Ao segundo dia de julgamento, Fátima Martinho decidiu prestar declarações ao Tribunal de Júri de Mirandela.
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A mulher acusada de ter atirado para um poço o próprio filho, um autista de 17 anos, no verão de 2020, em Cabanelas, Mirandela, decidiu quebrar o silêncio, ao segundo dia de julgamento, para defender que não premeditou o crime. "Matei o meu filho, mas não foi nada premeditado", declarou ontem Fátima Martinho, de 53 anos, negando também ter dado ao menor um antipsicótico em "dose de cavalo" - expressão usada pelo procurador da República - para o mesmo não resistir.
Fátima alega que só queria levar Eduardo para uma caminhada, para aliviar o mal-estar causado pelo confinamento imposto pela pandemia da covid-19. "Preparei um lanche, com bananas e uma bola de ovos, e fomos ver as oliveiras". Porém, chegados ao local, onde existia um poço, o filho começou a ficar agressivo, contou. "Deu-me um pontapé nas pernas e uma bofetada. Ainda consegui dar-lhe a medicação, mas acabamos por nos empurrar um ao outro, até que o atirei para dentro do poço. Bateu com a cabeça no outro lado da parede e perdeu os sentidos", descreveu, negando que, vendo ainda o filho à tona da água, tenha descido a um degrau no poço para, com as mãos e os pés, afogar mesmo o menor.
A seguir, Fátima telefonou a um primo. "Disse-lhe que tinha matado o Eduardo e que também queria morrer, mas ele convenceu-me a não o fazer", relatou.
A arguida também disse que, "se fosse hoje, tinha chamado o 112 para o levarem [ao filho] numa camisa de forças". E porque não o fez na altura, perguntou o juiz presidente. "Estava muito descompensada, com o acumular de tantas coisas. Agora estou a ser medicada e estou mais controlada", respondeu. Ainda assim, disse: "Depois do que fiz, a minha intenção era suicidar-me e ainda hoje me arrependo de o não ter feito. E não sei se algum dia não o farei", desabafou.
A arguida também contrariou a acusação, assente em relatos médicos, de nunca aceitou o diagnóstico de autismo do filho e que sempre terá demonstrado resistência à prescrição da medicação. "Amei muito o meu filho e sempre lhe dei a medicação. O que os médicos dizem é mentira", garantiu Fátima.
"As mãos ao pescoço"
A arguida diz que, em março de 2020, o filho "começou a ser mais violento". "Algumas vezes, deitou-me as mãos ao pescoço. A medicação já não fazia efeito".
"Foi um inferno"
"Não desejo a ninguém aquilo que vivi. Foi um inferno, o meu filho precisava de mim a toda a hora. Só conseguia comer, porque, de resto, era como um bebé, e não tive o apoio de ninguém, muito menos do pai", queixou-se.