Vários ex-dirigentes do F. C. Porto negaram esta manhã de segunda-feira, no Tribunal de São João Novo, no Porto, terem interferido na revisão dos estatutos do clube.
Corpo do artigo
Porém, Lourenço Pinto, o ex-presidente da Assembleia Geral (AG), terá forçado a mudança de um artigo, possibilitando a aplicação dos estatutos às próximas eleições. E foi ele que “teimou” em continuar a AG até ser interpelado por Jorge Guimarães que viu Pinto da Costa "entristecido".
Fernando Gomes, ex-vice-presidente do F. C. Porto e ex-administrador da SAD, garantiu que o assunto da revisão estatutária "nunca foi discutido nas reuniões da direção" do clube e revelou que o presidente Pinto da Costa até era contra alguns dos artigos.
"A administração da SAD considerava que a revisão seria um assunto do clube" e, "nas reuniões da direção do clube, nunca foi discutido esse tema. Era um tema do Conselho Superior e da Assembleia Geral", afirmou Fernando Gomes. Num testemunho curto, a testemunha arrolada por Fernando Madureira assegurou ainda que nunca foi consultado para nada, nem "nunca interveio, em rigorosamente nada" no processo de revisão.
O ex-dirigente confessou mesmo que só começou a analisar as propostas de revisão após a comunicação social ter dado conta da oposição que se levantou. E ficou com ideia de que "o anterior presidente Pinto da Costa era contra algumas dessas alterações".
"Nunca fui pressionado"
Um dos impulsionadores da revisão estatutária garantiu que a direção nunca interferiu na sua elaboração. "Nunca fui pressionado por quem quer que seja relativamente à elaboração de qualquer um dos artigos", assegurou Miguel Brás da Cunha, que fez parte da comissão para a revisão dos estatutos. O elemento do Conselho Superior, eleito por uma lista independente, apercebeu-se de que havia desagrado de alguns sócios relativamente à proposta elaborada porque "achavam que os novos estatutos eram para favorecer a anterior direção".
Brás da Cunha destacou os artigos mais contestados: a questão da alteração da data das eleições, o alargamento do número mínimo de anos exigível para o voto dos associados, uma alegada facilitação dos negócios entre membros da direção e o clube e a possibilidade da votação ser feita por outros modos que não exclusivamente presencial. Relativamente aos negócios, o dirigente portista explicou que a ideia da comissão até foi dificultar a sua realização, acrescentando um requisito substantivo aos já existentes.
O dirigente disse que a proposta apresentada pela comissão de revisão ao Conselho Superior previa que os estatutos apenas entrassem em vigor após as eleições seguintes. Porém, Brás da Cunha confirmou que a proposta que foi levada a votação não foi essa e que já se admitia que os estatutos se aplicassem ao ato eleitoral seguinte.
Presidente da mesa da AG quis alterar artigo
Jorge Guimarães, ex-presidente do Conselho Fiscal e que fez parte da comissão da revisão estatuária, explicou que a o artigo em questão foi alterado numa reunião do Conselho Superior, em julho após uma intervenção de Lourenço Pinto, o então presidente da mesa da Assembleia-Geral. "Fez uma intervenção criticando, com palavras muito pouco próprias, para não dizer mais, dizendo que não tinha lógica nem sustentação jurídica que só pudesse entrar em vigor após as eleições", relatou.
Foi então aprovada a alteração do artigo, possibilitando a sua aplicação já às eleições seguintes, contrariando o que tinha sido decidido pelo grupo de revisão de que "jamais pretenderiam interferir com as eleições". Todavia, o ex-presidente do Conselho Fiscal garantiu que nunca foi pressionado, sugestionado ou influenciado por alguém na elaboração da proposta.
Jorge Guimarães confirmou que, a 13 de novembro de 2023, tomou a iniciativa de se dirigir a Lourenço Pinto perante o que estava a ocorrer no Arena. Após o bate-boca de Henrique Ramos com sócios da bancada e os confrontos físicos - "inadmissível, mas foram três" - que se seguiu, "as coisas descambaram".
