O juiz Neto de Moura pediu para deixar de julgar casos de violência doméstica, pelo menos durante um período, mas o Supremo Tribunal de Justiça negou-lhe o pedido.
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Segundo avança o "Público", foi em junho, depois de o JN ter divulgado o acórdão que desculpabilizava um caso de violência doméstica com o adultério cometido pela vítima, que o magistrado se viu perante mais um caso relacionado com o mesmo crime. Tratava-se de um recurso apresentado por um suspeito de violência doméstica que se encontrava preso preventivamente e que o tribunal de primeira instância da Maia se recusava a libertar.
No pedido de escusa que enviou ao Supremo, o juiz do Tribunal da Relação do Porto mostrou sentir-se desconfortável, qualquer que fosse a decisão que tomasse, apesar de o próprio Ministério Público defender que o suspeito devesse ficar a aguardar julgamento em prisão domiciliária.
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Por um lado, equacionou o juiz, se decidisse "no sentido da revogação da prisão preventiva", seria" altamente provável" que se desencadeasse "mais histeria, mais campanhas de ódio e mais exigência de reacção punitiva por parte do Conselho Superior da Magistratura". Por outro, se a decisão fosse no sentido da manutenção da prisão preventiva, "o arguido, com toda a legitimidade," diria "que toda esta situação afectou a isenção e a liberdade de decisão" do magistrado, colocando "em causa a justiça da decisão".
Na missiva, Neto de Moura queixava-se de "algumas pessoas" terem "cavalgado esta onda de mentira e deturpação" sobre as suas decisões, promovendo contra si "uma campanha de ódio e de instigação à violência, com apoio da comunicação social", citou o jornal.
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"Tem-se andado a escabichar as decisões em que intervém o juiz para as pôr em causa e encontrar um pretexto (qualquer que seja) para prosseguir a campanha persecutória", que, no seu entender, estava a conseguir ter impacto dentro do Conselho Superior da Magistratura, disse no pedido enviado ao Supremo.
Julgando haver o risco de a sua intervenção gerar desconfiança, "por estar condicionado e, portanto, não ter plena liberdade de decisão", Neto de Moura pediu então aos colegas do Supremo para não ser obrigado a julgar o caso. Um pedido que, a julgar pela resposta negativa que recebeu, não se circunscreveu só a este caso.
"O senhor juiz desembargador parece implicitamente pretender que o Supremo Tribunal de Justiça o dispense, pelo menos por um determinado período de tempo, de intervir em processos que versem sobre violência doméstica. Trata-se de desejo que, pela sua natureza e extensão, não pode ser acolhido por este tribunal", pode ler-se no acórdão que responde ao pedido de Neto de Moura, ao qual o "Público" teve avesso.
Isto porque não existe uma lei que permita ao Supremo dispensar um juiz de todos os casos de determinado género, sendo que os pedidos de escusa têm de ser apresentados situação a situação.