O líder de uma das maiores redes de tráfico de droga do Porto começou a ser julgado esta quarta-feira no Tribunal de São João Novo. Ao todo, 37 arguidos, elementos da rede "Pica Pau/Picolé" que operava a partir da Pasteleira Nova, foram acusados de tráfico de droga. Cinco estão ainda acusados de associação criminosa.
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O principal arguido, Fábio Ribeiro, 37 anos, conhecido como “Crilim” ou "Barão da Pasteleira", preferiu manter-se em silêncio no início do julgamento. Já Rafaela, 30 anos, a então namorada de Fábio e com quem tem uma filha em comum, quis prestar declarações, mas pediu para o fazer sem a presença dos arguidos, uma vez que tem um processo a correr por violência doméstica contra ele e ainda um outro processo contra ele e outro arguido por uma dívida contraída abusivamente em seu nome.
Questionada sobre as razões de todos os arguidos terem de sair da sala, Rafaela explicou que tinha medo porque “isto é um grupo” e que visita Fábio na cadeia apenas para levar a filha de ambos, “que não tem nada a ver com este assunto”. A arguida deverá falar ao início da tarde.
Cedeu chave de casa por medo e coação
A arguida Alda, 48 anos, prestou declarações ainda da parte da manhã e admitiu “uma certa culpa” por ter cedido a sua casa “à Vanessa e ao Hugo” para guardarem droga. Disse que “ele era o dono da entrada” e “começaram a mandar bocas” que tinha de ceder a casa, “senão a tua filha…”. Alda ficou com medo e cedeu a casa “devido à pressão e coação”. Explicou que não tinha conversas com Hugo. Vanessa, que era sua cliente do salão, é que a abordou.
“Eu dei as chaves à Vanessa e disse que nunca podiam ter lá nada enquanto eu e a minha filha estivéssemos em casa. Era só por umas horas. Ela disse que era só uma mochila, mas claro que supus que era droga”, confessou, lembrando que os estupefacientes eram vendidos na rua à vista de toda a gente. Cedeu a casa durante um mês. Deixaram-lhe duas vezes 200 euros na caixa do correio, “mas nunca foi por dinheiro”, assegurou Alda. “A minha filha nem sabia” de nada até eu ser detida, acrescentou. “Estou muito arrependida”, afirmou, soluçando, explicando que já mudou de residência.
A arguida recusou-se a responder às questões dos advogados dos restantes arguidos, pelo que, face à ausência de contraditório, foi solicitado pelos causídicos que as declarações da arguida não fossem tidas em conta na decisão final.
Vários dos arguidos pediram para ser dispensados de comparecer nas sessões por motivos profissionais. O tribunal anuiu e assim não terão de comparecer nas próximas audiências.
O início da sessão desta manhã foi atribulado devido ao elevado número de arguidos e advogados. Não foi possível a presença de público e os jornalistas foram colocados numa sala à parte, onde irão assistir ao julgamento através de videoconferência.
Grupo funcionava como empresa
Fábio Ribeiro, 37 anos, de alcunha “Crilim”, seria o líder da organização criminosa, altamente profissionalizada, que controlava aquele bairro de Lordelo do Ouro. A sua dominância era tal que era conhecido como "Barão da Pasteleira".
O grupo funcionava como uma autêntica empresa. Diariamente eram escalados dois turnos de "trabalhadores": um funcionava das 7 horas às 15 horas, altura em que entrava em ação o segundo turno que só parava já perto da meia noite.
A rede era hierarquizada e cada um dos elementos da rede tinha uma função perfeitamente definida. Conforme o seu desempenho, o "funcionário" podia ser promovido ou despromovido de posto.
O "Barão" apenas lidava com um elemento que, no final de cada dia, lhe levava o dinheiro e apresentava as contas da jorna. A sua namorada, Rafaela, era a segunda no comando e assumia a gestão da rede na sua ausência.
O grupo controlava vários apartamentos no bairro da Pasteleira Nova que eram usados no apoio ao negócio. Algumas serviam de casas de recuo para guardar dinheiro e droga; outras eram abrigos em caso de fuga da polícia. Tal como sucedia com os trabalhadores, a função de cada casa variava diariamente para dificultar eventuais vigilâncias policiais e era definida por Vanessa, que tinha a confiança do líder.
A droga era preparada e embalada em apartamentos "seguros", longe da Pasteleira Nova. Em março de 2023, várias rusgas da PSP desmantelaram estes laboratórios usados para "cozinhar" heroína e cocaína.
Segundo a acusação do Ministério Público, as rusgas, que detiveram alguns dos principais colaboradores e apreenderam grande quantidade de droga causando um prejuízo elevado, forçaram o “Barão da Pasteleira” a sair dos bastidores e voltar ao terreno. Fábio Ribeiro acabaria detido, no âmbito de uma grande operação policial, em 20 de abril de 2023.