Em junho de 2016, os britânicos optaram por sair da UE mas, segundo uma sondagem, decisão poderia agora ser diferente. Consequências económicas deixaram comunidade portuguesa no Reino Unido em situação de instabilidade.
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Há seis anos, 51,9% dos britânicos votaram favoravelmente para que o Reino Unido abandonasse a União Europeia (UE), com a promessa de que a mudança iria abrir a porta a novos acordos comerciais. No entanto, em dezembro de 2021, uma sondagem elaborada pela Opinium indicou que 60% dos inquiridos acreditavam que o processo de saída correu mal ou pior do que aquilo que esperavam, mostrando-se descontentes e inseguros com a mudança. O sentimento estende-se à comunidade portuguesa na Grã-Bretanha, que se sente cada vez mais reticente em relação ao futuro.
"Inúmeros portugueses regressaram a Portugal ou foram para outros países. O Brexit desiludiu muita gente e estilhaçou um sentimento de pertença profundamente enraizado", revela Sérgio Tavares, que está a viver na Escócia há mais de 25 anos, notando que "há uma degradação da qualidade de vida" que acredita que será sentida a longo prazo.
As previsões do português estão de acordo com um estudo da Resolution Foundation, publicado na semana passada, que alerta que a economia britânica vai precisar de vários anos para se adaptar totalmente às consequências do Brexit, deixando um forte impacto sobre o poder de compra.
"A vida está mais cara"
Antecipando as dificuldades atuais, e ainda o que está para vir, na hora de escolher um destino para emigrar, são muitos os que cada vez mais fogem do Reino Unido. Domingos Cabeças, gerente da agência de recrutamento Netos, em Londres, que contrata migrantes oriundos de países da Europa, observa que, desde a saída do Reino Unido da UE, tem havido muito menos procura de emprego não só da parte dos portugueses como também de pessoas de outras nacionalidades. "No passado, não dávamos vazão à quantidade de pessoas que procuravam emprego no Reino Unido, hoje em dia isto já não acontece. Antes do Brexit, tínhamos de tratar do recrutamento de 70-80 pessoas por dia e agora temos 10-15 por dia", explica, assinalando que "a vida está muito mais cara".
Além dos entraves económicos, as questões burocráticas também fazem muitos emigrantes sentirem-se inseguros. Pedro Xavier, que se apresenta como "orgulhosamente português", está em Londres há 39 anos, mas em 2019, antes de o Brexit entrar em vigor oficialmente, tomou uma decisão que nunca antes lhe passou pela cabeça.
"Senti a necessidade de me tornar cidadão britânico por causa das questões burocráticas. Hoje em dia, é muito difícil conseguir marcar renovações de documentação", revela, admitindo que também no plano económico sentiu uma enorme diferença, já que houve um decréscimo do poder de compra devido à queda da libra.
Em junho de 2021, cinco anos após o referendo que deu luz verde ao Brexit, uma sondagem da Savanta ComRes revelou que os britânicos continuavam muito divididos em relação à ligação à UE, porém, estima-se que 51% dos eleitores escolheriam ficar na organização, contra 49% que continuariam a optar por sair. Se assim fosse, o referendo teria um desfecho diferente, mostrando, ainda que de forma pouco consistente, que os britânicos estão descontentes com o rumo do processo de desintegração.
Dois desafios em mãos
Um ano depois, a conjuntura mudou com a invasão russa da Ucrânia, que está a ter consequências económicas catastróficas, a começar pela inflação que atinge vários estados europeus. Perante este cenário, os britânicos irão ter dois desafios em mãos: ultrapassar as dificuldades de uma economia em adaptação pós-Brexit e lidar com o aumento do custo de vida que surgiu na sequência do conflito.
Percentagens
49% votariam a favor da saída se o referendo se tivesse realizado em 2021, revelou uma sondagem da Savanta ComRes.
60% acreditam que o processo de saída correu mal ou pior do que o planeado, apontou uma sondagem do Opinium, em dezembro último.
51,9% dos britânicos mostraram vontade de ver o Reino Unido fora da UE. O referendo sobre o Brexit contou com uma
participação de 72,2%.
Cronologia
Processo de saída da União Europeia
23 junho 2016: Referendo no Reino Unido
Em junho de 2016, os cidadãos do Reino Unido votaram a favor da saída da UE. A votação efetuou-se no seguimento de negociações para definir um quadro que reforçasse o estatuto do Reino Unido na UE.
19 junho 2017: Início das negociações
Michel Barnier, negociador-chefe da UE, e David Davis, ministro para a Saída da União Europeia, lançaram a primeira ronda de negociações do Brexit, seguindo-se muitas outras.
24 janeiro 2020: Acordo assinado pela UE
Charles Michel e Ursula von der Leyen assinaram o acordo sobre a saída em Bruxelas. No mesmo dia, o documento foi assinado pelo primeiro-ministro Boris Johnson, em Londres.
31 janeiro 2020: Reino Unido sai da UE
O Acordo de Saída entrou em vigor com a retirada do Reino Unido da UE, à meia-noite de 31 de janeiro de 2020. O Reino Unido deixou de ser Estado-membro da UE e é considerado país terceiro.