Salgado começa a ser julgado esta segunda-feira em processo separado do Marquês
Juiz de instrução ilibou ex-líder do BES de 18 crimes e ordenou que fosse julgado, sozinho, por três que cometeu ao desviar 10,7 milhões de euros.
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Ricardo Salgado começa a ser julgado amanhã, em Lisboa, por alegadamente se ter apropriado, em 2011, de cerca de 10,7 milhões de euros do Grupo Espírito Santo (GES).
O ex-presidente deste grupo e do Banco Espírito Santo (BES), de 76 anos, responde por três crimes de abuso de confiança, puníveis, cada um deles, com pena de um a oito anos de prisão.
O processo é o primeiro a chegar a julgamento, depois de, há dois meses, o juiz Ivo Rosa, do Tribunal Central de Instrução Criminal, ter mandado julgar separadamente vários arguidos da Operação Marquês, cujo protagonista é o ex-primeiro-ministro José Sócrates.
Mas, ao que o JN apurou, as diligências correm o risco de ser suspensas logo após o seu início, uma vez que a defesa do ex-banqueiro não tinha entregado, até à última sexta-feira, a contestação à acusação, e o prazo para o poder fazer só terminará na próxima quarta-feira.
Contactado pelo JN, o advogado de Salgado, Francisco Proença de Carvalho, não quis comentar o caso.
recurso a offshores
Em causa estão, segundo o Ministério Público (MP), três situações, duas das quais relacionadas entre si. A primeira, datada de 21 outubro de 2011, diz respeito à transferência de quatro milhões de euros de uma conta de uma sociedade do GES na Suíça, a ES Enterprises, para uma conta de uma sociedade no Panamá controlada por Salgado, a Savoices.
De modo a tapar o buraco deixado naquela entidade, Salgado terá pedido a Henrique Granadeiro, à data administrador da Portugal Telecom, que transferisse para outra offshore por si controlada, a Begolino, 3 967 611 euros. Apesar de ter saído de uma conta de Granadeiro, o dinheiro pertenceria, no entanto, ao GES.
Na mesma altura, foram transferidos mais 2 750 000 euros da ES Enterprises para a Savoices, com passagem por uma conta de uma sociedade do empresário luso-angolano Hélder Bataglia.
Com estas operações, o ex-banqueiro terá desviado para a sua esfera pessoal um total de 10 717 611 euros. Segundo a acusação, a fortuna terá, entre outros fins, servido para comprar ações da EDP. A conta da Begolino terá ainda sido usada, em 2012, para, nomeadamente, adquirir diamantes e repatriar ativos, beneficiando de amnistias fiscais.
Em 2017, ao deduzir a acusação da Operação Marquês, o MP considerou que, dos três crimes de abuso de confiança imputados a Salgado, dois tinham sido praticados em coautoria: um com Bataglia e outro com Granadeiro. Mas, em 9 de abril último, estes dois arguidos foram ilibados dos crimes por Ivo Rosa, que ordenou que processo de Salgado fosse separado e este fosse julgado sozinho, por apenas três dos 21 crimes de que fora acusado - os restantes 18 caíram na fase de instrução.
defesa contra separação
Apesar desta redução de crimes, a separação processual é contestada pela defesa de Salgado, que alega que, face ao recurso que o MP vai interpor da decisão instrutória, a matéria em julgamento ainda não está estabilizada (ler caixa). Um entendimento que não impediu o coletivo de juízes presidido por Francisco Henriques de agendar o início do julgamento para amanhã e outras quatro sessões até ao dia 15.
MP associou transferências a luvas milionárias
O Ministério Público acredita que as transferências por que Ricardo Salgado será julgado estão relacionadas com subornos, de mais de 65 milhões, que o antigo banqueiro pagou ao ex-primeiro-ministro José Sócrates e a dois ex-administradores da PT, Zeinal Bava e Henrique Granadeiro. A tese foi, porém, rejeitada por Ivo Rosa. A 9 de abril, o juiz ilibou os gestores de todos os crimes e pronunciou Sócrates apenas por branqueamento e falsificação de documento. Salgado, por seu lado, tem reiterado que nunca corrompeu ninguém.