Um dos momentos mais esperados da viagem do Papa Bento XVI à capital angolana começou em tragédia e frustrou as expectativas dos que queriam ouvir uma mensagem papal mais inequívoca. O acidente mortal ocorreu à entrada do Estádio dos Coqueiros, mas também lá dentro inúmeras pessoas tombaram por não resistirem ao fortíssimo calor de Luanda.
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Indiferente a tudo isto, Franscisco Paulo desapertava o saco plástico amarrado à cinta para tirar uma maçã. Imóvel, Paulo mantinha-se no seu posto, um elo da imensa corrente de escuteiros que rodeava o relvado do "Coqueiros", designação cínica para um espaço que não deu uma única sombra às mais de 20 mil pessoas que torraram ao sol para participarem no encontro do Papa com os jovens de Angola. A maçã foi parte substancial da refeição de Paulo, mais preocupado em ajustar o lenço verde e branco preso por uma argola metálica com um baixo-relevo de Baden Powell. E o escuteiro bem precisou de forças para manter a corrente que continha, a custo, a multidão na relva, dentro do perímetro certo.
À falta de uma refeição, valeu-lhe a experiência de campo que o ensinou a beber água com fartura. "As pessoas não se hidratam e depois caem para o lado", comentava um socorrista que acabava de ver entrar mais uma maca no improvisado hospital de campanha montado no relvado.
Na bancada, a espera do Papa era mais divertida. Num dos lados, ensaiava-se uma coreografia que haveria de transformar aquele topo da estrutura num enorme mosaico com o rosto de Bento XVI. E, claro, cantava-se e dançava-se periclitantemente. Num prédio contíguo ao estádio, panos coloridos enfeitavam as janelas onde os moradores se acotovelavam para ver chegar o Sumo Pontífice. Eram 16.08 horas quando o estádio se transformou num pequeno vulcão com uma imensa claque a puxar pelo líder máximo da Igreja Católica. Vitorioso, Bento XVI deu uma volta à pista de tartan do estádio. Não houve "onda mexicana", mas, à passagem do Papa, as bancadas viviam uma espécie de histeria colectiva. E cantava-se: "Papa, amigo, Angola está contigo".
Bento XVI subiu depois ao púlpito montado em cima de uma das balizas para receber prendas, mensagens e assistir a algum folclore angolano. Entrou na relva um grupo de dançarinos e percursionistas de Cabinda. As bancadas voltavam a agitar-se. O Papa assistia atento e, de quando em vez, tirava da manga esquerda um lenço branco com o qual limpava disfarçadamente o suor da cara.
O cansaço acumulado de uma jornada que já levava mais de cinco horas reflectia-se nos jovens que, aqui e ali, dormitavam. Alguns não ouviram Bento XVI apelar à coragem dos mais novos: "usai decisões definitivas porque são as únicas que não destroem a liberdade, mas criam a justa direcção, possibilitando seguir em frente e alcançar algo de grande na vida", disse, sublinhado que, "sem dúvida, a vida só pode valer se viverdes com a coragem da aventura, a confiança de que o Senhor nunca vos deixará sozinhos".
Depois da intervenção papal era tempo de regressar a casa. Menos para os que ficaram pregados num sono mais ou menos profundo.