PJ suspeita que presidente e vice da Câmara de Montalegre se associaram a grupo de empreiteiros para inflacionar valores e entregar concurso a "amigos".
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O presidente da Câmara de Montalegre, Orlando Alves, o vice, David Teixeira, assim como o chefe da Divisão de Obras da autarquia foram ontem detidos pela Polícia Judiciária (PJ) do Porto por suspeitas de terem montado um esquema para lucrar à custa de empreitadas do município. São suspeitos de terem montado um "cartel" com um grupo restrito de empresários a quem distribuíam adjudicações ou concursos das obras públicas. Em causa estão crimes de associação criminosa, prevaricação, recebimento indevido de vantagem, falsificação de documentos, abuso de poder e participação económica em negócio, tendo como pano de fundo contratos de cerca de 20 milhões de euros.
Pelo que o JN apurou, o esquema consistia em concertar os preços, as propostas e o vencedor dos concursos ou adjudicações das obras municipais. De acordo com a investigação, os autarcas e o chefe de divisão tinham duas dezenas de empreiteiros "amigos", que entre 2014 e este ano ganharam, à vez, todas as obras.
Na prática, depois de ter sido tomada a decisão política de realizar uma obra, o "cartel" reunia-se, para escolher o empreiteiro vencedor. Para que isso acontecesse, ficava acertado que o designado iria apresentar o preço mais baixo do "cartel". Os outros todos faziam propostas com valores mais altos, para manter as aparências de verdadeira concorrência.
Sem desconfianças
Quando eram oficialmente abertas as propostas na câmara, a empresa que apresentava o preço mais baixo vencia naturalmente o concurso. Não havia assim lugar a desconfiança dos opositores políticos dos autarcas, nem de técnicos da autarquia, que davam andamento ao processo internamente.
Além da escolha do empreiteiro, o esquema de cartelização também permitia lucrar à custa das obras. É que, com a conivência do chefe de Divisão de Obras, a previsão do custo das empreitadas seria sempre inflacionada. O vencedor das adjudicações apresentava o preço mais baixo, mas já inflacionado em relação aos normais preços de mercado.
Para uma obra que, por exemplo, tinha um valor real de mercado de 500 mil euros, o cartel apresentava um preço mínimo de 600 ou 700 mil euros. A investigação acredita que o remanescente seria distribuído entre o presidente de câmara, o vice, o chefe de divisão e os empreiteiros envolvidos no concurso.
"A investigação versa sobre um volume global de procedimentos de contratação pública, no período de 2014 a 2022, suspeitos de viciação para benefício de determinados operadores económicos, num valor que ascende a 20 milhões de euros", explica a PJ.
Ontem, foram executadas dezenas de buscas, domiciliárias e não domiciliárias, que visaram os serviços da Câmara de Montalegre, mas também empresas daquele concelho, de Braga, Famalicão e Vila do Conde.
Os três arguidos são hoje levados ao Tribunal de Instrução Criminal do Porto.