França e Luxemburgo: um teste para reduzir os resíduos das embalagens de plástico dos alimentos está a chegar às lojas mais próximas. Os retalhistas Carrefour e U-Group planeiam vender iogurtes, queijos, sumos de fruta, bolachas e outros artigos em embalagens feitas de fibras de celulose, que provêm da madeira ou de outros materiais de origem vegetal.
Movimentos do mercado
No total, 30 a 60 lojas nos três países começarão a apresentar os invólucros ecológicos em 13 tipos de alimentos até ao final deste ano. O Carrefour e o U-Group juntaram-se a produtores de alimentos, embaladores e investigadores num projeto que recebeu financiamento da UE para ajudar a colocar materiais de embalagem ecológicos nas lojas.
"Sem a aceitação do mercado, colocar produtos sustentáveis nas prateleiras não passa de uma ilusão", afirmou Frank Gana, diretor executivo e cofundador de uma empresa de consultoria ambiental sediada em Paris, a (RE)SET. Lidera o projeto da UE, que se chama R3PACK e tem uma duração de três anos, até maio de 2025.
O objetivo é que os intervenientes na iniciativa substituam uma parte significativa das suas embalagens de plástico por versões à base de fibras. Produtores de alimentos como a Candia e embaladores como a Thiolat, ambos também sediados em França, como o Carrefour e ao U-Group, estão empenhados neste objetivo e a liderar o esforço.
O teste, que terá início ainda este ano na Bélgica, França e Luxemburgo, deverá ser alargado a milhares de lojas nos três países até à conclusão do projeto.
Pilhas de embalagem
A pilha de resíduos de embalagens da Europa não se limita aos produtos alimentares. Desde as chávenas de café para levar até aos produtos eletrónicos embalados, a Europa produz cerca de 190 quilogramas de embalagens por pessoa todos os anos - ou seja, 84 milhões de toneladas no total em 2021.
As embalagens de plástico constituem uma ameaça especial porque, embora algumas sejam recicladas, grande parte acaba no solo, nos rios e nos mares. Em 2021, quase um quinto dos resíduos de embalagens da UE eram de plástico.
Para além de substituir as embalagens de plástico, a equipa R3PACK procura tornar reutilizáveis alguns invólucros.
"Para alguns produtos, será quase impossível substituir o plástico", afirmou Gana. Nalguns casos, é mais fácil fabricar embalagens reutilizáveis.
Embora tanto os consumidores como as autoridades e as empresas queiram reduzir as embalagens de plástico de utilização única, encontrar um substituto adequado é um grande desafio, precisamente devido às qualidades do material: é leve, barato de produzir e pode proteger o conteúdo do oxigénio, da humidade e da água.
Uma solução é cobrir as embalagens à base de celulose ou papel com laminação ou revestimento - ou uma combinação de ambos - para colmatar a lacuna com as qualidades úteis do plástico.
Descoberta sueca
Anna Altner pode atestar os desafios - e os avanços - no domínio das embalagens sustentáveis. É a fundadora dempresa sueca Yangi, que desenvolveu embalagens à base de celulose que podem competir economicamente com o plástico.
Isto porque o processo de fabrico da empresa consome menos energia e água do que o de outros fabricantes de embalagens à base de celulose e porque o produto final, tal como o plástico, é versátil.
O processo é designado por "moldagem a seco" e depende do ar em vez da água para separar as fibras, que provêm de florestas geridas de forma sustentável na Escandinávia.
"Somos muito mais competitivos em termos de preço, em comparação com os plásticos, do que as soluções existentes", afirmou Altner. "O plástico é tão barato que não há nenhuma solução em papel que possa competir com ele".
A descoberta do processo de transformação da empresa surgiu num outro projeto de investigação financiado pela UE que ela liderou. O projeto decorreu de abril de 2021 até ao final de 2023.
No novo método de transformação, a pasta é alimentada através de um moinho para separar as fibras. O ar é então introduzido para as separar ainda mais em fibras individuais.
Com um sistema de circulação de ar contínuo, as fibras são depois formadas em almofadas fofas que são colocadas numa linha de formação. O calor e a pressão são aplicados, criando uma embalagem 3D rígida feita de celulose.
O método não só poupa água, como também consome menos energia do que os atuais métodos de fabrico de embalagens de celulose - o que não é de somenos importância para os fabricantes num contexto de preços elevados da energia.
A nova embalagem poderá ser utilizada para tudo, desde saladas para levar até embalagens blister para produtos eletrónicos. Além disso, pode ser reciclado nos sistemas de reciclagem de papel existentes.
Fronteiras mais verdes
Em dezembro de 2023, os governos da UE acordaram em alterar a legislação europeia sobre resíduos de embalagens para aumentar a reutilização das embalagens e torná-las totalmente recicláveis.
Isto está relacionado com o Pacto Ecológico Europeu e com o impulso da UE no sentido de um modelo económico mais circular, em que os recursos regressam à economia para serem reutilizados em vez de serem eliminados.
"Estamos a assistir à mesma tendência para tornar mais rigorosa a regulamentação das embalagens a nível mundial, ainda que a Europa esteja à frente", afirmou Altner.
Por seu lado, Gana, do (RE)SET, afirmou que a resolução do problema das embalagens de plástico pode ajudar a preparar o caminho para uma cooperação mais profunda e generalizada na Europa para tornar a economia mais ecológica.
"Se quisermos correr uma maratona, temos de começar com 10 km", afirmou. "A embalagem é um bom primeiro passo".
Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.