A polícia angolana anunciou ter detido 12 pessoas na frustrada concentração antigovernamental marcada para este sábado em Luanda, mas a organização continua a falar em 18 e confirmou que foram já todos libertados.
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O anúncio policial foi feito pelo superintendente Orlando Bernardo, que leu ao princípio da noite um comunicado de imprensa, com quatro parágrafos.
A Polícia Nacional alega ter recebido do Governo Provincial a notificação de ilegalidade de uma manifestação, convocada por um grupo de jovens do autodenominado Movimento Revolucionário (MR).
No documento, a polícia salienta a tentativa de "um ajuntamento de cidadãos defronte ao cemitério de Santa Ana, com pretensão de levar avante a referida manifestação", causando "constrangimentos e indignação" a quem se preparava para os funerais agendados e "alterando substancialmente a ordem pública".
"Para repor a ordem de direito e da lei, a polícia encaminhou 12 cidadãos às esquadras para a respetiva identificação", refere o comunicado, destacando que na "revista e identificação" foram apreendidas cinco bisnagas com uma substância.
A substância em causa foi analisada no Laboratório Central de Criminalística e, por não ter sido "encontrada qualquer perigosidade" na sua composição, resultou posteriormente na libertação dos referidos 12 cidadãos, acrescenta a polícia, sem identificar que tipo de produto se tratava.
A polícia não faz referência no comunicado ao forte dispositivo montado, com dezenas de efetivos, incluindo polícia montada e de Intervenção Rápida, para dissuadir a concentração dos jovens, nem que meios utilizou para identificar quem se pretendia manifestar contra o regime e quem pretendia participar em funerais.
A fonte da organização contactada pela Lusa, Mbanza Hamza, reafirmou à Lusa terem sido detidas 18 pessoas, e confirmou que já foram todas libertadas.
A ação deste sábado foi convocada pelo autodenominado Movimento Revolucionário (MR) para protestar contra o desaparecimento de dois jovens angolanos, a 27 de maio do ano passado, quando tentavam organizar uma ação reivindicativa de ex-militares.
Os dois jovens, Isaías Cassule e António Alves Kamulingue, nunca mais foram vistos e o MR e as famílias exigem que sejam dadas explicações.
O objetivo do protesto, convocado com o lema "Direito à Vida e Liberdade de quem pensa diferente", tinha prevista uma concentração junto ao cemitério de Santa Ana, defronte do Comando Provincial da Polícia Nacional, a que se seguiria uma marcha, ao longo de três quilómetros, até à Praça da Independência.
Logo pela manhã, ao chegar ao local, a agência Lusa testemunhou o desdobramento de dezenas de agentes da polícia, enquadrados por polícia montada e efetivos da Polícia de Intervenção Rápida.
Os jornalistas foram impedidos de trabalhar e, juntamente com Lisa Rimli, investigadora da Human Rights Watch, ameaçados de bastonadas senão abandonassem o local, sem que nenhum oficial da polícia justificasse a medida ou aceitasse identificar-se.
O desaparecimento de Cassule e Kamulingue é referido num relatório que a organização Human Rights Watch enviou ao Conselho dos Direitos Humanos da ONU sobre Angola e a frustrada ação de hoje do MR para exigir informações sobre o paradeiro dos dois desaparecidos não foi a primeira.
No passado dia 22 de dezembro, a polícia reprimiu uma manifestação organizada em Luanda para exigir uma explicação oficial sobre os desaparecimentos, refere o relatório da HWR.