Marroquino usou identidade de sírio para pedir proteção a Portugal. Atraiu sem-abrigo faminta às antigas instalações da RTP, em Lisboa.
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Um cidadão marroquino acusado agora pelo Ministério Público de ter violado uma sem-abrigo, em Lisboa, viveu cinco anos em Portugal com a identidade de um suposto refugiado sírio, sem nunca ter sido detetado, tendo até beneficiado de ajudas do Estado. Só foi desmascarado quando já estava preso pelo crime sexual.
A acusação do Ministério Público (MP) dá conta de que, quando chegou a Portugal, em 2015, bastou a M.Z., de 34 anos, dizer que se chamava Mussa Ikli, de nacionalidade síria, para entrar no circuito burocrático do apoio a refugiados e conseguir uma vida nova, apoiada com subsídios mensais do Estado português. Bastou-lhe dar entrada com um pedido de proteção internacional para lhe ser concedida uma "autorização provisória para permanência em território nacional", sucessivamente renovada.
Foi com esta nova identidade que o marroquino se instalou na capital e se tornou suspeito da violação de uma sem-abrigo, crime alegadamente cometido em abril do ano passado. De acordo com o MP, baseado na investigação da Polícia Judiciária (PJ), a mulher foi abordada por volta das 23 horas, junto ao Teatro D. Maria II, quando, desorientada, pedia comida a quem passava.
De samaritano a violador
M.Z. ofereceu-se para a ajudar, mas disse-lhe que a comida estava no sítio onde ele, também sem casa, costumava pernoitar, as antigas instalações da RTP, na Alameda das Linhas de Torres. Entraram por um portão e seguiram por um caminho ladeado de mato, até um edifício abandonado. Numa divisão havia um sofá, uma cama de cartões no chão e uma cadeira.
Ali, o homem deu-lhe bolachas, batatas fritas, uma laranja e um sumo. Ela comeu tudo. Mas depois o tom afável transformou-se em ordens e ameaças. Mandou-a despir-se e deitar-se no chão e quando a sem-abrigo recusou, puxou de uma faca e encostou-lha ao pescoço, dizendo-lhe que a matava se não o fizesse. Ela obedeceu e foi violada até ele se dar por satisfeito. Fugiu logo que pôde.
A investigação, por parte da PJ, resultou na emissão de mandados de detenção, em nome de Ikli, a única identidade conhecida das autoridades. A PSP localizou-o em dezembro e a PJ deteve-o. Dois dias depois, quando foi levado perante um juiz para aplicação de medidas de coação, voltou a identificar-se com o nome falso.
Uma imprudência cometida por M.Z. um mês antes podia ter acabado com a mentira, não fosse ter passado completamente despercebida às autoridades. No dia 2 de novembro, segundo a acusação, apresentou no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), por escrito, um pedido para alteração da sua identidade de Mussa Ikli para o seu verdadeiro nome. Nada aconteceu.
Colocado em prisão preventiva, o marroquino foi agora acusado de um crime de violação, quatro de falsificação de documentos e três de falsas declarações.
Fraude com apoios investigada à parte
O procurador responsável pela acusação considerou que há indícios da prática de crimes de falsificação de documento, burla qualificada e burla tributária relacionados com o apoio monetário atribuído pelo Estado ao marroquino, com base na identidade falsa. Mandou extrair certidão para que a investigação continue noutro processo.
Faltam provas de pagamentos
O atraso no envio de documentos comprovativos dos pagamentos feitos ao arguido, pela Segurança Social, motivaram a separação dos processos. O Ministério Público considerou-os essenciais.