Crime de Cabanelas: Mãe vai alegar loucura. E desde que foi presa não tornou a falar
Advogado pede perícia sobre "eventual inimputabilidade" de Fátima Martinho, indiciada pela morte do filho autista de 17 anos.
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"Perante o juiz, ela não confessou, não disse nada. Desde que entrou no tribunal [de Mirandela, no dia 7 de julho, na manhã seguinte aos alegados factos], a minha cliente não fez mais declarações. Aguarda o desenrolar do processo". Hernâni Moutinho é o advogado de Mirandela defensor de Fátima Martinho, a mulher de 52 anos indiciada por homicídio qualificado.
Ela terá matado o filho de 17 anos, autista e epilético, empurrando-o para um poço num terreno agrícola isolado de Cabanelas, aldeia de Mirandela, distrito de Bragança, na manhã de 6 de julho. O rapaz terá morrido afogado e a mãe teria intenção de se matar a seguir, mas não conseguiu.
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Foi isso que confessou a várias pessoas minutos após o crime. Ligou à irmã mais velha, Maria Augusta, que vive imigrada na Galiza, contando-lhe o que tinha feito ao filho, Eduardo José, e o que pretendia fazer a seguir, conforme relatou a irmã ao JN. Ligou também a um primo, José Manuel Periquito, seu vizinho em Cabanelas, admitindo o crime, revelando-lhe o local e ele tê-la-á convencido a não consumar o suicídio - indo ter com ela e trazendo-a de volta a casa num trator.
Horas depois, já na tarde do dia 6, a mulher ligou à GNR, admitiu os factos, disse onde estava, indicou onde era o poço, a GNR veio, o corpo foi retirado, confirmou-se a morte, e em seguida Fátima Martinho foi presa. Ainda nessa tarde, já sob escolta da GNR, a mulher terá tentado novamente matar-se, atirando-se da varanda do 3.o andar de casa, mas os guardas impediram o ato. No dia a seguir, foi levada ao juiz do Tribunal de Mirandela, mas já não tornou a falar, revelou o seu advogado ao JN.
"Tem consciência?"
"Oficialmente, e para efeitos de juízo, a minha cliente nada admitiu. Declarou apenas que não pretende falar", reafirma Hernâni Moutinho. "Ela está muito transtornada, muito alterada, com sinais evidentes de perturbação psíquica ou mental". E o defensor pergunta: "Será ela criminalmente responsável? Tem consciência plena dos atos de que a querem acusar?".
É aqui que reside a opção da defesa: a perda temporária de qualidades cognitivas e a insanidade mental. "Vamos avaliar a eventual inimputabilidade da minha cliente", diz o advogado que pretende solicitar "exame às faculdades mentais" de Fátima. A mulher está em prisão preventiva em Santa Cruz do Bispo, Matosinhos, pelo que os exames deverão realizar-se no Instituto de Medicina Legal do Porto.
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Indiciada por crime de homicídio qualificado (artigo 132 do Código Penal), mas ainda a aguardar acusação oficial, a mãe que alegadamente matou o filho pode vir a ser condenada a prisão entre 12 e 25 anos.
Mas haverá atenuantes, alega o advogado: o rapaz, que sofre de autismo regressivo e estava confinado em casa desde março, quando a sua escola especial em Vinhais fechou devido à pandemia do coronavírus, ter-se-á tornado violento, ameaçando a vida da mãe - que frequentemente era obrigada a fugir e a barricar-se em casa.
Assim, argumenta a defesa, o crime poderá ser enquadrado em "homicídio privilegiado", com pena substancialmente mais leve, conforme descreve o artigo 133 do CP: "Quem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de um a cinco anos".
Presa preventivamente desde 7 de julho, a acusação pelo Ministério Público terá que se materializar até 7 de outubro, quando se completa o prazo máximo legal de quatro meses da medida de coação.