Tribunal livra António-Pedro Vasconcelos de pagar indemnização a família de jovem assassinada
Mãe queria 75 mil euros e impedir exibição do filme "Amor impossível", inspirado no homicídio de Joana Fulgêncio, em 2009. Alegava que prejudicava imagem da filha.
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O realizador António-Pedro Vasconcelos e outros elementos ligados à produção do filme "Amor Impossível" foram absolvidos pelo Tribunal de Viseu num processo movido por Paula Fulgêncio, a mãe de Joana, de 20 anos, que, em novembro de 2009, foi assassinada pelo namorado e cuja história inspirou o filme do cineasta português.
Paula Fulgêncio moveu uma ação judicial contra o realizador, o produtor, o argumentista, a produtora e a distribuidora do filme, em que lhes exigia 75 mil euros. Queria ainda impedir a circulação ou a difusão, por quaisquer meios, do filme estreado em dezembro de 2015. A mãe de Joana Fulgêncio alegava "que a película em causa constitui a história não autorizada da falecida filha e presta, na parte em que diverge dessa história, péssimo tributo à imagem da falecida, situação que, por seu turno, lhe causa toda uma multiplicidade de transtornos e sofrimentos".
Muitos pontos comuns
Os visados no processo defenderam-se alegando que "o filme não é um documentário, nem uma biografia" da filha, mas "uma obra de ficção com a utilização de algumas situações públicas de casos reais", em que "os acontecimentos de Viseu foram o ponto de partida, a inspiração".
O tribunal entendeu que as histórias "são semelhantes na película e na realidade", havendo "pontos de contacto, e não poucos", entre ambos. As personagens da fita até têm os segundos nomes do homicida e da vítima. Há, no entanto, pontos divergentes, desde logo as circunstâncias da morte da jovem. No filme, o agressor matou a vítima com as próprias mãos e de frente, após esta lhe confessar infidelidades. Na vida real, Joana foi morta com uma marreta depois de terminar a relação que mantinha com David Saldanha. O juiz considerou que a película não ofende a memória da estudante assassinada, nem "denigre a imagem" da sua mãe, por não se "poder estabelecer esse comparativo" entre realidade e ficção. Entendeu que as ofensas sentidas por Paula Fulgêncio "se referem a factos que, perspetivados à luz do quadro sociojurídico vigente, não devem ofender ninguém", tendo sido "praticadas à luz do indiscutível direito que a Constituição" consagra ao direito de expressão e de criação artística.
Embora reconhecendo que Paula Fulgêncio sofreu "o que uma mãe nunca deveria sofrer", o magistrado considerou "improcedente" a ação apresentada e absolveu os réus, condenando-a a pagar as custas do processo.
Ao JN, Mónica Quintela, a advogada de Paula Fulgêncio, disse não concordar com a sentença, pelo que "deve ser interposto recurso da decisão proferida para o Tribunal da Relação de Coimbra". Não foi possível obter uma reação do advogado do realizador António-Pedro Vasconcelos.
Atirada para ravina
Joana Fulgêncio foi assassinada pelo namorado David Saldanha, no dia 18 de novembro de 2009. A vítima foi encontrada morta dentro de um carro que foi atirado para uma ravina junto à barragem de Fagilde, em Mangualde, com um saco de plástico na cabeça. O homicida simulou o sequestro da jovem para se tentar livrar do crime e iludir as autoridades.
Golpes de marreta
O casal manteve uma relação durante cinco anos, marcada por discussões frequentes motivadas por ciúmes. No dia do crime, Joana acabara com David, que inconformado com a decisão a atacou pelo menos três vezes com uma marreta.
Condenado a 18 anos
David Saldanha foi condenado a 18 anos de prisão pela prática de um crime de homicídio qualificado em novembro de 2010 e viu a pena confirmada em abril do ano seguinte pelo Tribunal da Relação. Continua preso.