Marcela Montenegro, diretora do Instituto de sondagens Ipespe analisa sentido de voto que dá vantagem a Lula.
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Nas sondagens, Lula vai à frente com mais 13 pontos que Bolsonaro. Manterá vantagem?
Temos assistido a um pequeno crescimento de Bolsonaro, sobretudo desde que o ex-juiz Sérgio Moro saiu da corrida, ele cresceu 5 pontos percentuais junto da Direita, e está a recuperar outro eleitorado perdido desde 2018. Lula mostra números muitos estáveis, entre 43% e 45%, sem perder ou ganhar. Por outro lado, a chamada terceira via demora não se consolida como viável: o ex-ministro Ciro Gomes soma apenas 8%.
Ciro, do PDT, poderia desistir em favor de Lula?
Não é provável. Ele é ex-ministro e foi antes afastado e isolado pelo PT do ex-presidente. Ciro tem a sua campanha consolidada, não vai desistir no primeiro turno. Mas pode haver um eventual apoio a Lula, sim, no segundo turno da eleição.
As projeções não dão maioria a Lula na 1.ª volta. Mas pode acontecer?
É possível, mas não é provável. Só por duas vezes na história não houve 2.ª volta, foi nas eleições de Fernando Henrique Cardoso. Mas o Brasil tem muito o sentido do voto útil, o voto estratégico que muitos eleitores só aplicam no dia da eleição. Esse sentido de voto pode beneficiar Lula, mas é cedo para perceber. Lula tem uma estratégia mantenedora, sem mexer muito, e está a resultar para ele. A sua hipótese de vencer na primeira volta diria que é de 50%.
É inédito um presidente contra um ex-presidente?
É inédito e muito singular, no Brasil, nunca aconteceu. A eleição está muito polarizada. E eles são dois gestores, o seu trabalho é conhecido e serão muito avaliados retrospetivamente pelo que fizeram antes.
A eleição será mais sobre o passado do que o futuro?
Sim, em certo sentido. A experiência é muito valorizada. Ambos serão mais julgados pelo que já fizeram do que por aquilo que pretendem fazer. Mas também conta, é óbvio, o contexto atual, de pós-pandemia. Os indicadores económicos contam muito na hora do voto, a inflação, o desemprego, têm muito peso.
A má gestão da pandemia e a inflação não beneficiam Bolsonaro. E Lula, já se livrou da nuvem de corrupção do Caso Lava-Jato?
Existe, sim, um desgaste de imagem, esse é o principal atributo negativo de Lula. Mas conta o que fez nos dois mandatos [2003 a 2011] e o julgamento será mais pelo que pode agora fazer de novo na economia e no pós-pandemia. Sobre Bolsonaro, o fraco desempenho da economia será o principal entrave à sua reeleição.
A sociedade está hoje mais dividida do que em 2018?
Está muito polarizada, com muita clivagem. Os ânimos estão agora mais acirrados, vai ser uma batalha muito emocional. Muitos votos em Bolsonaro em 2018 foram votos de rejeição do PT. O voto contra tornará a acontecer. A taxa de rejeição do concorrente é de 20% em ambos, ou seja: 1/5 do eleitorado de cada candidato rejeita fortemente o outro.
Há o risco de Bolsonaro não aceitar o resultado?
Pode contestar, já o disse anteriormente. Mas não acredito que chegue ao ponto de recusar sair da presidência.