Mais mil crianças estiveram em parte incerta no ano passado. Férias e fins dos períodos escolares são críticos.
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As autoridades receberam, no ano passado, 1004 participações de desaparecimento de menores. Em média são três crianças por dia que ficaram em parte incerta. Mas a esmagadora maioria dos casos refere-se a fugas de instituições, onde os menores foram acolhidos, e também de casa. Raros são os casos em que as crianças não reaparecem ao fim de algumas horas e em que a ausência revela-se crime grave como foi o caso da pequena Valentina, de Peniche. Apesar de o número de menores que desaparecem ter vindo a baixar nos últimos anos, a Associação Portuguesa de Crianças Desaparecidas (APCD) continua preocupada com os casos de raptos parentais.
Quando fogem de instituições em que se encontram internados, os menores visam ir ter com familiares ou amigos. Existem casos em que o mesmo menor desaparece várias vezes ao longo do ano.
"Nas instituições existem muitas crianças que têm vontade de ir ter com as famílias e isso acontece normalmente nos fins dos períodos escolares. É nas férias de verão, da Páscoa ou do Natal que se verificam mais casos. Não há escola e a fuga acaba por ser mais facilitada, tal como quando as crianças fogem de casa", explicou ontem ao JN - por ocasião do Dia Internacional da Criança Desaparecida - Patrícia Cipriano, presidente da APCD.
Entre 12 e 17 anos
As ausências dos menores, que têm em regra entre 12 e 17 anos, são logo comunicadas às autoridades. Normalmente, aparecem por vontade própria ao fim de poucas horas. Quando assim não acontece, as polícias têm de as localizar. "A lei tem, hoje em dia, melhores mecanismos para poder encontrar os menores. Podemos acionar de forma quase imediata a localização dos telemóveis", explicou ao JN fonte da Polícia Judiciária (PJ), entidade que concentra os números de crianças desaparecidas em Portugal e investiga os casos em que existem suspeitas de rapto, de abuso sexual ou de cenários piores, como foi o caso da Valentina, morta pelo pai, que, a par da madrasta, escondeu o cadáver da filha num pinhal.
Há dias, a PJ de Vila Real localizou duas menores de 14 anos desaparecidas de uma instituição da zona de Chaves. As adolescentes estavam na companhia de dois amigos, com cerca de 20 anos. Foram devolvidas à instituição de onde tinham fugido e foi aberto um inquérito por eventual abuso sexual, em face da sua idade.
Os casos de raptos parentais continuam em minoria em Portugal, mas preocupam a APCD. "São incumprimentos da regulação de responsabilidades parentais que, em alguns casos, levam os adultos a irem para o estrangeiros com os filhos. Existem situações em que desapareceram durante anos. O que é naturalmente muito preocupante", disse Patrícia Cipriano.
Mãe de Rui Pedro mantém esperança de voltar a vê-lo
Há três datas no ano que são particularmente difíceis para Filomena Teixeira, mãe de Rui Pedro, desaparecido de Lousada desde 4 de março de 1998: o dia em que o filho az anos, o dia em que o viu pela última vez e também o Dia Internacional das Crianças Desaparecidas. As recordações e saudades vêm sempre ao de cima nestas alturas, mas a mulher mantém firme a esperança. "Nunca perco a esperança de voltar a ver o meu filho. Não sei onde vou buscar a força de alimentar a esperança, mas mantenho", disse, na segunda-feira, Filomena ao JN, que confessa ter passado mais dificuldades nos últimos meses. "Com esta pandemia, este ano, tem sido mais difícil. Tenho de ficar mais por casa e isso lembra-me mais a falta que me faz o meu querido filho", explica a mulher, que continua, ano após ano, ansiosa por saber o que aconteceu no dia do desaparecimento de Rui Pedro.
À lupa
55 000 chamadas
As linhas europeias para crianças desaparecidas responderam a mais de 55 mil chamadas no ano passado, segundo relatório da organização Missing Children Europe, que mostra que a maioria dos novos casos refere-se a fugas.
SOS criança
A linha de apoio "SOS Criança", do Instituto de Apoio à Criança, recebeu este ano 10 apelos relacionados com crianças desaparecidas. Fugas de casa ou de instituições constituem metade dos casos.
14 crianças por encontrar
Em Portugal existem 14 crianças que nunca foram encontradas, como o caso de Rui Pedro ou de Madeleine McCann.