O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa considerou esta quarta-feira como "nula a decisão da Subdiretora-geral da DGAJ (Direção-Geral da Administração da Justiça) de 16.02.2023 que determina a marcação de faltas aos oficias de justiça de manhã/tarde ou dia inteiro, conforme façam greve a um ato de manhã ou à tarde ou a um ato de manhã e outro à tarde".
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A sentença, a que o JN teve acesso, declara "é nulo o ato que determina a marcação de faltas, às quais não correspondem qualquer ausência do trabalho ou uma efetiva suspensão do contrato de trabalho por motivos de greve, e consequente perda de remuneração". A decisão surge no âmbito de uma "Intimação para proteção dos direitos, liberdades e garantias" interposta pelo Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ).
O despacho do juiz salienta que, "ainda que assim não fosse a decisão da DGAJ sempre seria anulável por violação dos princípios da proporcionalidade e da legalidade, por força do disposto no artigo 163º do CPA (Código do Procedimento Administrativo).
E sublinha: "a marcação de uma falta ao trabalho correspondente a meio dia por cada ato não praticado, consubstancia unicamente, a final, uma penalização financeira destinada a dissuadir pecuniariamente o exercício de um direito reconhecido pela Constituição, já que os trabalhadores estão presentes no local de trabalho durante todo o dia a praticar atos que não sejam os que constam no aviso de greve, pelo que a entidade requerida não poderá marcar-lhes falta e retirar-lhes a remuneração correspondente".
Na opinião do magistrado, "continuando os funcionários judiciais a trabalhar, apesar de se recusarem a desempenhar algumas das suas funções, não há lugar a suspensão do contrato de trabalho, nem à correspondente perda do direito à retribuição (artigo 59. °, n.º 1, al. ª a), da Constituição".
"Essa nulidade resulta não só do disposto no artigo 540º, nº1 do Código do Trabalho já que a decisão configura uma tentativa de dissuasão (coação) através da provocação de prejuízo na esfera jurídica dos trabalhadores; mas também do disposto no artigo 161º do CPA, porquanto viola o núcleo essencial dos direitos fundamentais à remuneração (artigo 59º, nº1, al. a) da CRP- Constituição da República Portuguesa) e à greve (artigo 57.º, nº1 da CRP)", acrescenta o juiz.
A decisão consagra ainda que "em consequência do ato impugnado não subsiste o mínimo sem o qual esses direitos podem não subsistir enquanto tal, isto porque a marcação das faltas e a inerente perda da remuneração quando os trabalhadores se encontram a executar as suas tarefas, vai além do limite absoluto correspondente à finalidade e ao valor que justifica os direitos à remuneração e à greve".
Na ação, o Ministério da Justiça havia defendido que o ato da DGAJ era inimpugnável e que o meio processual era inadequado, teses que o juiz rejeitou.
Recorde-se que, conforme o JN noticiou, o Conselho Consultivo da PGR - Procuradoria Geral da República emitiu, há dias, um parecer sobre a greve dos oficiais de justiça, no qual defende que é ilegal, traz consequências disciplinares e implica perda de salário, neste caso, correspondente ao tempo em que se esteve paralisado.
O parecer, emitido a pedido da ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, sustenta que, "as condutas, de recusa de uma parte da prestação laboral, normalmente designadas como «greves impróprias», constituem um mero cumprimento irregular ou defeituoso do contrato de trabalho, com consequências civis e disciplinares".
Ainda esta quarta-feira a ministra veio esclarecer que o parecer valerá apenas para situações futuras, pelo que não haverá consequências disciplinares no âmbito desta greve.
O Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ) tem em curso, desde 15 de fevereiro, uma paralisação a audiências e certos atos de secretaria, que já afetou milhares de diligências nos tribunais e Ministério Público. Na prática, os oficiais de justiça apresentam-se ao trabalho, abdicando durante o dia de realizar obrigações abrangidas pelo pré-aviso. O protesto deve prolongar-se até 15 de abril.