A Rússia formulou um plano que define em que situações usaria as armas nucleares que tem em mãos. Os documentos a que o "Financial Times" teve acesso mostram que as linhas vermelhas do Kremlin não são altas como era admitido anteriormente.
Corpo do artigo
Os 29 ficheiros divulgados, esta quarta-feira, pelo "Financial Times", mostram que a Rússia tem "critérios mínimos" para o uso de armas nucleares, revelando ainda que o plano se enquadra numa estratégia de “indução do medo”. Os documentos, com datas entre 2008 e 2014, indicam que o limite para que este passo seja dado é inferior ao que a Rússia alguma vez admitiu publicamente, refere o jornal britânico.
Os parâmetros para a utilização destas armas, descreve o diário, passam por uma possível "incursão inimiga em território russo", a derrota de formações militares posicionadas na fronteira, um ataque iminente utilizando armas convencionais ou a destruição de 20% dos submarinos estratégicos de mísseis balísticos da Rússia. As condições para uma eventual resposta de Moscovo também estão ligadas à destruição de três ou mais navios russos, três aeródromos, 30% dos submarinos de ataque com propulsão nuclear ou uma investida conjunta "aos centros de comando costeiros principais e de reserva”.
“Estes documentos mostram que o limiar da Rússia para o uso nuclear é bastante baixo, se a Rússia não conseguir atingir os seus objetivos com meios convencionais”, advertiu Alexander Gabuev, membro do Carnegie Endowment for International Peace, ao "Financial Times".
Contudo, no que diz respeito à Ucrânia, o limiar nuclear pode ser mais elevado, uma vez que o país não possui armas nucleares e não tem capacidade de organizar uma invasão em grande escala, refere o diretor de estratégia, tecnologia e controlo de armas do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, William Alberque.
Desde o início da guerra na Ucrânia, o presidente Vladimir Putin tem ameaçado, frequentemente, com a utilização de armas nucleares. Em outubro de 2023, o líder do Kremlin voltou a frisar que a doutrina militar interna tem dois critérios para usar armamento nuclear: uma resposta ao uso de tais armas pelo inimigo ou uma ameaça à existência do Estado russo. Mas não é isso que está explícito nos documentos agora divulgados.
Os ficheiros em questão também apontam alguma insegurança em relação a Pequim, revelando que a Rússia realizou, em 2023, exercícios militares junto à China. Apesar de a relação amigável que os dois países têm, a mobilização, revela o jornal, prende-se com receios antigos de que as forças chinesas lancem um ataque para obter território no Extremo Oriente da Rússia.
Um dos cenários apontados nos documentos descreve um hipotético ataque da China e o uso de armas nucleares pela Rússia para impedir o avanço de uma segunda onda de forças invasoras. Questionado pelo "Financial Times", o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Pequim negou que existam motivos para suspeitar de Moscovo, alegando que “a teoria da ameaça não tem fundamento entre a China e a Rússia”.