Rómulo Costa, um dos oito jiadistas portugueses suspeitos de adesão, recrutamento e financiamento do Estado Islâmico, esteve a ser ouvido durante toda a manhã desta terça-feira, na primeira sessão de julgamento, no Tribunal Criminal de Lisboa. O arguido, sempre calmo e por vezes evasivo e confuso nas declarações, nega apoio moral ou logístico a qualquer grupo terrorista.
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Rómulo admitiu ainda que participou na letra de algumas músicas que fazem alusão ao Estado Islâmico - apreendidas numa busca da Polícia Judiciária a sua casa em junho de 2019 - mas nega que estejam relacionadas com o jiadismo.
"Participei na parte técnica das músicas que estão no Youtube, estava a fazer uma tese sobre vários tipos de fraudes, sobre crime cibernético e contraterrorismo", alegou Rómulo Costa. "Jihad" uma das palavras usadas na letra de uma música, segundo Rómulo significa "desenvolvimento pessoal" e "não tem nada a ver com a guerra santa".
Quando confrontado pelo juiz presidente Francisco Coimbra sobre o teor de uma conversa telefónica entre os irmãos - também acusados de estarem envolvidos com o Estado Islâmico, Edgar Costa e Celso Costa - nas quais Rómulo Costa é alegadamente mencionado, o arguido defende-se dizendo que "não entende" o conteúdo ou "não sabe" a que se referem.
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Relativamente a uma conversa telefónica entre Rómulo Costa e o irmão Edgar Costa sobre o assassinato de um militar britânico por radicais islâmicos, em Londres, na qual Rómulo diz, referindo-se ao militar, que "caiu e hão-de cair mais", o arguido diz que foi "um comentário imaturo e irresponsável". "Peço imensa desculpa ao tribunal, foi um comentário imaturo e irresponsável, não há justificação para tal", disse.
No processo são transcritas dezenas de conversas que o Ministério Público (MP) considera constituírem provas da adesão e envolvimento do grupo de oito portugueses com o Estado Islâmico.
O MP identificou mais de 40 códigos nas conversas telefónicas. "Vermelho" é um dos mais usados e será utilizado para código de passaporte, mas Rómulo, durante a manhã, negou sempre esta associação."É evidente e claro que se refere aos carimbos que se põe nos vistos. Não me posso pronunciar porque não sei em que contexto se referem", disse.
O julgamento continua à tarde. Cassimo Turé, outro dos oito jiadistas acusados de envolvimento com o Estado Islâmico - que vive no Reino Unido e está em liberdade - também esteve no banco dos réus esta manhã, a um metro de distância de Rómulo Costa, mas disse que só vai prestar declarações no julgamento final.
Rómulo Costa está preso desde junho de 2019, após a busca da PJ em sua casa.
Nega ligações a outros jiadistas
A investigação ao grupo de terroristas portugueses começou em 2013, a partir de um alerta da polícia britânica que se apercebeu do envolvimento de Nero Saraiva - também arguido neste processo - no rapto de dois fotojornalistas que cobriam a guerra da Síria. Nero terá sido dos primeiros europeus a juntar-se à causa jihadista na Síria e está lá preso há cerca de um ano. Os restantes arguidos Sadjo Turé, Edgar Costa, Celso Costa, Fábio Poças e Sandro Marques estão dados como desaparecidos e as autoridades suspeitam que estejam mortos.
Acusado também de ter ajudado alguns dos arguidos a chegarem à Síria, Rómulo Costa disse, esta manhã, que era "muito raro falar com os irmãos" - Edgar Costa e Celso Costa - e que, além destes, de Sandro Marques e Sadjo Turé, não conhecia mais nenhum dos arguidos. Estes dois últimos, explicou, terão sido seus colegas "nos anos 90" em Portugal e, depois disso, encontraram-se em Londres por acaso em "encontros não deliberados". Rómulo disse ainda que "nunca esteve, nem falou" com Nero Saraiva, apontado como o mais perigoso de todos.
Rómulo assegurou também que "nunca tinha ouvido falar" nem teve "nenhum contacto" com Fábio Poças, quando questionado pelo juiz sobre um comentário que terá deixado a uma publicação no Facebook de Poças, com o nome de Romy Fansony, uma das suas alcunhas. "Não fui eu que escrevi, foi alguém que usou a minha página, talvez um pirata informático possa confirmá-lo", alegou Rómulo perante o coletivo de juízes. Na publicação, de janeiro de 2014, Fábio Poças publicou uma fotografia sua na rede social com uma espingarda AK47 - Kalashnikov, intitulando-se como soldado de infantaria do Estado Islâmico do Iraque e da Síria.
Rómulo Costa é também acusado de ter cedido o seu passaporte ao irmão, Celso Costa, para que este chegasse à Síria, depois de lhe ter sido barrada a entrada nesse país. O arguido disse hoje, porém, que o documento "esteve sempre em Portugal, desde 2009", ano em que veio cá e se terá esquecido deste em casa dos pais. "Fiquei dez anos sem vir a Portugal e durante uma década não me preocupei com o passaporte porque nunca precisei dele lá, em Londres", explicou o arguido, que viveu em Londres até ser preso, no verão passado, numa passagem por Lisboa.