As juízas destacaram a "frieza e indiferença" dos arguidos que "apagaram os indícios e seguiram com as suas vidas".
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O Tribunal de Guimarães condenou, esta quarta-feira, o antigo empresário da noite, António Silva (Toni do Penha), e o cúmplice José Miguel Carvalho, a 20 anos de prisão pelo homicídio de Fernando Ferreira (conhecido como “Conde”), em janeiro de 2020, em Santo Estevão de Briteiros. O tribunal considerou provados, no essencial, os factos que constavam da acusação. O coletivo de juízas ficou convicto de que os arguidos atiraram a vítima ao rio Ave, depois de lhe darem “um aperto” para recuperar 135 mil euros que tinham sido furtados da residência de Toni.
De acordo com o tribunal, Toni do Penha e o seu “jagunço”, José Miguel Carvalho, puseram em marcha um plano, “previamente acordado” para matar Fernando Ferreira, caso o “aperto” para conseguir que ele devolvesse os 135 mil euros que António Silva acreditava que ele tinha furtado não surtisse efeito. O tribunal sublinhou o facto de Toni, mesmo depois do desaparecimento da vítima, continuar a fazer pressão sobre a família para tentar reaver o dinheiro.
A 8 de janeiro de 2020, Toni atraiu Fernando Ferreira, com um telefonema de um equipamento comprado apenas para esse efeito, ao restaurante Sombras do Ave, a pretexto de um trabalho de eletricidade. Levou com ele José Miguel Carvalho, que se encarregou de arranjar mais dois amigos, Bruno Oliveira e João Cunha. A vítima foi depois levada para um local ermo e mal iluminado, junto ao rio Ave, para ser confrontado com o furto dos 135 mil euros. Para as juízas, toda a preparação, o facto de Toni se fazer acompanhar de um “jagunço” e o local escolhido, contribuem para a convicção de que havia já intenção de matar, caso não conseguissem recuperar o dinheiro.
Embora não tenham sido condenados, Bruno Ferreira e João Cunha não escaparam à crítica do tribunal. “É impossível que não tenham suspeitado de nada quando viram que José Miguel Carvalho saiu do local na viatura da vítima, ou que não tenham achado estranho quando, nos dias seguintes, se falou do desaparecimento de Fernando Ferreira.”
Mostraram "frieza e indiferença"
As declarações de Toni em que admite ter estado no local com a vítima, mas em que diz que foi Fernando Ferreira que se atirou ao rio, não convenceram as três juízas. O tribunal questiona porque razão não teriam pedido auxílio se se tivesse tratado de um suicídio ou de um acidente. “Abandonaram o local, esconderam os indícios e seguiram com as suas vidas”, afirmou a juíza durante a leitura do acórdão. A magistrada destacou a “frieza e a indiferença” com que José Miguel se apresentou durante a reconstituição dos factos no local.
O “jagunço” de Toni, José Miguel Carvalho, só foi associado a este caso quando a viatura da vítima foi encontrada numa garagem alugada por si, em fevereiro de 2023. O arguido saiu do local do crime ao volante da viatura de Fernando Ferreira e de passagem terá dito aos dois amigos que ficaram à espera: “vamos embora que isto já deu merda”. Pelo caminho deitou fora o telemóvel da vítima e, depois, manteve o carro escondido, sem placas de matrícula, documentos, nem vinhetas, durante quase dois anos. Outro arguido, que se provou estar inocente, chegou a estar acusado de fazer desaparecer a viatura para França.
Cerca de 175 mil euros em indemnizações
Para o tribunal, houve dolo e os arguidos agiram com "frieza e calculismo", numa "vontade criminosa de especial censurabilidade e perversidade". Toni e José Miguel foram ambos condenados a 19 anos de cadeia pela prática de um crime de homicídio qualificado e a três anos pelo crime de furto do carro de “Conde” que resultou, em cúmulo jurídico, na pena única de 20 anos de cadeia. Os dois arguidos foram também condenados ao pagamento de um conjunto de indemnização à família de Fernando Ferreira, que totaliza 164 mil euros. José Miguel foi ainda condenado ao pagamento de 11.700 euros pela privação do uso da viatura furtada.
Para o advogado da família de Fernando Ferreira, Miguel Azadinho, quatro anos depois, o tribunal fez, finalmente, justiça. As defesas dos arguidos não se conformam com as penas e vão recorrer desta decisão. A advogada de António Silva, Sílvia Oliveira, diz que “continuamos sem saber como é que o ‘Conde’ morreu”.