Tribunal Europeu confirmou sentenças portuguesas, mas três dos sete juízes contestaram decisão porque o controlo era permanente.
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O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) decidiu, na terça-feira, que o despedimento de um português com base em dados de um GPS instalado no carro da empresa é legal. Contudo, a decisão só foi subscrita por quatro dos sete juízes. Os restantes, incluindo a portuguesa Ana Maria Guerra Martins, consideraram que "o funcionário foi constantemente monitorizado durante três anos, o que excede claramente o limiar mínimo de seriedade exigido pela jurisprudência".
Florindo Gramaxo, residente em Vila Real e hoje com 55 anos, tornou-se funcionário de uma farmacêutica em 1994, tendo-lhe sido atribuído um carro para realizar as atividades profissionais. A viatura também podia ser usada nos tempos livres, desde que o delegado de propaganda médica pagasse os quilómetros efetuados nesses períodos de descanso.
Já em 2011, a farmacêutica instalou aparelhos de GPS nos automóveis, decisão que foi imediatamente contestada por Florindo Gramaxo, inclusive, na Comissão Nacional de Proteção de Dados.
Três anos depois, o delegado de propaganda médica foi alvo de um processo disciplinar, que levaria ao seu despedimento. Segundo a empresa, Florindo Gramaxo aumentou, ficticiamente, o número de quilómetros realizados em viagens de trabalho para compensar a quilometragem feita aos fins de semana e feriados.
Controlado 24 horas por dia
Alegou igualmente a farmacêutica que o funcionário também retirou o cartão do GPS e, com base nos dados do aparelho de geolocalização, concluiu que este trabalhou menos do que oito horas diárias.
Florindo Gramaxo exigiu justiça aos tribunais portugueses, mas nenhum lhe deu razão. Em 2016, recorreu ao TEDH.
Queixou-se de que os seus direitos ao respeito pela vida privada e a um julgamento justo foram violados, mas, quatro dos sete juízes que julgaram o caso não lhe deram razão. Para os magistrados, o delegado de propaganda médica sabia que o carro da empresa estava equipado com GPS e até assinou um documento que especificava que o objetivo do aparelho era monitorizar as distâncias percorridas na atividade profissional.
O documento, salientaram os juízes, alertava ainda para a hipótese do funcionário ser despedido, em caso de discrepância entre os dados do GPS e aqueles que fossem cedidos pelo trabalhador.
Para os restantes três juízes, a decisão deveria ter sido outra. "Consideramos que o equilíbrio foi mal estabelecido, uma vez que a interferência do empregador na vida privada do empregado é muito grave. Com efeito, o primeiro tinha um poder de controlo sobre o segundo 24 horas por dia", afirmaram. Numa declaração de voto vencida, Ana Maria Guerra Martins e os colegas sustentam "que a falta de diligência da empresa é paradoxalmente recompensada no final, sem que a privacidade do empregado tenha sido suficientemente protegida pelos tribunais nacionais".
Decisões
Meio de vigilância
O Tribunal do Trabalho de Vila Real rejeitou que o GPS seja um meio de vigilância remota com interferência na vida privada. Também o Tribunal da Relação de Guimarães considerou o despedimento justo, porque o GPS foi utilizado somente para determinar a distância feita pelo trabalhador.
Rastreio inadmissível
Os juízes de voto vencido defenderam que foram ignorados, "sem qualquer justificação razoável", os pareceres da Comissão Nacional de Proteção de Dados que, em duas ocasiões, indicaram "que o rastreio era inadmissível durante o tempo livre do empregado".