Embaixador de Israel em Portugal: "A maioria dos palestinianos [mortos] são terroristas"
De visita à Invicta, Dor Shapira, embaixador de Israel em Portugal, falou ao JN sobre as relações económicas e comerciais entre os dois Estados. Relativamente a questões políticas, pronunciou-se sobre a escalada da tensão com os palestinianos e a possibilidade de o país do Médio Oriente intervir como mediador na guerra na Ucrânia.
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Quase um ano e meio após ter assumido a sua missão na Embaixada de Israel em Portugal, o que o traz à cidade do Porto?
Eu sou embaixador de Israel em Portugal. Apesar de a embaixada estar sediada em Lisboa, o meu papel é melhorar as relações entre Israel e Portugal. E o Porto, a cidade, e o Porto, a região, são fatores muito importantes nas oportunidades que temos para incrementar as relações entre o meu país e este país. É por isso que estou aqui.
Por que razão há cada vez mais empresas israelitas a investir no Porto?
Somos o que chamamos de nação start-up, que, durante os anos 90, mudou de um país agrícola para um país tecnológico. Quando se observa a atmosfera da comunidade empresarial em Israel, especialmente as start-ups, percebe-se que estão à procura de novos mercados e Portugal é um mercado novo e muito interessante para se explorar. Penso que nós, Israel, temos muito a trazer para cima da mesa quando se trata das relações com Portugal. Tal como Portugal tem muito a trazer quando se trata de relações connosco. Vou dar dois ou três exemplos. Por exemplo, somos muito bons no que chamamos de gestão de água. Portugal está a passar por uma crise, igual à que nós tivemos há 35 anos, no que diz respeito à água, e temos uma solução que podemos partilhar. Outro exemplo é a segurança cibernética, já que conseguimos desenvolver muitas ferramentas para combater os ataques. Por outro lado, queremos aprender mais com Portugal no que diz respeito à economia azul, sabendo mais sobre o oceano e o meio ambiente. Portanto, é uma joint venture trabalhar em conjunto. É por isso que se observa muito interesse do lado israelita e também do lado português.
De que forma observa as relações económicas e comerciais entre Israel e Portugal?
Hoje em dia, o comércio entre Israel e Portugal gira em torno de cerca de 450 milhões de dólares e baseia-se essencialmente na agricultura, mas queremos fazer uma mudança. A agricultura permanecerá, mas podemos melhorá-la, agregando cada vez mais comércio quando se trata de tecnologia e é isso que se está a tentar fazer. Penso que, em alguns anos, iremos ver estes números dobrar e, como tal, iremos ver cada vez mais empresas israelitas e portuguesas a trabalharem juntas quando o assunto é tecnologia.
Como é que justifica o aumento da migração israelita para o Norte de Portugal nos últimos anos?
Essa é uma boa questão. Não sei o que são muitos, porque não temos números. Mas vejo cada vez mais israelitas a virem visitar Portugal, Lisboa e o Porto. E como observo isso? Através dos voos. Alguns deles [israelitas] vêm para cá viver, outros vêm visitar e alguns vêm para negócios. Por exemplo, temos dois voos diários entre Lisboa e Telavive e, a partir da próxima semana, vamos abrir uma nova rota entre Telavive e Porto. Veremos cada vez mais israelitas a virem para aqui explorar em viagem e talvez tenham oportunidades de negócios. Alguns deles também se poderão mudarão para cá. Quero também que mais portugueses venham a Israel, explorem Israel, visitem Israel, façam negócios em Israel, e talvez até vivam em Israel, porque é assim que criamos melhores relações entre as pessoas. Por que escolhem Portugal? Por que escolhem o Norte de Portugal? Porque é lindo. Vejo muitas semelhanças entre este país e o meu. A natureza das pessoas, o clima, até mesmo a comida e o vinho em alguns aspetos. Acho que as pessoas aqui se sentem em casa e isso é algo que também ouço dos portugueses que vão a Israel.
Mas o cenário de paz é diferente de país para país...
O que quer dizer?
É possível que haja israelitas a sair do país para fugir do conflito com os palestinianos?
