Período para a entrega voluntária de armas sem penalizações criminais vai até 23 de junho deste ano.
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Aos 82 anos, um oficial do Exército na reforma escolheu o dia 5 de maio para se dirigir ao Departamento de Armas e Explosivos (DAE) da PSP, em Lisboa, e entregar uma Kalashnikov, que guardava em casa desde o fim das campanhas militares em África. Fê-lo para evitar, como confessou, problemas aos familiares após a sua morte, uma vez que a posse desta arma de guerra é ilegal.
Contudo, o octogenário, mesmo admitindo a propriedade da Kalashnikov, não será alvo de multa ou penalização criminal. Isto porque a devolução da pistola, também conhecida por AK47, foi efetuada no âmbito do período extraordinário de entrega de armas, criado pelo Governo em 24 de fevereiro deste ano e que se estende até 23 de junho.
Tal como este idoso, outras cerca de 1220 pessoas se desfizeram também das armas que mantinham, ilegalmente, em casa. Metade daquelas entregas à GNR e à PSP foram realizadas nos distritos de Setúbal (20%), Lisboa (18%) e Aveiro (12%). E a maioria eram caçadeiras que, segundo o superintendente Pedro Moura, "pertenciam a caçadores que não renovaram a licença". "As restantes eram pistolas, carabinas e revólveres. Estas armas nunca tiveram manifesto, ou seja, estiveram sempre ilegais e a sua existência não era conhecida pelas autoridades. Vieram do estrangeiro, algumas trazidas por emigrantes e outras compradas pela Internet", explica o diretor do DAE.
Cifras negras
Contando com o período de entrega voluntária a decorrer, é a terceira vez que o Governo permite que as pessoas se livrem de armas ilegais sem nenhuma implicação criminal ou coima. A primeira ocorreu em 2006 e, em 120 dias, a PSP recebeu 6635 pistolas, revólveres e caçadeiras. Já entre setembro de 2019 e julho de 2020, os portugueses entregaram 7500 armas. Quase todas acabaram destruídas em sucatas, através de processos controlados pela PSP.
"É impossível dizer quantas armas ilegais há no país. Mas é uma situação preocupante, porque algumas foram furtadas, extraviadas, compradas com documentos ilegais ou usadas em crimes pelos proprietários", defende o responsável do DAE.
Segundo a Europol, 30% das armas ilegais na União Europeia são espingardas, 22% são pistolas e 15% são carabinas. Em Lisboa, os especialistas europeus destacaram ainda que o tráfico de artigos pirotécnicos, considerados igualmente armas ilegais, começa a assemelhar-se ao tráfico internacional de drogas. E deram o exemplo dos petardos.
Também conhecidos por "flash bangers", a produção anual destes artigos pirotécnicos com elevada carga explosiva ultrapassa as 1,1 milhões unidades. Contudo, os registos oficiais contabilizam apenas a comercialização de 951 mil unidades. Ou seja, 185 mil petardos foram traficados e acabaram nas mãos de criminosos ou claques de clubes desportivos.