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A mistura de vozes distintas a apelar à cautela na distribuição da riqueza criada em Portugal está a tornar-se um pouco esdrúxula. A pouca distância da apresentação do Orçamento do Estado para 2026 (dia 10) e das eleições autárquicas (dia 12), o ambiente é, de facto, propício à oferta de "prendas" e a um banquete de promessas. Primeiro, Nazaré Costa Cabral, presidente do Conselho de Finanças Públicas, pediu, esta semana, rigor para que as contas não sofram futuros desequilíbrios (não há almoços grátis). As imprudências de hoje raramente são visíveis no curto prazo. Ontem, André Ventura acusou Luís Montenegro de estar "desfasado da realidade" e considerou "puro eleitoralismo" o facto de o primeiro-ministro ter anunciado aumentos para os idosos e pensionistas em vésperas de eleições autárquicas.
Há ainda um terceiro fator que ajuda a explicar este fenómeno. Portugal tem um Governo minoritário social-democrata, com um apêndice democrata-cristão, que oscila no seu diálogo político - e até as suas políticas concretas - entre uma extrema-direita imprevisível (Chega) e um PS moderado, agora sob a batuta de José Luís Carneiro, um líder mais alérgico ao radicalismo de Esquerda do que o seu antecessor.
Os mais otimistas dirão que os indicadores económicos mais do que justificam tudo e mais alguma coisa. Houve um excedente orçamental no primeiro semestre e a economia poderá crescer 2,1%, em 2025. A dívida pública deverá ficar-se pelos 93,6% do PIB, ainda assim a sexta maior de toda a União Europeia. Crescer 2,1% para um país como Portugal é "poucochinho". Aguardemos pelo Orçamento, mas aquilo a que o Chega chama hoje "eleitoralismo" pode ser classificado como austeridade amanhã, sobretudo se as ditas promessas ficarem na gaveta. A imprevisibilidade de Ventura é, aliás, a sua marca diferenciadora.