O fotojornalista João Silva foi, este sábado, gravemente ferido, no Afeganistão, vítima de uma mina. O repórter viu o "Pesadelo" das guerras do Mundo. Viu "formas penosas de viver e de morrer". Hoje, o fotógrafo do jornal "The New York Times" vive o pesadelo.
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Pisou uma mina e ficou com ferimentos graves nas pernas. Tudo aconteceu hoje, quando acompanhava as tropas norte-americanas perto da cidade de Arghandab, no Sul do Afeganistão, ao serviço do "The New York Times".
Foi o jornal que avançou a notícia, dando conta de que João Silva foi transportado para a base da NATO de Kandahar, onde foi submetido a uma cirurgia, na qual os médicos não conseguiram evitar a amputação das duas pernas por altura dos joelhos. Os médicos aguardavam que o repórter recuperasse positivamente para ser evacuado para um hospital norte-americano na Alemanha.
João Silva conhece o resultado devastador das minas. Fotografou a realidade negra do Iraque, Afeganistão, Líbano, Malawi, África do Sul, Quénia e Gana. Há três anos, em sua homenagem, a Galeria do JN, no Porto, inaugurou a exposição "Pesadelo", com uma selecção brutal de fotografias. Foi a primeira exposição do repórter português em Portugal. Lá fora, o seu talento é sobejamente reconhecido.
Num gesto invulgar, o editor-executivo do "The New York Times", Bill Keller, falou sobre o repórter: "João é um autêntico fotógrafo de guerra, destemido, mas cauteloso, com um olho incrível. Esperamos com ansiedade e rezamos para que recupere rapidamente", acrescentou Bill Keller.
João Silva também faz parte de um quarteto ilustre de repórteres fotográficos de guerra, que protagonizam o livro e, depois, o filme "Bang-Bang Club", que narram as vidas dramáticas dos fotógrafos, enquanto faziam a cobertura do apartheid.
"É um homem corajoso, vai na linha da frente, mas é cuidadoso. Não é um irresponsável", caracterizou o amigo Alfredo Leite, director-adjunto do JN. Numa das conversas mais recentes entre ambos, dois dias antes de João regressar ao Afeganistão, manifestou o seu entusiasmo por ir para Cabul, cansado de meses a fio de alta violência em Bagdade. "Disse-me que, desta vez, ia para um lugar mais tranquilo e, afinal, depois de tantas guerras sem um arranhão, acabou por se ferir num acidente que, mesmo com a sua experiência dificilmente podia evitar".
Escreve o "The New York Times" que um grupo de detectores de minas e cães farejadores já havia passado pelo local onde João Silva acabaria por sofrer a explosão. Contudo, este tipo de minas, feitas com uma pequena quantidade de metal, torna a sua localização difícil.
"João Silva trabalhou nos últimos 18 anos - quase todo o seu percurso profissional - a captar o que de mais irracional há na condição humana. Não foi por acaso. Quando, no início da década de 90, fotografou uma jovem negra a ser golpeada com uma foice por outras mulheres no subúrbio sul-africano de Thokoza, João não decidiu só que, definitivamente, queria ser fotógrafo: num momento de rara determinação, quis ser repórter de guerra" - escreveu Alfredo Leite, aquando da mostra no Porto.
"Cada vez que fecha o obturador, o que é feito do lado humano do fotógrafo?"