Noah Higón, de 21 anos, padece de sete doenças raras. No meio de uma vida passada entre hospitais, teve tempo de escrever um livro sobre o que tem sofrido e frequenta dois cursos de licenciatura, na Universidade de Valência.
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Aos 12 anos, foi informada de que tinha síndrome de Ehlers Danlos. Aos 16 anos, a síndrome de Wilkie e a síndrome do quebra-nozes. Aos 17 anos, descobriu que também sofria de gastroparesia. Aos 18 anos, a síndrome de Raynaud e aos 20 a síndrome da veia cava inferior e, para completar, a de May-Thurner.
"Toda a minha adolescência, e o início da minha idade adulta, foi passada entre paredes brancas e médicos", desabafa Noah Higón, que reduziu a escrito as dores, os dramas e os sonhos dos últimos anos, no livro "De que dor são os teus olhos", publicado em Espanha na semana passada.
"Quase todo o livro foi escrito em diversos hospitais. É aí que me saem novas ideias, me renovo e fortaleço", comentou a jovem espanhola. "As salas de espera irradiam mais luz do que muitos possam pensar", justifica Noah, em declarações à Agência de Notícias Servimedia.
Não tenho amanhã, sempre vivi sem saber se tenho um amanhã
O livro começou a ser desenhado nas redes sociais, onde Noah se apresenta como @nh487. Tem um canal de Youtube, uma conta no Twitter e um perfil no Instagram.
Em entrevista à agência de notícias espanhola EFE, Noah explica que, aos 15 anos, decidiu expor nas redes sociais "o bom, o mau, o regular" de uma vida de doente. Quis "mostrar todas as faces da moeda e o que significa viver com uma doença assim, mostrar a parte humana", o que fez as pessoas simpatizar com ela.
"Na vida, chega sempre um ponto de mudança, em que se avança ou se afunda", diz, acrescentando que aprendeu a apreciar momentos como tomar um refresco com a mãe. "Não tenho amanhã, sempre vivi sem saber se tenho um amanhã", desabafa Noah.
"Sobreviver tornou-se o meu destino e, desde o primeiro momento, soube que essas experiências não mereciam permanecer na gaveta", contou Noah, na apresentação do livro, no dia 7 de fevereiro, no Hospital da Fé, em Valência, onde passou muitos dias e noites.
"Este livro mostra o amadurecimento de uma menina que nunca pôde ser uma menina, uma adolescência que nunca teve adolescência e uma mulher que tenta converter-se em mulher", resumiu, na entrevista à EFE.
"Não sou tão forte como a minha filha", confessa a mãe de Noah
Susana, a mãe de Noah, confessa que tem muitas dificuldades em viver com a incerteza. "A minha vida é um desespero constante. Não sou tão forte como a minha filha", desabafa, ao recordar o doloroso processo que foi ver a filha a ser apanhada pelas doenças, uma atrás doutra, entre a infância e a adolescência.
"Foi muito duro porque não se sabia nada", disse, recordando as quatro operações a que Noah foi sujeita. "Abriam-na e fechavam-na e ia ficando cada vez mais debilitada. Diziam que era da cabeça, que era psicológico, mas não era bem assim", acrescentou Susana.
Tina Girbés, subdiretora de Cuidados, Investigação e Docência do Departamento do Hospital da Fé, em Valência, diz que uma das coisas que mais a fascina na jovem "é a fragilidade e, ao mesmo tempo, a força imensa" que demonstra.
"Tocou o mais profundo da desesperança, de sentir a morte tão perto e, mesmo assim, grita que está viva, que quer viver. Tem uma vida cheia de projetos pessoais e coletivos", acrescenta Girbés.
Uma paciente ativa, que não conta a vida de vitimização
Noah vê-se mais como "uma paciente ativa", aquela que não esconde os momentos de "fraqueza, raiva e dor", explica. "Uma paciente que não conta a vida de vitimização, mas de realismo. Que mostra ao mundo o que significa viver, viver e sobreviver com esse tipo de patologia", diz.
"A minha realidade é a que é, isso não implica que não tenha 21 anos, que como tal queira viver como uma rapariga de 21 anos", diz Noah, que aprendeu a desfrutar "das pequenas coisas" e alerta aqueles "que têm tudo e não saboreiam devidamente a vida".
A cursar duas licenciaturas na Universidade de Valência, Direito e Ciência Política, alimenta o sonho de ser politóloga e jurista e admite que tem dificuldades em conciliar a agenda, entre as salas de aula e as salas de tratamento nos hospitais.
As sete doenças que afetam Noah Higón
A Síndrome de Ehlers Danlos, a primeira a entrar na vida de Noah, configura um grupo de transtornos hereditários que debilitam o tecido conjuntivo e afetam a pele, as articulações e as paredes dos vasos sanguíneos
A Síndrome de Wilkie é uma doença rara de obstrução duodenal e resulta da compressão da terceira porção do duodeno entre a artéria mesentérica superior e a aorta.
Doença do aparelho digestivo, a gastroparesia é um distúrbio que desacelera ou pára o movimento do alimento do estômago para o intestino delgado.
A Síndrome de Quebra-nozes é geralmente causada pela compressão da veia renal esquerda pela artéria mesentérica superior contra a aorta. Manifesta-se por dor lombar esquerda e abdominal.
A Síndrome de May Thurner resulta da compressão da veia ilíaca comum esquerda, entre a quinta vértebra lombar, posteriormente, e a artéria ilíaca comum direita. Pode causar estagnação do sangue venoso na pélvis e perna esquerda.
Distúrbio dos vasos sanguíneos, a Síndrome de Raynaud é uma doença arterial periférica, um quadro clínico no qual pequenas artérias (arteríolas), geralmente nos dedos das mãos ou dos pés, se estreitam (contraem) mais que o normal em resposta à exposição ao frio, segundo o Manual MSD.
A Síndrome da Veia Cava Superior é um grupo de sintomas causados pelo bloqueio parcial da veia cava superior, uma veia grande que transporta o sangue da cabeça, pescoço, peito e braços para o coração.