Lula fecha campanha com comício-carnaval em euforia na Avenida Paulista.
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Um cachorro-salsicha avança pelo meio da floresta quente de pernas e sons de língua a pingar, vai descabelado, desorientado, a rabear e não saberá bem o que se está a passar, nem por que é que tem emplastros redondos com um 13 colados no lombo. No meio da confusão e da zoada de gente suada, um homem pisa a patita do cão e ele ferra-o no chinelo. O homem arrebita-se todo a sacudir, a dona loira estica a trela do cão, o cão fica hasteado e esganado na diagonal, a dona pede desculpa, o homem ri amarelo e ela diz: "É a ferrada da vitória!". Riem os dois, fazem o L de Lula com a mão e o caos continua.
Avenida Paulista, duas da tarde, em frente ao vermelhão do Museu de Arte de S. Paulo. Lula, Haddad e Alckmin estão para chegar ao último comício da campanha que vai meter marcha e festa até à Praça Roosevelt, e ali já está montado um bafafá de júbilo e celebração. Estrepitam canções de campanha por todo o lado, gritaria assuada, tremulam bandeiras, é um escarcéu colorido vermelho-amarelo, há centenas de bancas montadas no chão com t-shirts, bonés, balões, bandeiras a dizer "Faz o L", "Paz Amor e Lula", "Lula é","Lulei", já são milhares as pessoas ali a relampejar e a rir mas chegam cada vez mais e no vespeiro das seis pistas de alcatrão da Paulista zarpam os carros a apitar com estrépito nas duas direções. Estão 30 graus.
A canção que mais se ouve a berrar, além do "Oh lá lá", que aqui é "Lula-lá", é o estrondoso hit "Tá na hora do Jair já ir embora", a música anti-Bolsonaro que esta semana trepou o top das paradas no Spotify. É um alegre piseiro, vertente do forró, que canta assim: "Tá na hora do Jair, tá na hora do Jair, já ir embora, arruma suas malas, dá no pé e vá-se embora (tchau!)", que põe toda a gente a abanar. Os únicos parados e impávidos são os soldados cinzento-verde da Polícia Militar e os sem-abrigo dopados deitados junto ao Parque Trianon. Todos os outros se agitam soberbos no transe da exaltação.
"Ele só tem que falar tchau e eu entro"
Antes de mergulhar na onda altíssima de povo que enche a Avenida Paulista, Lula dá uma coletiva para mais de 100 jornalistas onde declara "confiança na vitória" e diz que o seu rival e atual presidente "Bolsonaro não tem condições psíquicas para governar este grande país. Ele não debate nada, mente descaradamente, só mente, mente, mente. Graças a Deus o povo brasileiro está maduro e vai fazer a troca".
Vestido de camisa de ganga, jeans e sapatilhas, rodeado por Haddad e Alckmin, com a voz a acusar o esforço da longa campanha, Lula diz esperar que Bolsonaro passe a faixa se ele ganhar. "Quem perde vai para casa lamber a cara e quem ganha vai para a rua festejar. Espero que ele faça a transição. Ele só tem que falar tchau e eu entro. Tem que ser assim. Estão criadas as condições para ganhar, mas primeiro deixa eu ganhar mesmo a eleição", diz aos repórteres que se apinham numa sala quente numa rua lateral à Paulista, que ferve à espera dele.
Numa tirada um pouco surrealista, Lula apela ali diretamente ao voto dos próprios jornalistas: "Se Deus ajudar e vocês jornalistas também e votarem no meu 13 [o seu número de voto na urna eletrónica, que no Brasil é numeral e não nominal], vamos fazer este país voltar à normalidade que merece", levantando risos salpicados pela sala.
Depois sai a grande velocidade num carro preto de vidros fumados, numa picada aberta por motos da Policia a piscar luzes azuis e vermelhas, acenando aos apoiantes que se aglomeram à porta enquanto cantam "cadê você, Lula, cadê você, nós viemos aqui só para te ver".