O presidente da Transparência Internacional Portugal, Nuno Cunha Rolo, considera que "o Estado não fez as coisas como devia fazer" ao desfasar a entrada em vigor do Regime Geral de Proteção de Denunciantes de Infrações (RGPDI) do início do funcionamento do Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), ao qual compete a fiscalização da aplicação daquele diploma.
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Em causa está o facto de, apesar de o RGPDI vigorar desde junho de 2022, o MENAC, ainda em implementação, só poder, segundo o paralelo Regime Geral de Prevenção da Corrupção, sancionar qualquer entidade a partir de junho deste ano. As coimas por irregularidades nos canais de denúncia interna vão de 500 a 12 500 euros para pessoas singulares, e de mil a 125 mil para pessoas coletivas.
"Infelizmente, colocam-se primeiro as regras em vigor antes de as organizações que têm a obrigação de as vigiar e fiscalizar estarem em funcionamento. É um mau princípio", afirma, ao JN, Nuno Cunha Rolo, lamentando que a formação para quem irá lidar com as denúncias seja "quase nula".
"Tem de ser feito antes, para as pessoas levarem isto a sério. Porque, se não, não é mais do que uma "checklist" que os dirigentes sentem necessidade de cumprir, de pôr o "xis" ou o visto, e pouco mais", sustenta.
Denúncias erradas
O presidente da Transparência ressalva, ainda assim, que, mesmo no setor público, há entidades que não estão obrigadas a ter um canal de denúncia interna que o têm implementado. E, embora a lei não determine que tem de existir uma plataforma eletrónica para participar infrações, essa tem sido uma das soluções adotadas, também no privado.
Whistleblower Software, WireMaze e Closer Consulting são três das empresas que disponibilizam essa funcionalidade e que estão já presentes em mais de 450 entidades, a maioria da Administração Central e Local. Outras 112 estão já em processo de formalização.
Segundo a Whistleblower Software, a fraude, o conflito de interesses, o suborno, e o bullying e sexismo/assédio sexual estão entre os atos mais denunciados. O RGPDI não abrange, contudo, os dois últimos.
"É necessário apostar na sensibilização e formação do público do que é uma denúncia", corrobora ao JN César Silva, da WireMaze.
A encriptação de dados e a limpeza de metadados são algumas das ações que garantem confidencialidade.
PGR não sabe quantas denúncias foram internas
A Procuradoria-Geral da República (PGR) desconhece quantas das denúncias encaminhadas para o Ministério Público por outras entidades tiveram origem em participações internas, no âmbito do regime de proteção do denunciante.
O organismo explica que, além de o sistema informático não permitir essa pesquisa, não há "qualquer obrigação de indicar, aquando da remessa da denúncia, se esta foi recebida através de canal externo ou interno de denúncias".
Em termos de denúncias externas, o Ministério da Defesa Nacional, o da Administração Interna e, na dependência do das Finanças, a Inspeção-Geral de Finanças foram as entidades que, desde junho, receberam mais participações. Foram cerca de 500.