Presidente dos EUA assinou 17 novas diretivas federais só no 1.º dia de governação, e 30 ao fim da 1.ª semana. A maioria é para anular "políticas ruinosas" do seu antecessor. Outras restabelecem a normalidade, após os anos caóticos de Trump.
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Fortalecer a proteção para jovens imigrantes, sobretudo crianças; parar imediatamente com a construção do muro na fronteira EUA-México, que era uma bandeira do mandato de Donald Trump; acabar com a proibição das viagens imposta a muitos países islâmicos; dar prioridade à igualdade racial e de género; e reforçar o combate à pandemia do coronavirus: estes foram os temas prioritários das primeiras ordens executivas assinadas por Joe Biden, o democrata que foi empossado 46.º presidente dos EUA em 20 de janeiro de 2021.
Só no primeiro dia de trabalho, Biden assinou 17 ordens executivas urgentes, tornando imediatamente explícito que o presidente, mais do que construir já um legado democrata próprio, está preocupado em "desfazer as políticas erradas e prejudiciais para a América" empreendidas pelo seu antecessor. Apesar de possuir maioria nos dois ramos do Congresso (Câmara dos Representantes e Senado), que é o orgão legislativo nacional, Biden tem preferido, para já, governar através de ordens executivas, que são imediatas e têm o mesmo peso da lei.
O que é uma ordem executiva presidencial?
As ordens executivas são um meio de emitir diretivas federais nos Estados Unidos. Ao presidente, como chefe do governo e da nação, cabe-lhe gerir a política do país a nível federal nacional. Cada um dos 50 estados dos EUA tem depois autonomia administrativa interna, mandando o governador eleito. As ordens executivas presidenciais, uma vez emitidas, permanecem em vigor até que sejam canceladas, revogadas, julgadas ilegais ou depois de expirem os seus termos.
Em primeiro lugar a saúde
Com a América a liderar o top mundial de mortes por covid (27 milhões de infetados, 467 mil mortos), as questões da saúde são prioritárias na nova administração Biden. A primeira ordem executiva foi a nomeação de Jeffrey Zients como coordenador oficial da "task force" da pandemia, que reporta diretamente ao presidente. A ordem também restaura a diretoria para segurança de saúde global e bio-defesa do Conselho de Segurança Nacional, grupo que Trump havia dissolvido.
Além de ter restaurado a credibilidade do infeciologista Anthony Fauci como especialista máximo da nação na pandemia, que vira a sua autoridade diminuída com Trump, Biden impôs também, para os primeiros 100 dias de governo, um mandato nacional de uso de máscara contra a covid. O mandato é válido para todos os funcionários federais e em todas as propriedades federais. Além disso, emitiu outra ordem executiva que exige uso de máscaras em aviões, comboios, autocarros, metro e ferryboats.
Biden também já restabeleceu os laços dos EUA com a Organização Mundial da Saúde depois de o governo Trump ter decidido, em 2020, cortar o financiamento e abandonar a instituição.
Obamacare mais aberto
O presidente já deu os primeiros passos para expandir a cobertura de saúde aos mais desfavorecidos na lei Obamacare - adotado por Barack Obama em 2010 e que se chama realmente Lei de Proteção e Cuidados Acessíveis aos Pacientes . Assim, fez reverter algumas políticas, incluindo orientar os utentes para uma nova hipótese de inscrição em cuidados subsidiados pelo governo. Suspendeu ainda as restrições aos serviços de planeamento familiar. Biden disse que estas ações vão "desfazer os danos que Trump causou".
A administração Biden ordenou que o Departamento de Saúde reabrisse a inscrição do seguro em HealthCare.gov de 15 de fevereiro a 15 de maio. E instruiu as agências federais para reexaminarem as políticas que prejudicam o Affordable Care Act, que dificultam a inscrição no Medicaid ou que reduzem a acessibilidade de cobertura para quem tem debilidade de saúde pré-existentes, como doentes oncológicos, diabéticos ou obesos.
