Inquérito da Rede Europeia de Conselhos de Justiça mostra que magistrados europeus consideram ter independência. Mas, em Portugal, quase metade reconhece que pode existir intervenção externa nas decisões tomadas.
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Cerca de 40% dos juízes em Portugal admitem a possibilidade de existirem magistrados que são influenciados nas suas deliberações judiciais pelas notícias dos meios de comunicação social. E também há dúvidas sobre a forma como os processos são distribuídos.
As duas conclusões constam de um inquérito feito pela Rede Europeia de Conselhos de Justiça (RECJ), a que o "Diário de Notícias" teve acesso e que procurou saber a opinião dos juízes europeus sobre a independência da classe. O documento deixa alguns alertas acerca da forma como a profissão é exercida, incluindo no que diz respeito a condições de trabalho e a eventuais pressões a que magistrados dos vários países da Europa são sujeitos.
O inquérito foi realizado no primeiro trimestre de 2022 e contou com a participação de mais de 15.800 juízes de 29 autoridades judiciais de 27 países, sendo que, no caso de Portugal, responderam cerca de 500 profissionais, avança o DN.
O estudo, efetuado pela quarta vez, concluiu que a maioria (61%) dos magistrados europeus considerou ter grande independência no trabalho, e que esta foi reforçada com a entrada dos seus países na União Europeia. No entanto, um ponto comum a todos os países é a perceção da existência de colegas da classe suscetíveis de sofrer "influências externas".
Influência da distribuição dos processos
Em Portugal, 40% dos juízes responderam positivamente à seguinte questão: "Acredito que, no meu país, durante os últimos três anos, houve decisões ou ações de juízes a título individual que foram influenciadas indevidamente por ações atuais, prévias ou expectáveis, dos meios de comunicação social (imprensa, televisão ou rádio)". Nos países nórdicos, no Reino Unido, na Irlanda, República Checa e Chipre, o cenário inverte-se, com menos de 10% dos juízes a considerar que existe esse impacto da comunicação social.
Por outro lado, a influência das redes sociais foi considerada inadequada por menos inquiridos, com Portugal a registar a terceira maior percentagem (22%) da lista.
A distribuição dos processos foi outro dos tópicos do inquérito da RECJ. Portugal e Espanha lideram a perceção de que a atribuição de um processo a determinado magistrado constitui uma pressão externa sobre este, no sentido em que "pode determinar o resultado desses processos". "Acredito que, durante os últimos três anos, foram distribuídos processos a juízes à revelia das regras ou procedimentos estabelecidos, a fim de influenciar o resultado do(s) litígio(s) em questão" - a esta questão, 27% dos inquiridos portugueses responderam positivamente, por oposição a 52%, que responderam negativamente.