Magistrados estão isentos de taxas em ações relativas ao exercício de funções. Humoristas respondem com mais críticas e até um jogo.
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Se a ideia dos processos era silenciar os críticos, não funcionou. A resposta dos humoristas visados pelo juiz desembargador Neto de Moura foi violenta e carregada de sarcasmo. Ricardo Araújo Pereira criou até um jogo de computador, num site na Internet (www.salvaoneto.pt). Ao JN, o advogado do magistrado responde que as reações "são uma manifestação de quem as faz" e só reforçam o que já tinha dito: "esta é uma clara violação de um direito". E é por isso que o assunto vai ser resolvido nos tribunais.
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Este fim de semana, Ricardo Serrano Vieira, advogado que representa Neto de Moura, avançou que duas dezenas de nomes deverão ser alvo de processos cíveis, ações que poderão resultar em indemnizações de "dezenas de milhares de euros".
Para um cidadão comum, esta iniciativa implicaria elevadas custas judiciais, pois são calculadas em função do valor da ação para desincentivar pedidos excessivos. Porém, Moura poderá instaurar dezenas e dezenas de processos, pedir vários milhões de euros e nada pagará. Os magistrados estão isentos de custas judiciais nos processos relacionados com o exercício de funções, como aparenta ser o caso e é convicção da defesa do magistrado. Ou seja, o Estado deixa de receber o dinheiro. A juntar a isto, refira-se que os processados terão sempre despesas processuais, quanto mais não seja com a própria defesa.
Ontem, Ricardo Serrano Vieira assegurou que esse fator não pesou "de modo algum" na decisão. Aliás, revelou que não foi decidido o montante das indemnizações. "Ainda estamos a avaliar. Existem vários acórdãos sobre valores para casos deste género" e será com base neles que irão decidir.
O que é ponto de honra para o juiz e para o seu advogado é que houve uma violação de um direito e que "o que está em causa é o reconhecimento dessa violação e a consequente reparação".
O juiz desembargador jubilado Caetano Duarte defende que "quando uma pessoa tem esta posição perante a violência doméstica, não pode julgar estes casos" e convidou Neto de Moura - "que está a interpretar muito mal a lei" - a afastar-se. Até porque - disse à RTP3 - este caso "prejudica muito a imagem da justiça".
Também o bastonário dos advogados, Guilherme Figueiredo, afirmou ao "Público" que a solução não passa por sanções disciplinares, mas pelo afastamento de juízes sem formação adequada ao julgamento de violência doméstica.
Já o presidente da Associação Sindical dos Juízes considerou que "o direito de crítica não permite o insulto" e pôs-se ao lado do desembargador Joaquim Neto de Moura. "Um juiz também tem direitos, não é apenas um saco de pancada", reagiu Manuel Ramos Soares.
Bruno Nogueira
"Se o senhor não se sentisse ofendido, provavelmente eu não estava a fazer bem o meu trabalho. Eu também me sinto ofendido com o que o senhor escreve nos acórdãos."
Ricardo Araújo Pereira
"Ele tem o direito de se sentir ofendido. Eu tenho o direito de dizer coisas que potencialmente o ofendem."
Pormenores
Petição com 15 mil
Mais de 15 mil internautas já subscreveram uma petição online para o "Afastamento do Juiz Neto de Moura". Os autores "exigem" que o visado "seja impedido de exercer a função de juiz, visto ter dado mostras de incapacidade total para exercer tal função".
Advertência
Neto de Moura foi punido pelo Conselho Superior da Magistratura com uma advertência registada pela linguagem num acórdão em que era atenuada a gravidade de um caso de violência doméstica porque a vítima tinha sido adúltera. O caso foi dado em primeira mão pelo JN em 2017.
Jogo de computador
Ricardo Araújo Pereira lançou "Salva o Neto", um jogo de computador cujo objetivo é evitar que o juiz seja atingido pelos dejetos da opinião pública.