Tribunal diz que viatura não foi essencial para o crime pois podia ter ido de camioneta ou escondido a droga na mala.
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O Tribunal da Relação de Évora ordenou a devolução de um carro apreendido a uma mulher de 48 anos, condenada por tráfico de droga. Em primeira instância, o veículo havia sido dado como perdido a favor do Estado. Mas a mulher recorreu e vai reaver o carro, considerado "não essencial" para o crime, pois ela podia ter ido comprar droga a Lisboa de camioneta. Pendente na Justiça está ainda o caso do traficante que está a pedir em tribunal a restituição do BMW série 7 que lhe havia sido apreendido e que esteve envolvido num acidente fatal quando era usado pelo ministro da Administração Interna.
Pelo menos desde 2017 que a arguida se dedicava ao tráfico de droga. Ia a Lisboa abastecer-se de haxixe, trazia-o para Évora onde residia e vendia-o a consumidores ou outros traficantes. Em outubro de 2019, foi detida ao vir do fornecedor. Tinha três placas de haxixe escondidas no forro do assento do carro. Além da droga, ficou sem o telemóvel e o veículo. Em tribunal, a arguida admitiu os factos, justificando que precisava de "compor o orçamento familiar".
O Tribunal de Évora condenou-a a quatro anos e oito meses de prisão, pena efetiva. Ditou ainda a perda a favor do Estado do telemóvel e do carro. Ela recorreu, pedindo a redução da pena e a anulação da perda do carro, alegando que havia sido comprado de forma lícita e não havia perigo de ser usado para crimes, pois estava presa. O Ministério Público contestou e defendeu a perda da viatura pois fora utilizada para o crime, nas deslocações para adquirir a droga.
pena fica mas perda é anulada
Os juízes do Tribunal da Relação de Évora consideraram que a pena era adequada, dados os vastos antecedentes criminais. Já quanto ao carro, optaram por devolvê-lo à arguida. O acórdão lembra que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) tem introduzido um elemento moderador para a perda de veículos em favor do Estado, defendendo a salvaguarda do princípio da proporcionalidade. Segundo o acórdão de 8 de junho de 2021, o STJ exige uma relação de causalidade adequada entre o uso do veículo e a prática do crime ou seja que fique provado que, sem o carro, a infração não teria sido praticada.
No caso em apreço, a Relação entendeu que não ficou demonstrado que o veículo tivesse sido comprado com dinheiro do tráfico nem ficou provada a sua "utilização reiterada, habitual ou frequente do veículo na atividade de tráfico".
Aliás, os juízes afirmam que, atendendo à quantidade e volume de droga, a arguida podia "ter-se deslocado a Lisboa, transportado e ocultado o produto estupefaciente, de outra forma, v.g. utilizando transportes públicos e dissimulando o estupefaciente no vestuário que usasse ou em alguma mochila ou saco que utilizasse". Portanto, concluem os juízes desembargadores, não existe a "relação de causalidade adequada" exigida pelo STJ para se declarar a perda do carro. Assim, ordenaram a restituição do mesmo à arguida.
POLÉMICA
Dono exige retorno de BMW de Cabrita
Um homem condenado a oito anos por tráfico de droga reclama a devolução de um BMW 750 que estava ao serviço do Ministério da Administração Interna. Eduardo Cabrita seguia no carro de 130 mil euros, quando este colheu mortalmente um trabalhador na A6. O traficante diz que o veículo foi apreendido indevidamente e recorreu à Justiça para o recuperar. O processo ainda decorre.