O ativo do "banco mau" já só chega para cobrir 2,8% das responsabilidades reconhecidas aos credores, que acabarão por exigir ao Estado que pague.
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A dívida do Banco Espírito Santo (BES) praticamente triplicou desde a medida de resolução, em 2014. O mesmo sucedeu com o respetivo fundo de pensões, que ainda paga a reforma de Ricardo Salgado (90 mil euros brutos por mês), fundador do BES, e a outros ex-administradores. O salário médio no "banco mau" é superior a quatro mil euros.
No ano passado, o "buraco" (dívida) ascendia a 6,4 mil milhões de euros, quase o triplo dos 2,6 milhões de 2014. O ativo do "banco mau" só cobre 2,8% das responsabilidades junto de credores, que podem exigir o que falta ao Fundo de Resolução (ou seja, ao Estado).
Outro buraco que triplicou foi o do fundo de pensões, agora no valor de 49,3 milhões de euros. Ainda assim, no ano passado, foram pagos 776 mil euros a 10 antigos gestores, onde tudo indica que esteja incluído Ricardo Salgado. Segundo as contas de 2019, a instituição ainda tem nove funcionários - três diretores, três com "funções específicas" e três administrativos - com salários brutos que custaram um total de 553 mil euros (média mensal por pessoa de cerca de 4400 euros).
Património extinto
O ativo também encolheu: em 2014, era de 193 milhões de euros e, no ano passado, chegava a apenas 180,8 milhões. Em breve, de acordo com a nota de rodapé relativa ao património afeto ao Fundo de Pensões, ainda irá encolher mais: "Por carta de 16 de junho de 2020, a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões autorizou (...) a extinção da quota-parte do património do Fundo de Pensões a afetar ao BES (...). Com a assinatura da alteração do contrato constitutivo do Fundo de Pensões, que se espera que ocorra a curto prazo, as responsabilidades do BES perante o Fundo de Pensões serão extintas". Assim, os antigos gestores, como Ricardo Salgado, poderão também reclamar pensões ao Fundo de Resolução, segundo Miguel Reis, advogado envolvido no processo do BES em representação de vários lesados, nos últimos anos.
"Vão retirar o património do "banco mau", que não vai poder pagar o "buraco" do Fundo de Pensões; então paga o Fundo de Resolução, pagamos todos nós", resumiu. A dissolução do ativo do "banco mau" enquanto os créditos não param de subir não surpreende o advogado. "A resolução do BES foi um ato administrativo equivalente ao assalto ao banco. O BES tinha 80,5 mil milhões de euros de saldo, onde está o dinheiro? Agora, falam em auditorias ao Novo Banco, mas é para branquear as contas, porque não fizeram auditorias quando se sabia onde estava a cadeira ou o carro do Ricardo Salgado", comentou. O advogado está convencido, ainda, que "os credores internacionais têm estado silenciosos porque, ao abrigo da Convenção de Washington, já receberam o que era deles". Quem pagou? "O Estado", assegura Reis.
Despesas a crescer
Nas contas de 2019 do BES cabem despesas de funcionamento de 3,2 milhões de euros, incluindo os encargos salariais de nove pessoas (729 mil euros, contando com Segurança Social, benefícios pós-emprego e "outros custos"), pensões de ex-gestores (776 mil euros), de consultoria e auditoria (219 mil euros) e judiciais (2,8 milhões de euros).
Quando for feita a liquidação do BES, os credores seniores terão direito a receber 31,7% do que tinham investido. Uma vez que o ativo só cobre 2,8% dos créditos, o Fundo de Resolução terá de assumir o restante.