Kenny usou o mesmo telemóvel para falar com duas mulheres e ambas foram assassinadas
O homem suspeito de matar duas mulheres no espaço de apenas seis meses, no Algarve, utilizou o mesmo número de telemóvel para contactar as vítimas. Esta pista foi crucial para chegar a José Mascarenhas, conhecido pela alcunha de Kenny, e acusá-lo dos dois homicídios. O arguido é suspeito de matar Sandra Antunes, motorista TVDE, em junho de 2022, e Josielly Fontes, que se dedicava à prostituição, em dezembro do mesmo ano.
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Kenny, de 28 anos, começou a ser julgado, ontem, quarta-feira, pelo homicídio de Josielly. Está acusado de oito crimes, entre os quais homicídio qualificado, sequestro e roubo. O julgamento do caso de Sandra Antunes ainda não tem data marcada.
"Não é verdade o que está na acusação. Estou de consciência tranquila", disse o arguido, na primeira sessão de julgamento, no Tribunal de Faro, que está a decorrer com Tribunal de Júri.
Mas, para os investigadores, não há dúvidas. "Tínhamos uma investigação em curso sobre o desaparecimento de uma motorista de TVDE e existia um suspeito que tinha feito contactos com a vítima Sandra Andrade. O telemóvel que foi usado nesses contactos é o mesmo que o interlocutor usou para ligar para Josielly no dia do desaparecimento", explicou, em tribunal, o inspetor-chefe da Diretoria do Sul da Polícia Judiciária (PJ), que coordenou as duas investigações.
O cartão e um cabelo da vítima
Outro inspetor também ouvido como testemunha revelou que há movimentos bancários feitos com o cartão da vítima quando já estava desaparecida e imagens de videovigilância que colocam no bar onde foi divertir-se após o homicídio.
Depois de se desfazer do corpo, Kenny foi encontrado numa berma da A22 a dormir dentro de um carro. Fugiu após ser abordado pelos militares e acabou por abandonar o carro. No interior foram encontrados os telemóveis do suspeito e da vítima, bem como o cartão de cidadão de Kenny, e um cabelo com o perfil genético da vítima.
Foi também ouvido um amigo de Josielly, que confirmou que esta chegava a ganhar 2500 euros por semana.
Segundo a acusação, terá sido essa a motivação do crime. Kenny estava com dificuldades financeiras e marcou um encontro para a roubar.
De Lisboa para o Algarve
Josielly, de nacionalidade brasileira, mudou-se de Lisboa para Vilamoura a 5 de dezembro de 2022. No dia seguinte saiu do quarto que tinha arrendado após marcar um encontro com Kenny. De acordo com a acusação, foi morta pelo suspeito, que usou o carro da própria namorada para ir até Ourique. Colocou o corpo na bagageira e foi para um estabelecimento de diversão noturna onde tentou pagar bebidas alcoólicas com o cartão da vítima. Não conseguiu por não ter o código secreto. Depois, voltou a pegar no carro, com o corpo no interior, e conduziu pelo IC1 até Santana da Serra. Atirou o cadáver para um descampado, junto a uma berma da estrada. Por fim, pegou-lhe fogo. O corpo ficou irreconhecível. Só foi encontrado em janeiro de 2023 por um homem que passava no local. A partir daqui, a investigação ao desaparecimento de Josielly seguiu novo rumo, até chegar a Kenny, que acabou acusado em fevereiro de 2024.
Homicídio de motorista de TVDE
Já em agosto deste ano, José Mascarenhas foi acusado da morte de Sandra Andrade, de 49 anos. A motorista TVDE terá sido atraída para uma emboscada e foi manietada e agredida até revelar os códigos dos cartões bancários. Depois, foi estrangulada até à morte. Durante vários dias, Mascarenhas efetuou levantamentos com os cartões de Sandra, em Portugal e em Espanha, num valor superior a dois mil euros. O corpo, colocado numa mala, foi escondido num muro, em Almancil, no concelho de Loulé, e descoberto já em decomposição, em agosto de 2022. Neste processo, Kenny foi acusado de homicídio qualificado, roubo, sequestro, coação e profanação de cadáver.
Absolvido de morte em 2018
Mas a primeira vítima do já chamado "serial killer do Algarve" terá sido Tatiana Mestre, de 29 anos, em Quarteira, em 2018. Encontrada morta dentro de um carro, com as mãos amarradas e uma camisola à volta da cabeça, foi asfixiada e a viatura parcialmente destruída por um incêndio. Kenny chegou a ser condenado a uma pena de 12 anos e um mês, mas recorreu para o Tribunal da Relação de Évora e foi absolvido. Os juízes entenderam que a decisão da primeira instância, do Tribunal de Faro, foi apenas baseada em vestígios de ADN e não em provas concretas.
Antónia Pinela, mãe de Tatiana, assistiu ao início do julgamento esta quarta-feira. Ao JN, disse ter esperança que "seja feita Justiça" e adiantou que está a tentar, através de uma advogada, perceber se há novas provas que possam levar à reabertura do processo relativo à morte da filha.