Amnistia Internacional critica absolvição de homem que arrastou companheira pelo pescoço
ONG alerta para as poucas condenações por violência doméstica em Portugal e insta o Estado a tomar medidas para garantir que este crime é investigado e punido. Mesmo quando a vítima não apresenta queixa
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A Amnistia Internacional Portugal encara "com profunda preocupação" a decisão do Tribunal de Paredes de absolver do crime de violência doméstica o homem que, em plena rua, arrastou a companheira pelo pescoço e tentou introduzi-la, à força, no interior de um carro. Para esta organização não governamental (ONG), o ato, devido ao "grau de violência" utilizado, revela, por parte do homem absolvido, uma "total desconsideração pela dignidade da companheira". Num parecer sobre o caso tornado público pelo JN, a Amnistia Internacional Portugal defende que a não existência de queixa não pode justificar a inação do Estado e insta as autoridades portuguesas a "tomar medidas que garantam que os crimes de violência doméstica sejam devidamente investigados, levados a tribunal e que as penas atribuídas sejam proporcionais aos crimes e, assim, sirvam como fator dissuasor para potenciais futuros incidentes".
No documento, a ONG começa por referir que "vê com profunda preocupação esta decisão de absolvição, dado o grau de violência da conduta e a total desconsideração pela dignidade da companheira que o homem demonstrou". E, logo depois, defende que "esta decisão é particularmente preocupante considerando os níveis alarmantes de violência doméstica em Portugal, e, por contraste, os baixos níveis de denúncia, acusação e condenação". "Este problema ganhou particular urgência durante a pandemia, que fechou muitas vítimas nas mesmas casas que os seus agressores, durante vários meses", lê-se no parecer.
Poucas condenações contribui para sensação de impunidade
No mesmo documento, a delegação portuguesa da instituição internacional lembra que, "em abril de 2020, o Comité de Direitos Humanos das Nações Unidas expressou preocupação com a persistência da violência doméstica e com os baixos níveis de denúncias, acusações e condenações relativas a violência de género em Portugal". "O Comité notou ainda que a dificuldade em investigar casos de violência doméstica, inclusive quando as vítimas optam por não apresentar queixa, não pode servir de justificação à inação, tendo o Estado o dever de usar todas as medidas ao seu dispor para fazer cumprir os direitos humanos. Também a Comissária para os Direitos Humanos do Conselho da Europa alertou, em março de 2021, para os níveis extremamente elevados de violência contra mulheres em Portugal e fez várias recomendações às autoridades portuguesas para melhor enfrentarem este problema. Várias organizações da sociedade civil portuguesa têm também vindo a denunciar que os níveis persistentemente baixos de condenações por violência doméstica poderão contribuir para uma sensação de impunidade dos agressores e de desproteção das vítimas, além de as desencorajar a denunciar abusos", acrescenta.
Direitos Humanos violados
Neste contexto, a ONG sustenta "que a violência doméstica é uma grave violação dos direitos humanos e, portanto, um crime, cujos autores devem ser responsabilizados". Incentiva, por isso, "as autoridades portuguesas a cumprir as obrigações internacionais a que Portugal está adstrito e a tomar medidas que garantam que os crimes de violência doméstica sejam devidamente investigados, levados a tribunal e que as penas atribuídas sejam proporcionais aos crimes e, assim, sirvam como fator dissuasor para potenciais futuros incidentes".
"Além da função punitiva, a justiça deve prever a retribuição adequada às vítimas e a reinserção social adequada dos agressores", conclui a Amnistia Internacional Portugal.