Facilitar a interrupção da gravidez
Com um golpe de caneta, Biden reverteu a política de Trump sobre o aborto, permitindo que a ajuda estrangeira flua novamente para grupos que apoiam ou encaminham pacientes para serviços de interrupção voluntária da gravidez.
E promete, conforme disse em campanha, fazer aprovar legislação para codificar o direito ao aborto e permitir financiamento público a mulheres com baixos rendimentos que queiram interromper a gravidez.
Mais equidade para todos
Isto não é tudo o que o presidente democrata já fez para desfazer as políticas do seu antecessor republicano.
Sobre equidade habitacional: Biden emitiu ordens executivas com instruções para a sua administração abordar e aniquilar o preconceito racial em programas habitacionais subsidiados, uma política preconceituosa de Trump - racista, mesmo - que prejudicava a comunidade afro-americana. Sobre as prisões, tomou medidas para, progressivamente, acabar com o uso de prisões privadas pelo governo, prática que se havia transformado num negócio lucrativo para gestores privados.
Sobre a igualdade de género sexual: fez reverter a proibição de americanos transgénero, que estavam proibidos por Trump de ingressarem nas forças armadas, declarando que todos os cidadãos, independentemente da sua identidade sexual, podem servir o seu país. Outra ordem executiva reforça a Lei dos Direitos Civis de 1964 e impõe que o governo federal não possa discriminar ninguém com base na orientação sexual ou na identidade de género.
Sobre as alterações climáticas: assinou três ordens executivas sobre justiça ambiental, impondo, por exemplo, a necessidade de pareceres científicos em projetos que envolvam construções e infraestruturas.
Imigrantes já estão mais protegidos
Ordem executiva atrás de ordem executiva, Biden já tratou de acabar com a deportação de imigrantes que entraram nos EUA quando eram ainda crianças, os chamados "dreamers" (sonhadores). Trump tentou durante anos anos encerrar esse programa de cidadania, conhecido como DACA e agora Biden instou o Congresso a promulgar legislação que dê um estatuto permanente e abra caminho à plena cidadania desses imigrantes que acreditam no sonho americano.
Outra ordem executiva, como aponta o jornal "The New York Times", revoga o plano do governo Trump de excluir os não-cidadãos da contagem populacional nos censos,. Uma outra anula a ordem executiva do presidente republicano que pressionava as autoridades policiais a encontrarem e deportarem, sem direito a defesa judicial, imigrantes não legalizados.
Tratar muçulmanos como iguais
Biden também já extinguiu a chamada "proibição muçulmana", que impedia viagens para os Estados Unidos de vários países com religião predominantemente muçulmana. E instruiu o Departamento de Estado a reiniciar o processamento de vistos para indivíduos dos países afetados e a desenvolver maneiras de lidar com os danos causados àqueles que foram impedidos de vir aos Estados Unidos por causa dessa proibição preconceituosa.
A construção do célebre muro de Trump também já parou. A nova administração interrompeu a construção do muro na fronteira com o México, uma ordem executiva com "rescisão imediata". O muro, como se sabe, estava a ser pago com dinheiros federais através de uma duvidosa declaração nacional de emergência. Isto permitia ao governo Trump desviar milhões de dólares destinados a cenários de catástrofe que estavam a engordar construtores privados do muro.
Casas e estudantes também salvaguardados
Neste clima de pandemia e sufoco financeiro, Biden quer alargar os prazos de pagamento de hipotecas de casas e garantir moratórias federais, para evitar despejos de quem não consiga pagar os empréstimos por ter perdido emprego durante a pandemia.
O presidente também já está a agir para proteger os estudantes que contraíram empréstimos para ingressar na universidade, concedendo também moratórias federais. A ala mais progressista do governo democrata quer, no entanto, ir mais longe e oferecer perdões de dívida no valor de 50 mil dólares (41 mil euros) a cada universitário.