Ex-administrador da PT alegou que quantia faz parte de 25,2 milhões para comprar ações de que terá sido depositário. MP defende que foi subornado por Ricardo Salgado.
Corpo do artigo
O juiz Ivo Rosa deu dez dias ao ex-administrador da Portugal Telecom (PT) Zeinal Bava para devolver 6,7 milhões de euros à massa falida de uma empresa do Grupo Espírito Santo (GES), cujo processo de insolvência corre atualmente num tribunal do Luxemburgo. O prazo começa a contar a partir do momento em que o gestor, de 55 anos, for notificado da decisão instrutória da Operação Marquês, proferida na última sexta-feira.
O Ministério Público (MP) defende, na acusação, que o montante integra os 25,2 milhões de euros que Ricardo Salgado, ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES), terá pago em "luvas" ao gestor, entre 2007 e 2011, para que este beneficiasse aquela instituição financeira em detrimento dos interesses da PT, então parcialmente pública. Na instrução, Bava contrapôs, porém, que fora só depositário daquela quantia, destinada a financiar a compra de ações por altos quadros da companhia, de modo a que estes continuassem na PT após esta ser privatizada. Acrescentou que, depois de sair da empresa, em outubro de 2014, devolvera 18,5 milhões, querendo então restituir os restantes 6,7 milhões ao seu credor legítimo.
A explicação foi aceite por Ivo Rosa, que arquivou os cinco crimes imputados ao antigo gestor da PT, incluindo um de corrupção passiva, um de branqueamento de capitais e um de falsificação de documento. Estes dois últimos, alegadamente praticados em coautoria com Salgado, estariam ligados, segundo o MP, à suposta falsificação de um contrato a justificar a transferência, em três parcelas, dos 25,2 milhões de euros para contas na Suíça e em Singapura tituladas abertamente por Bava.
Datas não batem certo
Na decisão instrutória, o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa, desmonta a tese de que o documento foi forjado na sequência da detenção, em novembro de 2014, do ex-primeiro-ministro José Sócrates (2005-2011), que, segundo o MP, também teria sido subornado por Salgado para beneficiar o GES na PT.
Entre outros aspetos, Ivo Rosa sustenta que, apesar de situar temporalmente a celebração do contrato após a presença, em 2015, de Bava na comissão de inquérito parlamentar ao BES e de só em julho de 2016 a PT ter sido referenciada pela primeira vez na Operação Marquês, há documentos que demonstram que, em dezembro de 2014, os curadores da insolvência da empresa do universo GES conheciam o contrato.
O magistrado salienta ainda que o relatório produzido por estes indicia que o tribunal luxemburguês considerou válido o contrato de que o MP desconfia. Conclui, por isso, que este terá sido mesmo assinado em 2010, depois de um acordo verbal em 2007. Os 6,7 milhões de euros que Bava terá agora de restituir foram transferidos antes de existir o contrato escrito.
O gestor - que foi investigado na Suíça devido a movimentos financeiros descritos pelo MP português - fica obrigado a remeter ao processo em Lisboa comprovativo da devolução.
MP que levar Bava e Granadeiro a julgamento
A não pronúncia dos dois antigos administradores da PT pelos crimes de corrupção e peculato vai ser alvo do recurso pelo Ministério Público (MP). Ivo Rosa entendeu que estes arguidos não poderiam ser acusados por estes crimes, imputáveis a quem exerce funções públicas, porque trabalhavam para uma empresa privada a PT, SGPS. Mas o MP considera que estavam na dependência da PT Comunicações, S.A., que era concessionária de serviço público de telecomunicações. A Relação irá decidir.
Sócrates lança livro
José Sócrates vai lançar, nos próximos dias, um livro em que, segundo o "Diário de Notícias", ataca a atual direção do PS e diz ter sido alvo de uma "vingança de Direita". A obra tem o título "Só agora começou".
PCP critica demora
O PCP alegou ontem, numa nota, que, apesar da sua "inequívoca complexidade e dimensão", a Operação Marquês tem-se arrastado no tempo de uma forma "inaceitável aos olhos do cidadão comum". O processo "está longe do seu fim", lembrou.