Rapper francês gravou filme nos bairros da Pasteleira Nova e do Cerco do Porto. PSP conseguiu apurar identidades de nove protagonistas.
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Há mais de dois anos, um videoclip de um rapper francês, filmado nos bairros do Cerco e da Pasteleira Nova, no Porto, alarmou as autoridades policiais. As imagens mostravam, em plena rua, vários homens empunhando armas de fogo, a consumir droga e a mostrar maços de notas. A PSP identificou nove dessas pessoas, todas com um longo cadastro, e comunicou a sua identidade ao Ministério Público, mas, um ano depois, a procuradora arquivou o inquérito. A magistrada alegou que uma nova investigação poderia colidir com outras que já estavam em curso. E ninguém vai ser punido.
O artista francês chama-se Sofiane, tem 36 anos e o hábito de filmar os videoclips das suas músicas em bairros problemáticos, conotados com o tráfico de droga e rotulados de violentos. Já o fez na periferia da capital francesa, Paris, onde reside, mas também em vários países da Europa de Leste. No início de 2020, escolheu o Porto e os bairros do Cerco e da Pasteleira Nova.
As imagens tornadas públicas em fevereiro desse ano mostram vários homens a exibir armas de fogo de vários tipos e calibre. Algumas são disparadas ao som da música cantada pelo rapper. Outros indivíduos aparecem no filme equipados com coletes balísticos, enquanto outros surgem com sacos daquilo que aparenta ser droga. Há ainda quem exponha para a câmara avultadas quantias de dinheiro, naquilo que a PSP entendeu ser uma "alusão clara ao lucro fácil que o crime proporciona".
Tudo é feito nas ruas dos bairros portuenses, durante o dia e à vista de todos. As mesmas ruas que são usadas para manobras perigosas de motos e para passear cães de raças potencialmente perigosas.
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Todos cadastrados
Nos dias seguintes à publicação do videoclip, a PSP anunciou a abertura de um inquérito, considerando que o que ali se via era grave e suscetível de configurar crimes de tráfico de droga e posse ilegal de arma. Pouco depois, e através da análise das imagens, a Divisão de Investigação Criminal conseguiu identificar nove dos figurantes. Todos com um longo cadastro por crimes como detenção de arma proibida, tráfico de droga, ofensa à integridade física, roubo, furto e até violência doméstica.
Um dos homens sinalizados está envolvido em 30 processos judiciais e outro está ligado a 19 inquéritos que a PSP tem em curso. Os restantes também são velhos conhecidos das forças de segurança.
Faltaram apreensões
Na posse da informação transmitida pela PSP, a procuradora Lara Gomes da Rocha considerou que "os factos constantes do vídeo podem ser suscetíveis de integrar, em abstrato, os crimes de tráfico de estupefacientes de menor gravidade e de detenção de arma proibida". Mas acrescenta que, apesar de terem sido identificados alguns dos participantes, "não foi apreendida qualquer arma" ou droga.
A magistrada do Departamento de Investigação e Ação Penal do Porto salienta, num despacho consultado pelo JN, que "correm inúmeras investigações por crime de tráfico de estupefacientes, cujos factos ocorreram ou veem a ocorrer nos bairros onde foi filmado o vídeo". E concluiu que, "sem qualquer dado concreto ou apreensão de material estupefaciente ou arma", a continuação da investigação poderia colidir com outras que decorrem.
A procuradora defende, ainda, que não seria "profícuo, apenas com base numas imagens de um videoclip, através das quais nem sequer é possível aferir se o material que aparece é verdadeiro ou apenas meras réplicas ou simulações, se inicie uma investigação em relação a suspeitas que já estão a ser investigadas noutros processos".
O inquérito foi, assim, arquivado em janeiro do ano passado, sem que nenhum dos figurantes fosse acusado e condenado de qualquer crime.