O antigo procurador-geral da República Fernando Pinto Monteiro morreu, esta quarta-feira, aos 80 anos, em Lisboa.
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Fernando Pinto Monteiro sofria de doença oncológica, mas estava a reagir bem aos tratamentos, pelo que a sua morte foi algo inesperada, segundo contou fonte próxima. Morreu em Lisboa, onde vivia há muitos anos.
Nascido no lugar de Porto de Ovelha, no concelho de Almeida, a 5 de abril de 1942, Pinto Monteiro licenciou-se em Direito na Universidade de Coimbra. Começou a carreira profissional como delegado do Ministério Público em Idanha-a-Nova e jubilou-se como juiz conselheiro. Entre 2006 e 2012, foi procurador-geral da República, num mandato polémico, em que enfrentou grande oposição do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP).
Nomeado para o cargo pelo antigo primeiro-ministro José Sócrates (2005-2011) e confirmado pelo ex-presidente da República Aníbal Cavaco Silva (2006-2016), Pinto Monteiro chegou a ser acusado em 2010 pelo então presidente do SMMP, João Palma, de não ter deixado os procuradores do caso Freeport investigar até ao fim.
Em junho de 2010, a Procuradoria-Geral da República dera um mês e meio para que o inquérito, iniciado em 2004, fosse encerrado, o que levou os magistrados a incluir no despacho final 27 perguntas que não terão feito a José Sócrates por falta de tempo.
Almoço "inocente" com Sócrates
Um ano antes, Pinto Monteiro tinha decidido não existir motivo para abrir um procedimento criminal contra o então primeiro-ministro devido a escutas recolhidas no âmbito do processo "Face Oculta". As interceções telefónicas acabariam, em 2011, por ser destruídas por ordem do, à data, presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha do Nascimento, com o então procurador-geral a cortar à tesoura todos os excertos de despachos no processo.
O fantasma de ser próximo de José Sócrates ressurgiria em 2014, depois de ter sido tornado público que, dias antes do antigo primeiro-ministro ser detido no âmbito da Operação Marquês, tinham almoçado juntos. Um encontro que Pinto Monteiro classificaria como "inocente" e que se transformaria numa "coincidência complicada".
"Aconteça o que acontecer, nunca o engenheiro José Sócrates me perguntou nada sobre justiça", sublinhou à data.
Em 2018, João Palma classificaria o mandato Sócrates-Pinto Monteiro como o "período mais negro da história do Ministério Público democrático".
"Os adversários combatem-se em vida. Perante a morte, o que tenho de fazer é apresentar as condolências à família e aos amigos", reagiu esta quarta-feira, ao JN, o antigo dirigente do SMMP.
"Poderes da rainha de Inglaterra"
A par das polémicas, o mandato de Pinto Monteiro ficou ainda marcado, segundo a Lusa, pela sua persistência na investigação do "Apito Dourado", aos resultados obtidos pela constituição de equipas mistas Ministério Público/Polícia Judiciária, designadamente no processo "Noite Branca", e pelo incentivo no combate à violência contra mulheres, idosos, crianças e outros grupos especialmente vulneráveis.
Insatisfeito com os seus poderes, chegaria, porém, a afirmar que o "procurador-geral da República tem os poderes da rainha de Inglaterra".
"Era um homem de grandes qualidades humanas e pessoais, de enorme cordialidade e simpatia. O que, no momento da nossa morte, é a única coisa que releva", comenta o antigo procurador-geral Distrital de Coimbra, Euclides Dâmaso.