Caso de juízes é de "gravidade extrema", diz presidente do Conselho da Magistratura
O presidente do Conselho Superior da Magistratura admitiu, esta terça-feira, que a suspeita que envolve três juízes desembargadores "é de uma gravidade extrema" e, sendo "um caso inédito", nunca lhe ocorreu que sucedesse algo semelhante.
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Joaquim Piçarra falava na conferência de imprensa onde o Conselho Superior da Magistratura anunciou a instauração de processos disciplinares aos juízes desembargadores Luís Vaz das Neves, Orlando Nascimento [ex-presidentes do Tribunal da Relação de Lisboa] e Rui Gonçalves depois de terem sido detetados fortes indícios de abuso de poder e violação do dever de exclusividade.
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"A suspeita é de uma gravidade extrema, porque põe em causa um dos pilares do Estado de Direito, mas também revela que o sistema funciona porque conseguiu detetar essas irregularidades", afirmou o presidente do Conselho Superior da Magistratura, admitindo que é um "caso inédito", acrescentando: "Nunca me passou pela cabeça que sucedesse algo semelhante".
"O Conselho está determinado em exercer as suas competências na área disciplinar e aquilo que decidir será, doa a quem doer, para todos os juízes seja um magistrado de direito ou o presidente do Supremo Tribunal de Justiça", garantiu.
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O órgão de gestão e disciplina mandou averiguar se houve intervenção humana que adulterou o processo de distribuição eletrónica dos processos no tribunal da Relação de Lisboa. Os processos disciplinares instaurados servem para averiguar se os desembargadores violaram algum dever funcional enquanto magistrados, sendo a matéria criminal da responsabilidade do Ministério Público.
Questionado sobre a cedência do salão nobre do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) para a realização de uma arbitragem extrajudicial por parte de Orlando Nascimento e cujo árbitro foi Vaz das Neves, Joaquim Piçarra afirmou que "nada impede que o juízes jubilados possam ser árbitros", estando no entanto impedidos de receber remuneração, e discordou da utilização daquele espaço para a realização de diligência daquela forma alternativa e privada de resolução de litígios.
O caso
O juiz Vaz das Neves foi escolhido para arbitrar de forma privada um diferendo que envolvia o hotel Altis Park; de um lado estava o Grupo Altis e do outro o fundo de investimento imobiliário Explorer. O grupo hoteleiro vendera o hotel lisboeta para pagar um empréstimo ao BES, mas depois quis exercer a opção de recompra. Ora, em vez de recorrerem à justiça tradicional para dirimir o valor da nova compra, as duas partes optaram por um tribunal arbitral, em que cada um escolhe justamente um árbitro.
Orlando Nascimento, que é desde 2016 o presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, escolheu o seu antecessor, Luís Vaz das Neves e, em vez de um escritório de advogados, um centro de arbitragem ou até um hotel, como é habitual nestes casos de justiça privada, foi escolhido um local mais nobre, justamente o Salão Nobre do Tribunal da Relação de Lisboa, que foi usado de forma gratuita. Nesta arbitragem, que é privada, Vaz das Neves encaixou 280 mil euros.