Tribunal decide tirar crianças ao pai. Progenitor tinha ficado com as meninas após alegada mentira de técnicas.
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Seis anos depois de ter perdido a guarda de três filhas, na sequência de uma alegada mentira de técnicas da Segurança Social, e cinco anos depois de uma greve da fome, Ana Maximiano, de 39 anos, recuperou, na passada sexta-feira, as duas crianças mais novas, por decisão do Tribunal de Família e Menores (TFM) de Lisboa.
As meninas, aqui identificadas por B. e M. e hoje com oito e nove anos, tinham, em dezembro de 2015, sido entregues ao pai, então suspeito de violência doméstica e entretanto condenado a pena suspensa. A rapariga mais velha, filha de um outro homem, regressou, há dois anos, a casa da mãe.
O drama familiar ganhou destaque em 2016, quando Ana Maximiano fez uma greve de fome de mais de duas semanas em frente à Assembleia da República, entre outros locais, para protestar contra a retirada urgente das crianças, decidida pelo TFM de Cascais.
O caso remonta a 7 de dezembro de 2015, quando o pai de B. e M. se deslocou ao infantário da filha mais velha, em Oeiras, para que as meninas, pernoitassem, pela primeira vez após o divórcio, em sua casa. Ana Maximiano estava num café próximo e foi alertada para a presença do ex-companheiro pelo dispositivo eletrónico que visava assegurar, no âmbito do inquérito por violência doméstica então em curso, que Tiago A. não se aproximava de si. Decidiu ir ter com ele.
Horas depois, uma técnica da Segurança Social, Anabela Moura Vieira, requereu ao TFM de Cascais, com base em informação prestada por uma colega, Sandra Baptista, a retirada urgente à mãe de B., M. e de uma irmã destas. Para tal, alegou que a progenitora deixara a filha mais nova sozinha no café e ameaçara desaparecer com as meninas. A acusação tem sido, desde sempre, negada por Ana Maximiano e por várias testemunhas.
Técnicas julgadas
O caso arrastou-se na Justiça e, em janeiro de 2020, o Tribunal da Relação de Lisboa mandou julgar as duas assistentes sociais por falsidade de depoimento e denegação de justiça ou prevaricação. Já em 2018, foi retomado no TFM, após três anos suspenso, o processo de regulação das responsabilidades parentais, que agora chega ao fim.
Na prática, as meninas regressam a casa da mãe e passam a contactar com o pai com a mesma regularidade com que, até aqui, se relacionavam com a progenitora. A juíza centrou-se sobretudo na atual situação das crianças e não na sua retirada à progenitora, em 2015.
Ao JN, o advogado de Ana Maximiano não quis comentar. "O foco principal neste momento é a condenação das técnicas que criaram esta situação", frisa Gameiro Fernandes. O julgamento começa a 1 de fevereiro, no Tribunal Criminal de Cascais.
Pormenores
Mudança de região
Com a decisão agora tomada pelo TFM de Lisboa, as crianças vão mudar-se de Lisboa para uma cidade da região Oeste, passando a frequentar uma nova escola. A distância impede a guarda partilhada.
Sem maus tratos
O TFM de Lisboa não encontrou sinais de maus tratos por parte de qualquer dos progenitores. Prevaleceu a vontade das meninas.
Cinco filhos
Ana Maximiano tem, no total, cinco filhos, dos quais quatro ficam agora a morar consigo. O quinto, de uma primeira relação e o mais velho de todos, mora com o pai, sem qualquer conflito.
Segurança Social arrisca indemnizar
Ana Maximiano exige ser indemnizada em cerca de 600 mil euros pelo Instituto de Segurança Social (ISS) e pelas técnicas que, em 2015, requereram ao tribunal a retirada urgente das filhas. O pedido vai ser julgado a par da acusação criminal contra Anabela Moura Vieira e Sandra Baptista. Inicialmente, o Tribunal Criminal de Cascais decidira, liminarmente, que o ISS não poderia ser demandado, mas a decisão foi revertida pelo Tribunal da Relação de Lisboa. A advogada das técnicas, Rita Travassos Pimentel, tem "absoluta convicção sobre a razão" de ambas. Incorrem em pena de multa ou prisão.