Os drones iranianos usados pela Rússia nos ataques à Ucrânia estão repletos de componentes europeus, denuncia um documento secreto enviado por Kiev aos aliados ocidentais. A acusação alavanca um pedido de mísseis de longo alcance para atacar locais de produção não só em território russo, como no Irão e na Síria.
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O documento de 47 páginas apresentado pelas autoridades ucranianas aos governantes dos países do G7 refere que, nos últimos três meses de conflito, mais de 600 ataques a diferentes cidades do país foram realizados com recurso a drones iranianos que são produzidos com tecnologia proveniente da Europa.
O relatório, ao qual o jornal "The Guardian" teve acesso, indica que 52 componentes elétricos fabricados por empresas ocidentais foram encontrados nos drones Shahed-131 e 57 no modelo Shahed-136.
“Entre os fabricantes estão empresas sediadas nos países da coligação de sanções: EUA, Suíça, Países Baixos, Alemanha, Canadá, Japão e Polónia”, pode ler-se no documento, que acrescenta ainda que as informações aduaneiras mostram que “quase todas as importações para o Irão tiveram origem na Turquia, Índia, Cazaquistão, Uzbequistão, Vietname e Costa Rica”.
De acordo com o documento, o Irão, que quer afastar qualquer suspeita de uma eventual ligação à guerra na Ucrânia, tem tentado diversificar a produção através da utilização de uma empresa síria que faz entregas no porto russo de Novorossiysk.
Para pôr fim ao ciclo de produção dos veículos aéreos não tripulados (UAV, sigla em inglês), as autoridades ucranianas sugerem “ataques com mísseis contra as fábricas de produção destes UAV no Irão, na Síria, bem como num potencial local de produção na Federação Russa”, alegando que as ações podem ser realizadas "pelas forças ucranianas se os parceiros fornecerem os meios de destruição necessários”.
Não há, no documento em questão, nenhuma sugestão de qualquer irregularidade por parte das empresas ocidentais cujas peças foram identificadas, já que estas são importadas através de rotas dificilmente controladas.
Empresas descartam responsabilidade
O documento relata que num dos Shahed-136 encontrados na Ucrânia foi descoberta uma bomba de combustível fabricada na Polónia pela firma alemã Ti Automotive GmbH, da qual a multinacional britânica TI Fluid Systems é a empresa-mãe. Foi ainda detetado um microcontrolador fabricado pela suíça STMicroelectronics.
Um porta-voz da Infineon, uma das empresas que produzem os componentes, disse ao "The Guardian" que a firma não vendia componentes ao Irão, desresponsabilizando-se pela circulação de peças altamente qualificadas.
“É difícil controlar as vendas durante toda a vida útil de um produto. Ainda assim, tomámos medidas abrangentes à nossa disposição para garantir o cumprimento das sanções contra a Rússia", assegurou o responsável da empresa.
O eurodeputado neerlandês Bart Groothuis, que integra o subcomité de Defesa e Segurança do Parlamento Europeu, aponta a falta de coordenação entre os serviços de inteligência da União Europeia para lidar com o uso indevido de componentes ocidentais e disse acreditar que “muitas agências de inteligência europeias nem sequer estão a considerar as sanções”.