Empreiteiro confessa que políticos pediram dinheiro para acelerar projetos urbanísticos. Outros arguidos negam.
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Os dois ex-autarcas de Espinho Joaquim Pinto Moreira e Miguel Reis, tidos como os dois principais arguidos do processo “Vórtex” que começa a ser julgado esta quinta-feira no tribunal da cidade, utilizariam códigos para evitar falar em luvas e corrupção. De acordo com o construtor e arguido arrependido, Francisco Pessegueiro, acusado de corrupção ativa com vista a obter facilidades no licenciamento de empreendimentos, estes dois políticos solicitaram-lhe contrapartidas, mas sem falar em dinheiro vivo. Miguel Reis terá usado a expressão “taxa de urgência” para obter um adiantamento de 5 mil euros e Pinto Moreira terá pedido 50 mil para “démarches de aprovação”. Os dois políticos, tal como as outras cinco pessoas arguidas, negam qualquer tipo de crimes.
A 10 de janeiro, a Polícia Judiciária do Porto deteve o então presidente da Câmara Miguel Reis, o chefe do urbanismo, José Costa, um arquiteto e os dois empresários Pessegueiro e Paulo Malafaia. Já em março do mesmo ano, foi constituído arguido Pinto Moreira, autarca entre 2009 e 2021, que à data era deputado. Em julho, o Ministério Público (MP) acusou oito arguidos e cinco empresas, incluindo os dois políticos.
Arrependido culpa autarcas
Na contestação que juntou ao processo, Pessegueiro admite um pacto corruptivo, mas garante que nunca quis que fossem cometidas ilegalidades. Apenas queria celeridade na aprovação dos processos e, acima de tudo, afirma que “as contrapartidas alegadamente prometidas aos autarcas Joaquim Pinto Moreira e Miguel Reis foram solicitadas pelos próprios”, lê-se no documento a que o JN teve acesso.
Na mesma contestação, os advogados de Pessegueiro, João Medeiros e Rui Costa Pereira, escrevem que, no final de mandato de Pinto Moreira, este “solicitou” 50 mil euros ao construtor “pelas démarches a realizar por este autarca para efeitos de aprovação, enquanto empreendimentos de caráter estratégico, dos projetos urbanísticos para o “Lar Hércules” e “32 Nascente”. Ainda assim, Pessegueiro nega ter entregado as contrapartidas ao ex-autarca, que entretanto tinha ido para a Assembleia da República.
Ainda de acordo com Pessegueiro, em maio de 2022, Miguel Reis sugeriu poder acelerar os projetos “Lar Hércules” e “32 Nascente”, que ainda estavam em fase de aprovação na Câmara. Mas teria um “custo associado” de 50 mil euros. Mais tarde, Reis terá pedido um adiantamento de 5 mil euros sobre os “custos associado” que apelidou de “taxa de urgência”.
De acordo com a acusação, entretanto validada por um juiz de instrução criminal, Pinto Moreira foi corrompido por Pessegueiro e Malafaia, com 50 mil euros, para que o então presidente da Câmara facilitasse empreendimentos urbanísticos. Sempre segundo o MP, Miguel Reis terá recebido pelo menos 60 mil euros em três encontros mantidos com Pessegueiro, em cafés.
Em causa estavam os projetos “Urban 32”, “Sky Bay”, “32 Nascente” e “Lar Hércules”.
Os acusados
Joaquim Pinto Moreira
Ex-presidente da Câmara
2 crimes de corrupção passiva
1 crime de tráfico de influência
1 crime de violação de regras urbanísticas
Miguel Reis
Ex-presidente da Câmara
4 crimes de corrupção passiva
5 crimes de prevaricação
Francisco Pessegueiro
Empresário
8 crimes de corrupção ativa
1 crime de tráfico de influência
2 crimes de violação de regras urbanísticas
5 crimes de prevaricação
Paulo Malafaia
Empresário
8 crimes de corrupção ativa
1 crime de tráfico de influência
2 crimes de violação de regras urbanísticas
5 crimes de prevaricação
José Costa
Ex-chefe de departamento da câmara
1 crime de corrupção passiva
5 crimes de prevaricação
1 crime de violação de regras urbanísticas
Pormenores
Confissão falsa
Para os outros arguidos, que negam em bloco qualquer ato de corrupção ou conhecimento de tais factos, a confissão de Pessegueiro é falsa. Miguel Reis até garante que foi “arrancada” sob promessa de libertação imediata da prisão preventiva a que o construtor esteve sujeito.
Vida escrutinada
Joaquim Pinto Moreira garante que a sua vida pessoal e financeira foi passada a pente fino sem que nada de suspeito fosse encontrado.
Proibição de funções
O MP requereu a aplicação de penas acessórias de proibição do exercício de funções aos arguidos políticos e funcionários públicos.