Se a História fosse garantia de sucesso, se os números bastassem para nos ampararmos, se as aparências sobre a força dos adversários se concretizassem, então... bem, então o mais provável era Portugal continuar a subir este Mundial a pulso.
Corpo do artigo
Comecemos pela objectividade da estatística: os Navegadores são culpados pela maior goleada da primeira fase (7-0 à Coreia do Norte); são, a par da Argentina, o ataque mais letal (com os mesmos sete tentos, embora os “muchachos” de Maradona tenham um golo sofrido); e partilham, com o Uruguai, o pódio da melhor defesa da prova – Eduardo e Muslera nunca resgataram uma Jabulani do fundo das malhas. Impressionado? Nem por isso?
Mais números: após o nulo de ontem com o Brasil, após aquele embate de generais com medo, entorpecidos pelo calculismo, a selecção comandada por Carlos Queiroz igualou o recorde de jogos consecutivos sem conhecer uma derrota (19, no total). Sem bandeirinhas à janela, sem Nossa Senhora do Caravaggio, sem “e o burro sou eu?”, o professor de olhos claros já mostrou estar no mesmo campeonato aritmético do agora reputado comentador Luiz Felipe Scolari. Curiosamente, a última derrota averbada por Portugal aconteceu às mãos do escrete, nesse 18 de Novembro de 2008 de má memória, seis golos com samba, apenas dois com fado. Mas, desde essa chuva de Novembro que foi sempre a brilhar: 13 vitórias, seis empates. Impressionado? Ainda não? Então mais um número: em 19 partidas, Portugal só sofreu três golos.
Se o poder da matemática não vergou o seu pessimismo, segue-se a força das probabilidades: é certo que vamos apanhar a falsa-lenta Espanha, que começou a coxear mas já se esgueira como uma gazela; é certo que, neste particular ibérico, a História e a estatística até nos são madrastas (desde 1921, celebrou-se 15 vezes em castelhano e apenas cinco em português), mas, que diabo, Espanha não é, não tem sido, esse bicho-papão que come selecções ao pequeno-almoço. Há-de haver uma forma engenhosa de distrair David Villa sempre que este ouse invadir o território de Eduardo. E há sempre aquele golo de Nuno Gomes, no Euro 2004, que arrumou com os castelhanos. Foi o último jogo oficial entre as duas nações. Por isso, quem disse que a história (recente) não pode repetir-se?
Depois, e continuamos no terreno fértil das probabilidades, dá-nos energia ao ânimo saber que os finalistas do Mundial da Alemanha (2006) já dormem em casa. “Arrivederci” Itália, “adieu” França. Constitui um suplemento de alma adicional constatar que, sempre que passou a fase de grupos, Portugal chegou longe. Em 1966, fomos terceiros. Quarenta anos depois, fomos quartos.
E vamos até imaginar que, na terça-feira, nos transcendemos, que subjugamos a rebeldia de David Villa. Se isso acontecer, só temos duas hipóteses: ganhar ao Japão ou ganhar ao Paraguai. Se tudo correr como esperado, o nome da equipa será irrelevante. A História não ia fazer-nos essa desfeita.