<p>A ajuda internacional começa a chegar ao Haiti. A prioridade, nas próximas horas, é resgatar sobreviventes dos escombros e levar à população cuidados de saúde, água, comida, abrigo. Mas, na ilha transformada num imenso cemitério, a assistência ainda não é visível. </p>
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Durante o dia de ontem, aterram em Port-au-Prince aviões cheios de alimentos, medicamentos e de equipas para socorrer as vítimas do brutal sismo que, terça-feira, destroçou a ilha caribenha. É uma corrida contra o tempo que, para muitos milhares - o número ainda é incerto, embora as últimas previsões da Cruz Vermelha apontem para cerca de 50 mil -, já está perdida.
As primeiras 36 horas a seguir a uma catástrofe são cruciais, lembra Olivier Bernard, presidente da organização francesa Médicos do Mundo. Depois, as esperanças de encontrar vivos ruem como as frágeis estruturas da nação mais pobre da América.
No terreno, a situação continua caótica. Seja porque as necessidades assumem dimensões apocalípticas, seja porque ausência de meios de transporte e as estradas intransitáveis obstaculizam a chegada da ajuda a quem precisa.
À falta de operações de resgate organizadas, os haitianos não desistem de procurar os entes queridos entre os milhares de desaparecidos. Esforços desesperados de quem está ao relento há três dias, sem alimentos excepto os saqueados às lojas esventradas, a dormir ao lado de cadáveres, já em putrefacção, nas ruas pejadas de destruição. O cheiro é nauseabundo e as epidemias ameaçam agudizar, ainda mais, a emergência sanitária já instalada. Só junto ao hospital, amontoam-se mais de 1500 cadáveres, ao ar livre.
Decorridas mais de 48 horas sobre o terramoto, os haitianos, muitos feridos e a precisar de cuidados urgentes, fixam os olhos no céu. Já não por fé. Essa esgotou-se em orações e cânticos não atendidos. Olham para o céu em busca dos aviões com ajuda humanitária. É a derradeira esperança.
Um silêncio mortal baixou sobre a ilha. Já não há forças para gritar. "Não se ouve um ruído, só silêncio", conta Mariana Palavra, de 31 anos, que trabalha na rádio da missão da ONU no Haiti.
O pior sismo dos últimos 200 anos registado no Haiti matou dezenas de milhares de pessoas e afectou cerca de três milhares de habitantes, que perderam familiares, amigos, casa, emprego e quase tudo que lhes era valioso. Entre as vítimas, calcula-se que existam cerca de dois milhões de crianças e adolescentes, muitos feridos e órfãos, segundo a organização britânica Save the Children.
O número de funcionários das Nações Unidas que morreram no terramoto ascende a 36 e há 200 que continuam desaparecidos, de acordo com o porta-voz da ONU, David Wimhurst.