O Governo enviou ontem para a Assembleia da República (AR), para apreciação, uma proposta de lei que, se vier a ser aprovada pelos deputados, permitirá o adiamento de uma parte significativa dos julgamentos e outras diligências em curso nos tribunais.
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A medida visa travar a propagação da covid-19 e, apesar de ter sido anunciada na última quinta-feira pelo primeiro-ministro, António Costa, não tem data para entrar em vigor. Atos processuais urgentes não são abrangidos por esta suspensão, mas o objetivo é que passem a realizar-se à distância.
A remissão do diploma para o Parlamento, adiantada ao JN por fonte do Governo, acontece depois de advogados e juízes terem pedido "urgência" na aprovação da proposta de lei, cujo atraso está a gerar incerteza nos tribunais.
Em causa está o facto de, após Costa ter anunciado ao país que os prazos dos processos não urgentes ficariam suspensos, alguns magistrados terem adiado diligências agendadas para os dias seguintes, enquanto outros optaram por não o fazer, invocando, segundo a Ordem dos Advogados, liderada por Luís Menezes Leitão, "falta de previsão legal" para tal. Na quinta-feira, o primeiro-ministro comunicou o encerramento dos tribunais a par do das escolas, que, por não necessitar da aprovação da AR, se efetivou no dia seguinte.
"ajuntamentos" nos átrios
Para o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, trata-se de uma "questão de saúde pública". António Ventinhas frisa, ao JN, que, enquanto a lei não vigora, as "pessoas continuam a deslocar-se" aos tribunais, originando-se "ajuntamentos" nos átrios e salas de testemunhas.
Horas antes, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses alertara que, "face ao manifesto agravamento dos riscos de contágio, reconhecido já pelo Governo, não será possível, em muitos casos, realizar julgamentos e outras diligências com presença física de pessoas observando as condições de segurança e proteção fixadas". O organismo presidido por Manuel Soares lembrou, por isso, que os juízes "dispõem já de instrumentos legais para decidir sobre a existência ou não de condições para a realização de julgamentos".
Já o Conselho Superior da Magistratura, órgão de gestão dos juízes, defendeu, ao JN, não ter competência para autorizar o adiamento de diligências, por tal ser uma decisão dos magistrados judiciais.
Ontem também, o Ministério da Justiça reconheceu, em comunicado, a necessidade de "medidas excecionais e de caráter urgente" na "atividade judicial e administrativa" para combater a covid-19. O objetivo é, ainda, que as diligências dos processos urgentes - cujos prazos continuarão a correr e por isso não podem ser adiadas - se realizem à distância. Desde a reabertura dos tribunais, em junho, que todos os atos decorrem, preferencialmente, com todos os intervenientes na sala.
Ordem alega que riscos permitem adiar sem diploma
Além dos processos não urgentes a correr nos tribunais, julgados de paz e Ministério Público, também os procedimentos em cartórios notariais e conservatórias deverão, entre outros atos administrativos e contraordenacionais, ser abrangidos pela suspensão de prazos proposta pelo Governo. Ontem, a Ordem dos Notários defendeu que, apesar de não ter ainda sido publicado qualquer diploma legal, os titulares de processos de inventário tramitados nos cartórios notariais podem, "por sua iniciativa ou a requerimento das partes", adiar diligências, "fundamentando tal [...]com os riscos atuais para a saúde pública".
Não é inédito
Em março, os tribunais pararam em termos similares aos atuais. Em abril, os processos não urgentes passaram a poder realizar-se à distância, tal como está agora previsto. A plataforma informática usada foi alvo de críticas.
Processos urgentes
São considerados urgentes os processos para defesa dos "direitos, liberdades e garantias", os referentes a menores em perigo ou os que têm arguidos presos. Os restantes poderão ser adiados.
Medidas sanitárias
O uso de máscara é obrigatório nos tribunais A lotação das salas diminuiu, para garantir o distanciamento, e foram instalados acrílicos.
*com NM