Numa sessão plenária marcada pela guerra na Ucrânia, o JN está a entrevistar eurodeputados portugueses sobre as exigências e as consequências do conflito militar no futuro da União Europeia (UE). Marisa Matias, eurodeputada do Bloco de Esquerda, defende que o espaço comunitário europeu deve ter uma estratégia própria e alternativa à NATO.
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Qual deve ser o papel e a intervenção do Parlamento Europeu perante a guerra na Ucrânia?
Pode-se fazer muito e, ao mesmo tempo, não se pode fazer tanto quanto gostaríamos. Há um conjunto de medidas que podem ser tomadas, como o apoio às sanções, que é uma das formas de chegar diretamente ao regime oligarca de Putin. Assim como o reforço da política de cooperação e a tentativa de aprofundamento das vias diplomáticas. Não se resolvem conflitos sem falar com todas as partes. Depois, o tratamento deve ser estendido a todos os refugiados e não apenas aos ucranianos. Não podemos permitir a lógica de diferenciação de pessoas. A UE está perante um dilema: decidir se quer ser uma força de balanço ou de outras forças internacionais. Há medidas que podem ser contraproducentes como a censura de meios de comunicação russos. Não tenho dúvidas de que são canais de propaganda de Putin, mas as sanções têm sempre dois lados. Abrem precedentes de censura e os meios de comunicações europeus também não chegam à Rússia.
Quais os desafios para a União Europeia a médio e a longo prazo?
A União Europeia tinha de ter pensado em mecanismos para ter autonomia energética, até para responder aos desafios das alterações climáticas. Falta um investimento real e concreto para gerir infraestruturas para todo o tipo de relações comerciais e tecnológicas. Estamos na iminência de ter uma crise de abastecimento de cereais. Há quem proponha que a União Europeia possa inclusive criar uma espécie de central de abastecimento, como se fez com as vacinas contra a covid-19. Tudo isto mostra as fragilidades na UE, que têm de ser resolvidas para não se tornarem problemas estruturais. Do ponto de vista da segurança, eu preferia que a União Europeia não se transformasse numa extensão dos interesses da NATO.
Como fica a relação da UE com a NATO?
É inegável que a NATO assumiu uma centralidade enorme até por falta de alternativas concretas na União Europeia. Isso não significa que a NATO seja útil agora, no futuro ou que possa ajudar a resolver o problema. A NATO nunca foi um aliado da paz ou da eliminação de conflitos. Acho que o caminho estratégico da UE deve ser alternativo aos objetivos da NATO.
O que considera dos recentes pedidos de adesão à União Europeia de países como a Ucrânia, a Geórgia e a Moldávia?
Há um princípio que não pode ser questionado: os países soberanos têm de ter a capacidade de fazer as suas escolhas. Não nos cabe a nós decidir o que devem fazer. Embora seja agora tudo muito nebuloso, não podemos ignorar que continua a haver um papel nefasto da NATO. Por exemplo, não foi cumprido o acordo pós-reunificação alemã: uma espécie de compromisso para que não houvesse uma expansão da NATO a leste da Alemanha. O que não aconteceu. Se fosse outro bloco militar a rodear outro país, como os Estados Unidos ou a China, percebia-se que isto é problemático e não ajuda a resolver conflitos.