Sócrates contesta decisão do Conselho Superior de Magistratura e fala em manipulação
José Sócrates anunciou, esta quarta-feira, que vai impugnar na Justiça a decisão do Conselho Superior de Magistratura (CSM) de "atribuir exclusividade de funções" a duas das três juízas que decidiram mandar o ex-primeiro-ministro para julgamento por corrupção. Sócrates fala em manipulação.
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Em causa está o facto de tal ter permitido que as magistradas se mantivessem no processo mesmo depois de terem sido transferidas, em setembro de 2023, do Tribunal da Relação de Lisboa, onde foi decidido o recurso da decisão instrutória do juiz Ivo Rosa, para outros tribunais de segunda instância. O acórdão foi proferido em janeiro de 2024 e as magistradas estavam em exclusivo no recurso da Operação Marquês desde julho de 2023.
"É a segunda vez que falsearam o processo de escolha dos juízes. Da primeira vez, o Conselho Superior da Magistratura tentou encobrir. Desta vez, é o autor da manobra", afirmou em conferência de imprensa, num hotel na Ericeira, José Sócrates, numa alusão quer à questão da exclusividade quer à distribuição inicial do acompanhamento do inquérito, em 2014, ao juiz Carlos Alexandre, então colocado no Tribunal Central de Instrução Criminal.
"O regime de exclusividade não é relevante para fixar competência jurisdicional sobre processos. É um instrumento de gestão de recursos humanos. Nenhum estatuto de 'exclusividade de funções' transforma uma juíza da Relação do Porto numa juíza da Relação de Lisboa, nem permite que uma juíza da Relação de Guimarães possa continuar a decidir processos que são da jurisdição da Relação de Lisboa. Numa palavra: o que aconteceu foi ilegal", sublinhou, visando o Conselho Superior da Magistratura, o antigo primeiro-ministro (2005-2011), de 66 anos.
Várias decisões contraditórias
Em 2017, o Ministério Público tinha acusado José Sócrates de 31 crimes, por ter sido alegadamente corrompido pelo ex-banqueiro Ricardo Salgado, os sócios do empreendimento Vale do Lobo e por administradores do grupo Lena. Carlos Santos Silva, amigo do ex-governante, teria sido o seu testa
de ferro.
Em abril de 2021, o juiz Ivo Rosa, então colocado no Tribunal Central de Instrução Criminal, descortinou apenas seis crimes, mas considerando que Santos Silva fora, afinal, o seu corruptor. Foram ambos mandados para julgamento, num processo separado, por falsificação de documento e branqueamento.
Quase três anos mais tarde, em janeiro de 2024, o Tribunal da Relação de Lisboa voltou, no essencial, à versão inicial do Ministério Público no processo principal, mas corrigindo juridicamente os crimes de corrupção e aumentando os prazos de prescrição . E, em março seguinte, a mesma instância anulou a decisão instrutória do juiz Ivo Rosa e devolveu o processo ao Tribunal Central de Instrução Criminal para ser reanalisada à luz da tese do Ministério Público.
Esta quarta-feira, o advogado de José Sócrates, Pedro Delille, alegou que, "neste momento, o processo acabou". "O processo foi recolocado na fase prévia à decisão instrutória [de abril de 2021]", acrescentou.
O causidico defende, por isso, que ambos os processos têm de voltar ao Tribunal do Central de Instrução Criminal para ser proferida nova decisão que, por, diz, todos os crimes já terem" prescrito", só poderá ser de "não pronúncia" - ou seja, de ilibação.
O entendimento, que José Sócrates ressalvou que é o seu e da sua defesa, não é consensual.