Não. Nós temos os nossos problemas em Israel, isso não é segredo. Não temos sorte como vocês, que têm um vizinho como Espanha. Os nossos vizinhos são muito mais complicados. Nos últimos 75 anos, Israel teve que lutar pela sua sobrevivência. Conseguimos porque ainda estamos aqui e somos muito fortes, mas enquanto lutamos pelos nossos sobreviventes e pela nossa segurança, do outro lado passamos muito tempo a tentar alcançar a paz. Muitas vezes conseguimos, com a ajuda, por exemplo, do Egito e da Jordânia, e, recentemente, dos Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Marrocos, entre muitos outros países. Vamos continuar a fazê-lo, vamos continuar a lutar pela nossa sobrevivência e vamos continuar a lutar pela nossa segurança. Por outro lado, vamos continuar a procurar a paz porque queremos viver num sítio tranquilo. Amamos o nosso país e queremos continuar a viver nele, a desenvolvê-lo, enquanto aplicamos medidas de segurança.
O que é preciso ser feito para se chegar a um cenário de paz entre os dois lados?
A primeira coisa que precisa de ser feita é sentar e conversar e isto é algo que os palestinianos têm rejeitado nos últimos vinte anos. Acho que isto é o mais importante. A segunda coisa que precisa de ser feita é garantir que não haverá incitamento. Por exemplo, nos últimos anos temos visto ataques terroristas feitos sobretudo por jovens que são influenciados pelos órgãos de comunicação e estão a ser influenciados por causa do incitamento. Isto é algo no qual precisamos de trabalhar juntos para assegurar que a Autoridade Palestiniana o impeça, porque o futuro é a geração jovem. Precisamos de ter a certeza de que não estão a ser influenciados desta forma. A terceira coisa, depois de nos sentarmos juntos, e depois de pararmos com o incitamento, é construir a confiança entre os dois lados, porque, nos dias de hoje, a confiança não está bem posicionada, e isso é algo em que devemos trabalhar juntos. Claro que acima de tudo isto está a questão da segurança. Não se pode ter paz e não se pode chegar a uma solução se estivermos a ser atacados com foguetes, por terroristas e outras coisas. É preciso fazer tudo isto para se trazer de volta o silêncio, para trazer de volta a confiança entre os lados. Sentar juntos, conversar e ter a certeza de que estamos a parar o incitamento na geração mais jovem.
Considera que as posições políticas do atual primeiro-ministro israelita podem prejudicar a política externa do país? Este ano, já morreram 71 palestinianos...
Não estamos num jogo de contagem de corpos. Porque, por outro lado, também há muitos israelitas que morreram em ataques terroristas e não considero que seja a forma certa de ver as coisas. É certo que Netanyahu é o nosso primeiro-ministro, mas ele não estava no cargo há alguns meses. Tivemos um primeiro-ministro diferente chamado Lapid e, antes disso, Bennett. Todos tinham a mesma política quando se tratava de tentar negociar com os palestinianos, ao tentar assegurar que tínhamos algumas garantias de segurança, construindo essa confiança de que eu estava a falar. Como tal, não vejo nenhuma diferença nas questões políticas. A maioria dos palestinianos que mencionou são terroristas que tentaram atacar os israelitas, por isso vamos continuar a fazer o que pudermos para proteger o nosso povo e para garantir que estas pessoas más estejam fora da equação, caso contrário, não é possível viver. Quando contamos corpos, o que é algo terrível de se fazer, também devemos entender quem são as pessoas por detrás destes números. E uma vez que se entende quem são estas pessoas, penso que é melhor ter um Mundo mais seguro sem elas.
Na semana passada, seis países europeus protestaram contra a expansão de colonatos israelitas na Cisjordânia. O Governo de Israel vai responder?
A questão dos colonatos é muito importante de se discutir. Quando Israel e os palestinianos chegarem a um acordo, irão falar sobre tudo. Não acho que os colonatos sejam a questão do conflito entre israelitas e palestinianos e vou explicar qual é a melhor prova disso. Em 2005, tínhamos alguns colonatos dentro da Faixa de Gaza, tínhamos cerca de dez mil israelitas a viver dentro da Faixa de Gaza e, por decisão do Governo israelita, todos foram evacuados. Portanto, atualmente, e desde 2005, não há um único israelita a viver na Faixa de Gaza. Nem mesmo um colonato. Há dois israelitas na Faixa de Gaza porque foram sequestrados pelo Hamas. Ou seja, dois israelitas que foram sequestrados pelo Hamas, a organização terrorista que assumiu Gaza, e dois corpos de soldados israelitas que estão detidos dentro da Faixa de Gaza. Além deles, não há nenhum israelita dentro da Faixa de Gaza. Portanto, não há colonatos lá. Evacuamos todos esses colonatos, desmantelamo-os e saímos da Faixa de Gaza, cedendo-a aos palestinianos para que se estabelecessem lá, mas começamos a ser atingidos por foguetes, milhares de foguetes, desde 2005, vindos da Faixa de Gaza em direção a cidades israelitas. A partir de um lugar onde não temos nenhum colonato, nenhum colono, nem nenhum israelita a viver e que foi cedido aos palestinianos, eles continuam a lançar foguetes e ataques terroristas contra as cidades israelitas. Isso mostra que este conflito não é sobre acordos. É sobre outra coisa. E já é altura de a comunidade internacional perceber isso. Vamos falar realmente sobre o que é este conflito, e isto é, essencialmente, sobre algumas das lideranças palestinianas, principalmente do Hamas, que não acreditam, ou não querem ver, na existência do Estado judeu. Ao entender que esta é a questão em discussão, até a comunidade internacional pode perceber que a discussão é muito mais profunda e devemos adotar uma abordagem diferente para estas negociações.