Lourenço Pinto "teimou" em prosseguir AG
"A única pessoa que teimava era o Lourenço Pinto. Vi o presidente muito entristecido. Não pedi autorização a ninguém. Pus a minha cabeça entre a cabeça de Lourenço Pinto e Cerejeira Namora e disse o que tinha a dizer. Nem sei porque é que não tinha já suspendido a reunião no auditório", contou Jorge Guimarães, garantindo que não foi Pinto da Costa que lhe pediu para ir falar à mesa.
Após este episódio, "Lourenço Pinto estava quase catatónico e foi falar com Pinto da Costa a dizer que eu tinha dito para acabar com a reunião e perguntou-lhe o que ele achava e ele disse: acabe", revelou o ex-dirigente.
"Não se ia conseguir discutir nada"
Antes, Hugo Santos, que fez parte do Conselho Superior e discutiu a proposta de revisão estatutária, também afirmara que nunca foi alvo de algum tipo de pressão ou constrangimento. "Jamais, em tempo algum, fosse de quem fosse", reforçou. A 13 de novembro de 2023, o ex-dirigente, que fez parte da claque, recorda-se de "um burburinho" no auditório mas não ouviu qualquer tipo de ameaça ou confronto naquele local.
Já no pavilhão, o sócio saiu para ver se ainda havia muita fila no exterior. Quando regressou soube que tinha havido uma altercação na bancada norte. "Depois, cruzo-me com o juiz Matos Fernandes e ele disse que ia embora porque queria tomar palavra e já não ia conseguir. Isso enervou-me e senti-me frustrado porque não se ia conseguir discutir nada. Não se ouvia nada. Depois de tanto tempo dedicado aquilo, decidi ir-me embora. Quando cheguei a casa, a minha mulher ficou muito admirada por me ver chegar", recordou.
Hugo Santos conhece bem a realidade da principal claque o F. C. Porto. "Desde 1998 conto pelos dedos da minha mão o número de jogos do F. C. Porto que não vi em Portugal Continental", afirmou. Admitiu que chegou a ter algumas desavenças com Fernando Madureira, de quem é amigo, mas elogiou a sua postura à frente da claque. "Há uma evolução que muito se deve ao comportamento do Fernando, ao factor agregador junto dos sócios, da presença nos jogos, de não ter vergonha de usar os adereços do F. C. Porto".
Sobre o comportamento do ex-líder da claque em situações de quezília citou uma frase de Fernando Madureira: "‘Não interessa se somos brancos, pretos, amarelos ou rosa, somos todos do Porto’. Mais do que qualquer coisa, era isso. Sempre que existia algum foco de conflito eram as próprias forças de segurança que o procuram na tentativa de o sanear. Muitas das vezes ele já o fazia de forma preventiva", explicou, garantindo que não o via como pessoa violenta. "Vejo-o como alguém sempre defensor dos seus. Naturalmente era um fator de catalização. Agora não era o líder de todas as pessoas", terminou.
"Um dos melhores exemplos que um pai pode dar a um filho"
O cantor Alberto Índio elogiou as qualidades humanas de Fernando Madureira e dos Super Dragões. O artista explicou que, após a filha ter sido diagnostica como uma doença oncológica, recorreu à claque e a vídeos de jogadores portista dirigidos para a animar. "Semanalmente faziam questão de a visitar e oferecer algumas coisas para que se sentisse, perante todas as adversidades, feliz", reforçou.
Após essa aproximação, "cimentou, com muita admiração, uma amizade com eles". E contou que assistiu a imensas ações de solidariedade por parte da claque e a filha dizia: "olha os nossos amigos, o que eles estão a fazer. É talvez um dos melhores exemplos que um pai pode dar a um filho", elogiou.