Conselho rejeita concurso para colmatar falta de juízes nos tribunais da Relação
Abertura do procedimento extra é defendida pela maioria dos presidentes daqueles tribunais, mas órgão de gestão diz que "não se justifica". Há milhares de processos pendentes.
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O Conselho Superior da Magistratura (CSM) rejeita, "de momento", abrir um concurso extraordinário de acesso aos tribunais superiores, para colmatar a falta de juízes desembargadores identificada pelos presidentes dos cinco Tribunais da Relação (TR) do país.
Para a maioria destes dirigentes, o procedimento poderia ser uma solução para o problema, com consequências na celeridade dos processos, mas para o órgão de gestão dos juízes "tal não se justifica". Em 2020, havia, segundo o Relatório Justiça 2015-2020, da autoria do Ministério da Justiça, mais de nove mil processos pendentes nos tribunais superiores, 89% dos quais nos TR.
A denúncia de falta de magistrados nos TR não é inédita, mas, há um mês, foi reiterada pelo novo presidente do TR de Coimbra. No seu discurso de tomada de posse, Jorge Loureiro lembrou que, apesar de a lei prever um número mínimo de 57 magistrados colocados no tribunal que lidera, apenas estão colocados 53. Destes, só 37 estão em "exercício pleno de funções".
Guimarães é exceção
O panorama é semelhante nos restantes quatro TR. Segundo informações prestadas ao JN pelas presidências destes tribunais, somente em Guimarães o número de desembargadores em exercício pleno de funções é superior ao patamar mínimo definido na lei (ver infografia). E, mesmo neste caso, é considerado "insuficiente".
No Porto, o défice de juízes é agravado, segundo o líder deste TR, pela média de idade dos magistrados, que "tem vindo a aumentar".
"O avançar inexorável da idade implica, naturalmente, o aparecimento de restrições, físicas e psíquicas, agravadas pela elevadíssima exigência imposta a uma profissão [...] que lida com a responsabilidade de decidir, muitas vezes em última instância, sobre a vida [...] dos nossos concidadãos", afirma José Igreja Matos.
A sua homóloga de Lisboa, Guilhermina Freitas, aponta outros fatores para o número de juízes em funções no tribunal que dirige ser "insuficiente": o "grau de complexidade/volume dos processos" que dão entrada, as "inerentes suspensões/ /reduções de distribuição em elevado número, face a essa mesma complexidade", e a "previsibilidade de jubilações e promoções de desembargadores" ao Supremo Tribunal de Justiça.
Os dois magistrados alertam, ainda, que a quebra gerada pela pandemia de processos entrados está já a desaparecer. Apelam, por isso, à abertura de um concurso extraordinário de acesso aos TR, para, precisa Igreja Matos, "pelo menos 50 novos juízes". O líder do TR de Guimarães concorda. "Seria uma forma expedita de colmatar a insuficiência", sustenta António Sobrinho.
Em março, Jorge Loureiro sugerira ou a "abertura imediata" do próximo concurso ou a colocação de 80 e não 40 dos concorrentes no atual procedimento, o que não aconteceu (ler ficha).
Já para o TR de Évora, dirigido por João Luís Nunes, é "expectável" que, "em espírito de diálogo e compromisso", os TR e o CSM alcancem "um consenso que permita minorar a carência".
DISCURSO
Magistrado fala em meios a mais na primeira instância
O presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, Jorge Loureiro, rejeitou, no seu discurso de tomada de posse, que o reforço dos quadros dos tribunais de recurso comprometa a "capacidade de resposta" dos de julgamento. "A capacidade de resposta instalada na primeira instância é, inequivocamente, superior às necessidades que lhe são colocadas pela correspondente procura", salientou, a 17 de março passado, lembrando que, em cinco anos, a média anual de processos por juiz baixou de 970 para 543. Já o presidente do Tribunal da Relação do Porto recorda que, ao contrário da segunda instância, os tribunais de instrução e julgamento contam "com bolsa de juízes para cobrir falhas", enquanto Supremo Tribunal de Justiça pode recrutar conselheiros durante todo o ano. "Resta-nos uma paciência resignada e a esperança em dias melhores", lamenta José Igreja Matos.
SABER MAIS
Subida na carreira
Apenas os juízes colocados há mais anos nos tribunais de primeira instância e com classificação de "muito bom" ou "bom com distinção" podem concorrer aos tribunais da relação.
Concurso em curso
Atualmente, está a decorrer o 10.o concurso, destinado ao preenchimento de, no máximo, 40 vagas. No total, foram admitidos 80 concorrentes. O número varia de procedimento para procedimento.
Uma vez por ano
A colocação dos juízes acontece em setembro. A lei não prevê uma periodicidade obrigatória para a abertura pelo CSM dos concursos.