De que forma justifica os constantes ataques contra a Síria?
Em primeiro lugar, Israel nunca assumiu qualquer tipo de responsabilidade por esses ataques, portanto não serei o primeiro a fazê-lo. No entanto, diria que a questão não é a Síria, a questão é o Irão. O Irão está, atualmente, envolvido em tudo o que está a acontecer de mau ao redor do Mundo. Estão envolvidos na guerra entre a Rússia e a Ucrânia, porque estão a ajudar a Rússia contra a Ucrânia. Estão envolvidos no apoio a uma organização terrorista no Líbano, o Hezbollah. Estão envolvidos em todas as tentativas de terror que estão a ser concretizadas ao redor do Mundo. Estão também envolvidos na Síria e o que eles estão a tentar fazer, desde que a guerra civil na Síria começou, há mais de dez anos, é construir uma frente contra Israel e isto é algo que não podemos tolerar. Não podemos ter bases iranianas na fronteira com a Síria, permitindo que estejam a colocar Israel em perigo. Talvez por isso ouça todas estas tentativas de impedir este tipo de comportamento do lado iraniano.
Sobretudo no ano passado, Israel viveu um período de instabilidade política. De que forma isso afetou a sua missão?
Nos últimos três anos, tivemos cinco rondas de eleições. Neste momento, temos um Governo, temos questões domésticas que estão a ser discutidas em Israel e temos muitas manifestações das quais me orgulho, porque mostra que as pessoas querem ter uma opinião sobre o que se passa no país. É importante para elas, então vão lá e demonstram-no. Isto é o que se faz num país democrático e acho que devemos aplaudir a ideia de que as pessoas se sentem integradas e podem ser de Direita ou de Esquerda. Não importa qual seja o tema, mostra a vontade de envolvimento dos israelitas quando se trata das suas vidas. Neste momento, o assunto que está a ser discutido relaciona-se com questões domésticas, questões internas de Israel sobre o sistema judicial. Tenho esperança de que serão resolvidas em breve, mas, volto a frisar, somos um país jovem. Ainda estamos em construção e é saudável que existam discussões. Espero que continuemos a ter estas essas discussões e que também as resolvamos de forma democrática.
No contexto externo, pode Israel ter um papel de relevo nas negociações de paz entre a Rússia e a Ucrânia?
É uma boa questão. Acho que quando se trata da guerra entre a Ucrânia e a Rússia, não é uma questão de que lado Israel está. É claro que apoiamos a Ucrânia e ajudamos o país com assistência humanitária desde o início da guerra. Além disso, quando se trata de resoluções na ONU, votamos com a Ucrânia. Mas antes da guerra já existiam relações estratégicas com a Rússia e temos uma comunidade judaica muito ampla a viver na Rússia. Somos um país pequeno, não acho que devemos ser os mediadores neste grande e importante conflito que está a acontecer. Contudo, quando a guerra começou, o ex-primeiro-ministro de Israel, Bennett, foi a Moscovo para tentar falar com Putin e depois foi para o outro lado. Na verdade, ele teve a permissão do presidente ucraniano e de outros líderes para fazer isso, porque sentiu que, se houvesse uma pequena oportunidade de fazermos algo que pudesse parar esta guerra ou salvar a vida de alguém naquela região, então deveríamos tentar fazer o que estivesse ao nosso alcance. Infelizmente, não correu bem. Acho que é muito mais complicado para um país tão pequeno resolver as coisas desta forma. Teremos de esperar e ver o que irá acontecer.